Vivendo ou Sobrevivendo?

Vivendo ou Sobrevivendo?

uma reflexão sobre a peça “A lista”

Clarice Niskier encena brilhantemente um monólogo chamado a lista da autora canadense Jennifer Tremblay. A peça, que dura em torno de 50 minutos, começa com mais do que um spoiler, com a declaração sobre seu enredo. A vizinha da narradora, que se chamava Caroline, morreu e esse fato pode estar diretamente relacionado com a sua participação, ou melhor, a partir da sua ausência. Afinal, essa amiga que está grávida, pede uma indicação médica por duvidar das habilidades do profissional que a assiste, mas essa atividade entra na lista da personagem principal e nunca é executada por completo. Não priorizada de início com a relevância que deveria, postergada depois pela dificuldade em, de fato, achar o número e, por fim, banalizada pelo cotidiano cheio.

Segundo a sinopse oficial, a peça é uma narrativa sobre a responsabilidade, no modo de produção 24/7 – vinte e quatro horas por sete dias na semana -, aquele em que nós nos idealizamos como seres impecáveis, perfeitos, no controle de tudo. Temos recursos tecnológicos, nossas máquinas, nossas melhores amigas. Vamos nos isolando, nos fechando afetivamente para o outro, mesmo que paradoxalmente percebemos que nossas forças estão nos abandonando porque precisamos da alteridade para viver. Segundo a autora, trata-se de uma reflexão sobre a solidão.

De acordo com Clarice, a atriz, o texto é um convite à reflexão sobre nossa percepção em relação àqueles que nos cercam, sobre o seu dever primordial para com o outro e para consigo mesmo. Ela reforça que há mais perguntas que respostas e que cada um é tocado em um ponto ao ser atravessado por essa obra.

Contextualizar o caos que habitamos virou senso comum, as siglas, os estímulos, a urgência… tudo ganhou uma velocidade que não conseguimos processar ou compreender. Não estamos bem e ainda não descobrimos como ficar bem. Precisamos achar um novo caminho, mas enquanto isso a vida segue seu fluxo.

As metrópoles instauraram uma dinâmica viciante nas pessoas: recompensas rápidas, possibilidades infinitas, experiências diversas. Viver tomou dimensões mais intensas, com dias cheios, longos, agendas lotadas que não atendem mais àquilo que precisamos fazer. Ultrapassamos a imensa relação de desejos, agora já não processamos a lista de necessidades mesmo.

O sentimento de inadequação aumentou e peculiarmente os grupos, as bolhas e o convívio com iguais também. Consumimos apenas o que nos conforta. De forma conveniente e domesticada, os algoritmos cumprem seu objetivo com maestria. Mas nada mais nos satisfaz, as emoções não são cultivadas, entendidas, conversadas e a nossa falta de atenção para essa parte – que também existe em nós – não impede que ela se manifeste. Pelo contrário, esse ignorar de repente faz transbordar um choro, uma tristeza, uma raiva ou outras emoções juntas.

Esse não é um texto para orientar, compartilhar um ensinamento ou uma metodologia. É um convite, uma provocação, uma pergunta: diante de tudo e de tantas coisas, como você tem escolhido viver? Quais são suas prioridades? Na sua lista cheia de coisas para fazer, em qual posição está sua família, seus amigos e você mesmo?

Tenho andado em alguns lugares com olhos de observadora, buscando ouvir e compreender. Curiosa pela resposta do outro, pelas suas ideias e opiniões, faço questionamentos diversos. Às vezes só acompanho, pois,  diante de muito barulho externo, algumas pessoas nem percebem. Noto que elas não notam, olho que elas não veem, ouço que não há escuta. Há encontros nos quais algumas delas vão embora sem levar nada novo… São tantas palavras vazias, sem interesse genuíno no outro, com ausência de uma intenção maior que, ao final, tudo continua igual. Estamos encontrando o que afinal?

Nos enchemos de tarefas, criamos listas para organizar, desdobramos o peso de tantas coisas em palavras rápidas, cansadas, desconectadas; criamos hábitos para despistar, tentando dar conta de tudo, fugimos do que é essencial. Assim, aos poucos, na negligência de cada sim que já não cabe mais a solidão vai criando um espaço, tomando conta, e como os sentimentos não cultivados, de repente, após mais um encontro em que não há nada novo, ela excede e já não é mais possível colocá-la ao fim da lista.

Afinal, você constrói sua lista ou é ela que constrói você?

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Inteligência emocional na prática

Inteligência emocional na prática

“A mente é seu próprio lugar e, por si mesma, pode tornar o inferno um céu e o céu, um inferno.”

John Milton

 

O despertador não tocou. Eram 7h30 e a reunião começaria às 8 horas em ponto. O deslocamento de casa para o trabalho levaria no mínimo 20 minutos. O coração disparou, e a ansiedade tomou conta de Luiza. Ela seria a primeira a se apresentar. Levantou-se correndo e seu dedinho do pé direito foi quase esmagado na quina da cama. Após a higiene pessoal, vestiu-se rapidamente, apanhou a bolsa, abriu a porta e se dirigiu ao elevador. Antes de descer, se lembrou de que está faltando algo. Esqueceu a mochila com o notebook. Como faria a exposição sem o computador? Dias de intensa dedicação estavam nele. Por segundos, ficou com muita raiva do seu celular, acreditando que ele já não respondia mais aos seus comandos. “Preciso trocá-lo!”, logo pensou! Para complicar, no seu retorno, os elevadores resolveram dar uma volta até o último andar. No subsolo, ligou o seu carro e seguiu em direção à empresa. O trânsito não estava tão carregado, mas o aplicativo apontava dez minutos até o destino. A moça comunicou ao seu gestor que o trânsito se complicou e que se atrasaria uns 10 minutinhos.

 

      Mas só chegou 20 minutos após a reunião ter começado. Por esse motivo, a ordem das apresentações foi invertida. Não conseguiu prestar atenção em uma só palavra e foi tomada por um diálogo interno: “Isso não poderia ter acontecido, é por isso que não vou progredir na carreira. Tantos dias de trabalho e o despertador não toca justamente hoje. Que vergonha eu ter chegado atrasada!”.

 

      Finalmente, é a sua vez. É possível perceber a sua respiração ofegante e que ela não tem a melhor qualidade de presença. Sua explicação fica mais restrita ao que está consta nos slides. Seu gestor faz uma brincadeira no meio da participação dela, o estado emocional de Luiza melhora um pouco e ela se conduz mais harmônica até o final. Porém, nas apresentações que seguiram, ainda se sentia muito aérea e culpada, com aquela sensação de que algo não estava bem e isso roubou muito da sua energia!

 

      No livro de Susan David, Agilidade Emocional, a autora nos convida a dançarmos mais do que lutarmos com a vida e com as circunstâncias. Ela nos faz refletir que, com autocompaixão, podemos transformar os nossos desafios diários em oportunidades, sem perder o foco daquilo que realmente desejamos.

 

      Uma das perguntas que ela faz que iremos nos ater aqui é: quantas voltas no quarteirão você tem dado? A autora afirma que “andamos (ou corremos) repetidamente em volta dos quarteirões das nossas vidas, obedecendo a regras que são escritas, implícitas ou simplesmente imaginárias, presos ao costume de ser e fazer coisas que não são úteis. Por vezes, somos instrumentos de corda, indo repetidamente de encontro às mesmas paredes sem perceber que pode haver uma porta aberta à nossa esquerda ou à nossa direita”.


        Vamos analisar o que aconteceu com Luiza? Para isso, voltaremos à sua infância e entenderemos o que são as suas voltas no quarteirão. Abordaremos sobre a gestão dos pensamentos que interferem nas nossas emoções, sendo essas os condicionantes de nossos comportamentos.

Nossas experiências de infância interferem!

Precisamos compreender que as nossas vivências quando crianças e os padrões que aprendemos durante nossa trajetória têm forte interferência em relação à maneira como nos comportamos. Muitas vezes, nem nos damos conta desses padrões. Formas que provavelmente tenham sido úteis para nos tornar quem somos, mas que podem nos acompanhar em diferentes circunstâncias, impedindo-nos de alcançar maior discernimento em relação às situações. Luiza mantém a crença de que necessita ser excelente em tudo o que faz, que precisa dar o exemplo e o efeito colateral é que ela não se permite relaxar.

 

Esse ritmo frequente e sem pausas conduz à exaustão, que, por sua vez, nos faz perder o foco em relação àquilo que realmente é importante, nos tira a qualidade de presença e afeta a excelência das nossas ações. A pausa pode ser vinculada, inclusive, a um processo terapêutico, pelo qual podemos encontrar um “espaço” importante para identificar e aprender a gerenciar nossas emoções, inclusive alterar padrões que incorporamos ao longo da vida, mas que já não servem mais para a nossa jornada de desenvolvimento. Lideranças que desfrutam desses espaços são mais humanizadas e promovem ambientes de trabalho com mais segurança psicológica.

 

Na série de aulas sobre história do autoconhecimento, Luciano Meira [@lucianoameira@caminhosvidaintegral], autoridade em desenvolvimento do potencial humano, enfatiza que todo conhecimento possui valor, mas o autoconhecimento tem valor incalculável. Afinal todo conhecimento, científico, técnico ou mesmo de negócio pode perder validade, pois o mundo é instável nesse aspecto. Já com o autoconhecimento isso não ocorre, pois, quanto mais se aprofunda, mas ele se pereniza, e os níveis de consciência se ampliam. E mais: que essa é a única área do saber que propicia um encontro tão rico de perspectivas – tradições espirituais, filosóficas, psicológicas e neurocientíficas. Por isso, investir no conhecimento de si é o principal caminho para gerenciarmos as nossas emoções, pois ganhamos mais clareza acerca do que as condicionam. Líderes que desejam lidar com mais discernimento e eficácia com as adversidades da vida ou os diferentes perfis das pessoas podem encontrar as melhores possibilidades quando dão atenção aos seus processos de autoconhecimento.

Observe seus pensamentos – Quem está no controle: o pensador ou o pensamento?

“O pensamento é o diálogo da alma consigo mesma.”

Platão

 

Muitos de nós estamos aprisionados em nossos pensamentos. Perdemos a liberdade e a qualidade de presença, no sentido de percebermos com mais atenção ao que, de fato, está acontecendo ao nosso redor. Muitas histórias contêm mais inferências do que evidências. E como escreve Susan David, as pessoas acabam sendo “enredadas” por essas histórias: “em um modo específico de pensar ou de se comportar não estão realmente prestando atenção ao mundo como ele é. Elas são insensíveis ao contexto, seja ele qual for. Mais exatamente, elas estão vendo o mundo como elas mesmo organizaram, em categorias que podem ou não ter alguma coisa a ver com a situação em questão”.

 

Nossos pensamentos são carregados por experiências do passado, por aspectos inconscientes que se traduzem em algo que não fomos capazes de resolver totalmente, mas que ficam ali, “martelando”, sem que, ao menos, possamos ter uma percepção consciente de como nos roubam o discernimento. Wellington Nogueira, fundador dos Doutores da Alegria no Brasil, costuma dizer que carregamos muito “lixo mental”. Vale refletir sobre como estamos lidando com isso! Além disso, é essencial nos conceder pausas para deixar ir o que nos impedirá de usufruir da necessária qualidade de presença para que nos conectemos genuinamente aos acontecimentos e fatos.

 

Outro ponto é a forma como “culpamos” as pessoas e circunstâncias e não assumimos a responsabilidade pelo que nos cabe. É interessante observar que Luiza culpou o celular. Parece absurdo, mas é exatamente isso que fazemos muitas vezes. Nessa condição, não empreendemos esforços para ir na direção do que queremos e passamos a acreditar que somos vítimas e que não há nada mais a fazer. As adversidades acontecem, mas o que nós decidimos e fazemos após o fato é que condicionará os momentos posteriores. A respiração, nesse momento, ajuda muito! Pode trazer um alívio de que essa é somente uma dificuldade e que isso não apagará o seu brilho, passará assim como outras que já aconteceram.

Depois dos pensamentos, as emoções!

Você é capaz de perceber os seus sentimentos? Quantas vezes, agimos com raiva e, posteriormente, temos que gerenciar as consequências das nossas próprias atitudes? Quando somos capazes de fazer a gestão dos nossos pensamentos, atuando como observadores de nós mesmos, conseguimos mais facilmente nos autorregular e, claro, obter mais gestão de resultados do que consequências.

 

Não controlamos o que sentimos, mas regulamos as nossas emoções. Susan destaca ainda que se tornar emocionalmente ágil significa “ser flexível com seus pensamentos e sentimentos para responder da melhor maneira possível às situações do seu dia a dia”. Uma estratégia eficaz que contribui com essa habilidade emocional é justamente a clareza da nossa intenção. Quando cultivamos algo importante em nós que mobiliza nossas ações podemos refletir e atuar de modo a honrar esses valores e intenções, bem como de construir um legado maior, em vez de responder às situações pequenas e pontuais.


 Para nos desenredar, não podemos aniquilar nossos sentimentos, pois estaríamos comprometendo nosso próprio bem-estar. Também não podemos reprimir as nossas emoções. Não reconhecer sua existência gera um acúmulo e um transbordamento repentino, pois, em algum momento, essas emoções vêm à tona, como um adoecimento ou uma explosão de raiva. Outro comportamento comum e sem resultados positivos são os denominados por Susan como “ruminadores, pessoas que ficam obcecadas por uma dor, um fracasso percebido, uma deficiência ou uma ansiedade”, aquelas que continuam pensando da mesma forma sobre o mesmo fato e se culpando sobre isso. Saiba que nossas emoções negativas não são ruins. Elas funcionam como um alerta. Podem, sim, claro, se tornar ruins quando não somos capazes de perceber, refletir e agir com mais consciência. Veja que interessante esse trecho que está no livro da Susan David, Agilidade Emocional, de Clayton M. Christensen, saudoso fundador da teoria de Inovação Disruptiva:

“Ano passado, recebi o diagnóstico de câncer. Precisei encarar a possibilidade de que minha vida chegaria ao fim antes do que eu planejaria. Felizmente, parece que serei poupado. Mas a experiência me forneceu um importante insight.

Tenho uma noção bem clara de como minhas ideias trouxeram enorme ganho para as empresas que as usaram; sei que tive um impacto significativo. Mas, ao enfrentar essa doença, foi possível perceber como isso é irrelevante para mim hoje em dia. Cheguei à conclusão que o critério pelo qual Deus vai avaliar a minha vida não é o financeiro. O que contará é cada indivíduo cuja vida toquei.

Creio que assim será para todos. Não fique pensando em quanto destaque pessoal você obteve; pense nos indivíduos a quem ajudou a se tornarem pessoas melhores. Essa é minha recomendação final: pense nos critérios pelos quais a sua vida será julgada e adote a resolução de viver todo dia de modo que, no final, essa vida seja considerada um sucesso”.

 

Cuidado com o mundo de fora e com aquilo que pode confundir você. Olhe para dentro, compreenda-se e encontre o que é sucesso para você. Estou certa de que isso vai tornar a sua jornada de vida mais equilibrada e leve. Dance mais, lute menos. Com inteligência emocional, você adquire a tão importante agilidade para lidar com as adversidades que, com certeza, aparecerão e transforme-as. Não fique paralisado, aprenda com elas e seja o comandante desse transatlântico que se chama vida. Afinal, a Luiza pode ser você nos próximos minutos.

Referências bibliográficas
  • DAVID, Susan. Agilidade Emocional: abra sua mente, aceite as mudanças e prospere no trabalho e na vida. São Paulo, Cultrix, 2018.
  • Amy Cuddy. O poder da presença HBR – Gerencie a si mesmo – 10 leituras essenciais da Harvard Business Review. 2016.
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Assédio no ambiente corporativo

Assédio no ambiente corporativo

 

O tema assédio no trabalho vem se tornando cada vez mais relevante nos últimos anos. Recentemente, tivemos aprovada a lei no 14.457/2022, que instituiu que as empresas promovam treinamentos e debates sobre o combate a todo tipo de assédio, medida que concedeu a legitimidade que o assunto requer e posicionando-o de fato para o lugar que ele precisa e deve ocupar como um ato de violência social que gera prejuízos severos a toda dinâmica existencial de quem sofre abuso.

Essa necessária discussão tem reacendido finalmente a esperança de muitas pessoas que, durante anos, foram alvo de ofensas contra a sua dignidade e não tinham onde se apoiar. Primeiro porque essa questão durante muito tempo foi tida como inabilidade social de quem a pratica e segundo porque esse tipo de violência e atos discriminatórios disfarçados de piadas sempre foram normalizados em nossa sociedade, sobretudo a brasileira, de herança escravocrata; no contexto organizacional, ainda fica mais difícil legitimar o assédio por se tratar de uma violência muitas vezes sutil. Nesse sentido, Hirigoyen (2012), psiquiatra e importante pesquisadora faz uma importante observação por meio dos seus estudos clínicos: quanto mais se sobe na hierarquia e na escala sociocultural, mais as agressões ficam sofisticadas e de difícil caracterização. 

Do ponto de vista jurídico, ainda é muito difícil caracterizá-lo por não se conseguir especificar objetivamente a origem do sofrimento emocional, pois a realidade exterior não é a mesma realidade psíquica para quem sofre, porém, em face do cenário atual, no qual as práticas discriminatórias tornam-se cada vez mais evidentes em nossa sociedade, tem se debatido muito sobre o assunto trazendo luz a toda essa conjuntura social.

É importante salientar que o assédio moral ou outras condutas abusivas no trabalho é um ato perverso de violência, um atentado contra a dignidade e integridade humana que, em geral, ocorre sem uma explicação óbvia para além do preconceito e da discriminação. Os estudos sobre o tema mostram que, em geral, a violência começa a ser praticada por uma recusa do que é diferente, ou seja, tem algo no outro que “ameaça” o sistema e, na impossibilidade de conviver com essa diferença, deve-se eliminá-la a todo custo. Afinal, formatar os indivíduos ainda é uma maneira de controlá-los: uma orientação sexual diferente, um estilo de se comunicar que “ameace”  ou mobilize um grupo de novas formas; uma vestimenta que questione o status quo, questões étnicas, culturais, raciais, entre tantas outras; as ameaças são muito individualizadas, mas os efeitos emocionais são semelhantes em um aspecto crucial: causam rupturas significativas na autoestima de quem as sofre, além de virem acompanhadas por vários sintomas, como ansiedade, depressão, distúrbios psicossomáticos, entre outros. Hirigoyen (2012) observou em sua pesquisa que são poucas as agressões que causam distúrbios psicológicos tão graves a curto prazo e consequências a longo prazo tão desestruturantes.

Conceitualmente, o assédio moral no trabalho se configura como todo e qualquer ato abusivo (gesto, palavra, comportamento, atitude) que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade e integridade física ou psíquica de uma pessoa, ameaçando o seu emprego ou degradando o clima de trabalho (HIRIGOYEN, 2012). Margarida Barreto, uma das precursoras no Brasil sobre essa questão, entende que, no contexto organizacional, trata-se de uma gestão baseada na humilhação. É na repetição e no efeito cumulativo que se configura o assédio moral.

Margarida Barreto ainda levanta a questão de essa prática estar ligada às mudanças do formato de trabalho e quase todas as pesquisas sobre o assunto igualmente apontam para a direção do estresse. Com a globalização e a internet, tudo ficou mais rápido e as necessidades de novas respostas também. Hoje, os trabalhadores são pressionados por metas e inovação e, muitas vezes, as pessoas acabam controlando isso de maneira bastante degradante. Porém, vale ressaltar que, mesmo que o estresse constitua um desgaste físico e emocional importante em nosso cenário atual, o assédio moral só se constitui porque existe um terreno fértil no qual ele pode se proliferar. Não existe violência isolada e praticada por uma única pessoa. O que há é um sistema que corrobora com essa prática, principalmente quando as empresas não têm uma gestão clara ou políticas de combate eficientes que eliminem um estilo ultrapassado.

 

Podemos observar que são diversas as formas que o assédio moral no trabalho é praticado. Além dos atos explícitos mais simples de serem identificados, há os atos sutis, a violência velada repetida diariamente sem que a vítima necessariamente consiga perceber ou nomear: o isolamento por exemplo, cujo objetivo é sempre desmobilizar a vítima para que ela não seja mais capaz de responder, ficando totalmente vulnerável no contexto. Hirigoyen (2012) denomina o assédio como a patologia da solidão, pois as pessoas isoladas são prioritariamente as mais ameaçadas; as que possuem aliados ficam protegidas. 

Mas existem outras maneiras de desmobilizar ou desvitalizar as vítimas como, por exemplo, deixá-la em dúvida sobre o seu trabalho por meio de ataques pessoais repetidos ou lançando um volume de trabalho muito além do possível para que o outro não suporte a demanda e cometa erros ou até mesmo peça demissão. Afinal, não fornecer a uma pessoa as ferramentas e as informações necessárias para a realização da atividade é uma estratégia eficaz de demonstrar a sua ineficiência.

Independentemente do modo, no assédio o que se torna mais degradante é a pessoa sofrê-lo e nem saber exatamente a origem disso. Observa-se que esse tipo de violência está mais ligado às características pessoais de quem sofre do que propriamente os seus atributos profissionais; nesse sentido, uma pessoa pode ser colocada à margem, ser maltratada ou humilhada, sem que lhe digam por que está sendo acusada. Tudo o que ela pode fazer é supor e lidar com as suas dores, como se fosse inadequada por ser de um determinado jeito ou característica. E, na tentativa de buscar uma compreensão e fechar uma narrativa que justifique esse entendimento, as vítimas frequentemente se perdem em meio a questionamentos infrutíferos, muitas vezes, inclusive ajustando o seu comportamento para pertencer a determinado grupo social. E isso se torna tão enfadonho que o adoecimento aparece.

O assédio moral e sexual tem ganhado grande repercussão diante de toda a conjuntura social e política que estamos vivendo. Os prejuízos emocionais e econômicos são enormes para as empresas, para as pessoas e para as famílias de modo geral. É preciso nos unirmos para legitimar abordagens mais compassivas se quisermos vivenciar alguma transformação positiva na sociedade.

Sabemos que as camadas de transformação são profundas principalmente quando se pensa na origem do assédio. Porém, é possível encontrar soluções por meio dos atos de cuidado e compaixão que exercemos em nosso dia a dia; no caso das empresas, existem diversas possibilidades para diminuir esse e outros tipos de violência e transformar um ambiente melhor para se viver e trabalhar, como o estabelecimento de políticas eficazes de recursos humanos, canais de denúncias que investiguem os comportamentos contraproducentes que ferem os valores e os pilares de cada organização, o estabelecimento de palestras e diálogos que visem maior consciência dos colaboradores, ações de desenvolvimento de habilidades socioemocionais e de não violência, a construção de uma cultura que promova saúde e produtividade. As empresas exercem um poder de influência gigante na sociedade e são pilares importantes de transformação. Todas essas medidas podem gradativamente ensinar e ampliar para novas formas de se relacionar com as pessoas construindo um mundo melhor.

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Elas por elas, elas por eles.

Elas por elas, elas por eles

Compreender o caminho que leva as mulheres a ocuparem seu espaço nas empresas, seus desafios, estratégias de enfrentamento e aprendizados é uma forma de contribuir para que outras mulheres continuem esse caminho. Este capítulo, apresenta a experiência de quatro mulheres executivas cuja jornada as levou a romperem o “teto de vidro”. Apresenta, também, a perspectiva de três grandes executivos sobre esse tema relevante e que ainda traz desafios a serem superados.

A participação da mulher no mercado de trabalho, em especial ocupando cargos de liderança, tem sido alvo de discussões com maior ênfase a partir da década de 80, quando o fenômeno do glass ceiling (teto de vidro) elencou as barreiras invisíveis que dificultam o acesso das mulheres aos cargos de maiores salários e responsabilidades.
 
Embora com avanços perceptíveis, as pesquisas realizadas pela Mckinsey mostram que, nos últimos cinco anos, o número de mulheres que passaram a ocupar cargos nos níveis mais altos das empresas aumentou, mas a igualdade de gênero ainda está longe do ideal. Além disso, a porcentagem de mulheres em cada nível entre 2015 e 2019 é inversamente proporcional à altura do cargo; um ponto intrigante uma vez que, de acordo com essa consultoria, companhias com mais mulheres na liderança, quando comparadas com a média da indústria, vê um resultado operacional 48% maior e uma força de crescimento no faturamento de 70%.
 
Para discutir este assunto é preciso levar em consideração paradigmas históricos, que vão desde a criação das empresas por homens brancos, caucasianos; a distinção do que é papel de homem e de mulher; até o ingresso das mulheres no mercado de trabalho no Brasil no início do século XX, ocupando posições de assistentes e secretárias.
 
Neste capítulo, quatro mulheres que romperam essa barreira compartilham suas experiências, desafios e aprendizados. O quadro abaixo apresenta o perfil das entrevistas:
Além da visão feminina, incluí a percepção de três executivos de expressão sobre esse movimento: Executivos 1 e 2: diretor e gerente geral que atuam em empresas do segmento farmacêutico; e Executivo 3, presidente de empresa do segmento de tecnologia.

Botando o pé na porta: elas chegaram lá!

Assumir uma posição de liderança sempre representa um desafio, que se diferencia em função do contexto e dos atores nele envolvidos. 
 
Os maiores desafios trazidos pelas executivas foram deixar de ser decisora individual e tornar-se colaboradora de equipe, lidar com hierarquias diferentes, delegar e engajar o time. 
 
A falta de preparo na formação foi um fator crítico, de acordo com três delas. Conhecimento do negócio, do mercado, estratégia, etc. podem ser facilmente aprendidos; “o grande ponto é aprender como conseguir dar o seu melhor e motivar cada um a fazer o mesmo, ser um facilitador para o time e entre áreas”(executiva 1).
Para a executiva 4, o maior desafio foi a aceitação do time, tanto de homens quanto de mulheres. “As pessoas têm uma imagem formada, sabem seus pontos positivos e a desenvolver e esses últimos geram maior desconfiança.” 
 
O segmento farmacêutico é, aparentemente, mais aberto. Ambas as executivas que atuaram nesse segmento nunca sentiram o peso da discriminação, embora houvesse áreas predominantemente masculinas quando assumiram seus cargos. 
 
Ainda assim, quando a executiva 1 ocupou o primeiro cargo de diretoria, cujo papel era garantir o compliance e fazer recomendações para todos os níveis executivos da empresa, o ser ‘mandado’ por uma mulher não soava bem. A grande estratégia veio de sua autoconfiança e da forma como ela abordava os assuntos.
 
O segmento de energia, predominantemente masculino, trouxe experiências expressivas para a executiva 3. Em uma ocasião, era a única mulher e sponsor de uma reunião em que os participantes achavam que tomar notas era função dela, o que ratifica o antigo paradigma sobre qual é o papel da mulher.
O mais marcante para a executiva 4 foi não ter recebido o apoio esperado das mulheres do time que, antes de olharem para sua capacidade e empenho, olhavam o ‘invólucro’ (roupa, sapato, cabelo), comportamentos primários de julgamento ao invés de apoiarem e comemorarem a conquista de uma delas, revelando falta de sororidade (Sentimento de solidariedade e empatia entre meninas e mulheres.).

Como superaram os desafios

Um desafio em comum enfrentado por elas foi assumir a posição de protagonista. Para isso não se deixaram intimidar e aproveitaram as oportunidades que surgiram, estando bem preparadas para as diferentes situações que teriam de lidar.
 
Entre acertos e erros, prevaleceu o entendimento da inteligência emocional como diferencial. Diálogos foram fundamentais em todos os casos, trazendo às pessoas o entendimento de que todos estão atuando para conquistar o mesmo objetivo.
 
O posicionamento da executiva 3 era interpretado como duro por conta de uma abordagem mais incisiva o que, no mundo masculino, é entendido como firmeza, mas no feminino é mal interpretado e travestido de palavras depreciantes como neurótica, por exemplo, o que leva a desqualificar o discurso, aspecto ratificado pela executiva 2: “Se o homem é abrasivo é aceitável, a mulher não.”
 
Além disso, a executiva 4, adotou o tratamento justo como estratégia para trazer a equipe para si: “se um membro do time está sentado do lado de um colega que não faz nada, o líder tem que tomar uma atitude.”
 

Aprendizados e habilidades desenvolvidas

Os aprendizados se relacionam à capacidade de exercer a liderança 360º: ser ponto de apoio para a equipe e entre pares e outras áreas. O autoconhecimento permitiu ampliar a comunicação empática e influente, escuta genuína, não menosprezar o sentimento do outro, articular o discurso em função da audiência, administrar as singularidades e aproveitar os talentos das pessoas. 
 
No caso das executivas 1 e 2, atuar em uma empresa que tinha programas de desenvolvimento de lideranças foi fundamental, com a clareza de que os skills técnicos somente não as sustentariam na nova posição.
 
Os feedbacks também ajudaram no processo de desenvolvimento. No caso da executiva 2, o feedback da equipe elevou sua curva de aprendizado sobre como adequar o tom de fala e ter clareza dos gatilhos que surgiam em momentos de estresse, além de contar também com o feedback de seu superior ao assumir uma grande diretoria.
 
Os feedbacks levaram a executiva 3 a ampliar sua habilidade em lidar com a singularidade das pessoas e adequar a forma de abordagem, sem resvalar no comportamento masculinizado para ganhar respeito.
 
A executiva 4 reforça que, além de se conhecer, é preciso capacitar-se. Conversas com pessoas/mentores experientes são apontadas como importantes tanto por ela quanto pela executiva 1.
 
Os executivos entrevistados reiteram o apontado pelas entrevistadas, ressaltando que, das habilidades das mulheres líderes, destacam-se resiliência, determinação, foco no resultado e capacidade de trabalhar colaborativamente em um ambiente competitivo, além de aprenderem de forma acelerada.
 

O ambiente empresarial hoje: um misto de avanço com ecos do passado.

Todas as executivas consideram o ambiente atual mais aberto em função da maior disseminação das informações e fóruns de discussão, ampliando a perspectiva sobre a importância de a mulher ocupar espaços antes ocupados preferencialmente por homens.
 
Entretanto, na opinião de todos os executivos, a mudança é mais lenta do que de-veria. Empresas que queiram levantar essa bandeira devem cuidar tanto do ambiente como um todo, como capacitar as mulheres para que estejam preparadas a ocupar posições de gestão. 
 
A executiva 1 percebe que ainda há crenças que tendem a nublar a visão sobre a capa-cidade feminina em ocupar posições de CEO e Diretoria: mulher é muito sentimental, não tem estrutura para fazer alguns enfrentamentos. Essa visão é compartilhada pelos 3 executivos entrevistados, que apontam vestígios da cultura machista, especialmente na América Latina.

 

Entretanto, muitas pesquisas mostram que cada vez mais as lideranças são cobradas por competências e habilidades socioemocionais e não pelo gênero, raça ou condição física (executivo 1).

Para a executiva 4, cada evento de diversidade convence mais pessoas de que os obstáculos existiram e não podem ser ignorados. Na perspectiva dos executivos 1, 2 e 3, esse tema tem que ser amplamente debatido, sem restrições, ampliando a discussão quando se trata da mulher negra. Na estatística das 500 maiores empresas do Brasil, de 550 executivos, apenas 0,4% são mulheres negras. 
 
Outra ação apontada pelo executivo 3 é que os altos executivos devem criar espaços de diálogo: ouvir mulheres de todos os níveis para entender a dor delas. 
 
Para a executiva 3 a pandemia trouxe à tona novos desafios quanto a flexibilidade de horário, uma vez que a mulher precisa dividir o seu tempo entre trabalho, casa e família. Isso catalisou a visão da necessidade de uma boa parceria em casa, dado que a mulher ainda tem uma carga grande em termos de gestão familiar. Essa visão é ra-tificada pelos executivos 2 e 3.
 
As mulheres que galgam posições na empresa têm resiliência bem estabelecida, re-sultante da capacidade em lidar com vários eventos: prepara a reunião, cuida do filho, olha a mãe. Por outro lado, a energia e a atenção para não deixar os ‘pratinhos caírem’ acaba cobrando seu preço em termos de exaustão física e psicológica.
 
Na opinião de todos os executivos, ainda existem preconceitos, embora mais velados: questionar o tempo de dedicação de mães com filhos pequenos, a tratativa da gestação. O executivo 2 ouviu de superiores que não poderia vir a reclamar por contratar tantas mulheres. Uma visão míope, pois as mulheres com as quais trabalhou eram compro-metidas, deixavam tudo tão preparado que praticamente não se sentia o impacto da ausência durante a licença maternidade. 
 
Apesar disso, muitas mulheres parecem se constranger ao avisar a empresa de sua gravidez, bem como ainda se cobram de conseguir um equilíbrio perfeito entre os vários papéis desempenhados.

A fala da experiência contribuindo para quem vai ocupar uma posição de liderança

A partir de suas experiências, as executivas elencam pontos que devem ser alvo de atenção para as mulheres que desejam ocupar posições de liderança:

Executivo 1

Conhecimento técnico é importante, mas não suficiente.
Conheça e explore outras habilidades suas e adquira os conhecimentos que forem relevantes para a posição.
Ouça todos os lados, explore sua sensibilidade, ouça e entenda seu desconforto. Se está desconfortável, pare, respire. 

Executivo 2

Esteja bem centrada e consciente de quem você é para dar o seu melhor e enfrentar bem os desafios. Aprenda no dia a dia, identificando o que deu certo e o que poderia ter sido feito diferente. Reflita, mas não seja super crítica consigo mesma.

Executivo 3

Tenha consciência de que é tão capaz como qualquer outra pessoa.
A inspiração sozinha não basta. Desenvolva os potenciais que tem guardado e que são os presentes que recebeu quando nasceu. 
Seu autoconhecimento poderá auxiliar os outros a se conhecerem e se desenvolverem plenamente, transformando o ambiente de trabalho em uma escola de florescimento.

Executivo 4

Esteja preparada, estude muito e sempre, não espere a oportunidade aparecer para se preparar. 
Ouse, arrisque tenha coragem para fazer a diferença.
Pratique e divulgue a sororidade.
Muito do que as executivas deixam para reflexão é compartilhado pelos executivos entrevistados:

Executivo 1

Saiba onde quer chegar, entenda o que já tem de conhecimentos e habilidades e o que precisará desenvolver.
Converse com pessoas que ocupam a posição alvo, leia, saia da zona de conforto. 
Não espere alguém te dar espaço para falar, se expresse com firmeza, mesmo no meio de maioria masculina. Se imponha positivamente.

Executivo 2

Nunca desista, enfrente o status quo, assuma o protagonismo.
Ajuste forma e conteúdo da fala para não entrar em modo autodefesa e soar agressiva na abordagem. 
Passe a mensagem com a força necessária, sem passar do ponto.

Executivo 3

Seja você mesma, sempre.
Tenha resiliência.
Siga sempre seu coração.
Muito ainda pode ser falado a respeito. Se você deseja ser uma líder, siga em frente, se prepare, floresça. Você tem dentro de si todo o potencial que precisa. E como diz a frase: E se der medo? Vai com medo mesmo!
Que a experiência dessas mulheres e a perspectiva dos executivos tragam boas reflexões.

Referências:

 
 
LIPMAN, J. Escute o que ela diz: O que os homens precisam saber (e as mulheres falar) sobre trabalhar juntos. Primavera Editorial, São Paulo, 2019.
 
OLIVEIRA, B.B.; WOIDA, L.M. O Fenômeno Glass Ceiling e o Acesso à Informação: Estudo Sobre Barreiras Invisíveis Impostas às Mulheres no Trabalho. Complexitas – Rev. Fil. Tem. Belém, v. 3, n. 1, p. 61-75, jan./jun. 2018.
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O peso das palavras

Gosto muito de parar uns minutos para pensar “no que falo” e “como falo”, porque as palavras têm poder e o “como” faz muita diferença!

Uma certa manhã eu falei: “Agora eu tenho que trabalhar.”. Quando proferi estas palavras, pensei: “Por que usei “tenho que” se eu faço o que gosto com muito carinho?” “Ter que” carrega uma certa carga de obrigação, e isto não era o que eu sentia e sinto sobre o meu trabalho.

Naquele momento, tudo com rapidez, eu reformulei: “Agora eu vou trabalhar!”, e me senti bem mais leve.

Há coisas que “temos que”, como tomar um antibiótico, mas nem tudo! Limpar uma casa, por exemplo, é um grande meio para nos limparmos e deixarmos ir o que nos machuca.

Outras vezes, eu parei para pensar nas frases com o verbo “precisar’, frases estas que eu usei ou ouvi. Na frase “Eu preciso de um celular novo!”, quando o nosso aparelho está bom, a ideia é mais “eu quero um celular novo”, certo?

Quantas coisas nós queremos!

Muitos vivem com muito pouco e são felizes só com o que precisam, como água, alimento, roupas adequadas à temperatura e abrigo. Gandhi viveu em um ashram com quase nada! Ser de Luz!

Eu ainda preciso ler muitos livros e ter muitos cristais, … Ainda estou muito longe desta leveza, mas aprendo todos os dias sobre a diferença entre querer e precisar. É um desafio!

Há até uma música de Balu e Mogly para nos ensinar:

“Eu uso o necessário,

Somente o necessário,

O extraordinário é demais! …”

E já que acabei de usar a palavra “necessário”, vou mencioná-la novamente em uma frase de Ralph Waldo Emerson (1803 – 1882 USA) para que pensemos nela com muito carinho e possamos fazer a diferença que o momento nos pede: “Torna-te necessário(a) a alguém!”

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Dois amigos viajantes e a cascavel

Um motorista conduzia seu automóvel por uma estrada de terra em companhia de seu amigo, parceiro e companheiro de longas datas. De repente, ele freou bruscamente.

– Não! Não para! Por favor, não para! Exclamou o amigo. -Passa por cima e mata de uma vez!

O motorista continuava com o pé no freio e esperava com paciência, enquanto a víbora se rastejava vagarosamente. Era uma cascavel enorme que estava voltando para casa. Estava machucada e precisava atravessar para o outro lado da estrada, pois lá, estariam a sua espera, sua família e seus amigos.

– Tá esperando o que? Vamos! Ainda dá tempo, seja corajoso! Ela é cruel, venenosa, peçonhenta! – Mate-a! Espécie maldita que deveria ser exterminada! O amigo insistente esbravejava para o motorista.

Para a surpresa dos viajantes, a cobra parou por um instante no meio da estrada. Esticou o pescoço, levantou a cabeça e pôs-se a olhar para os dois como se estivesse prestando atenção na discussão. Os dois amigos se entre olharam sem entender absolutamente nada. – Ela parece está nos vendo. Que estranho! Ela parece está nos ouvindo também… Mas cobras não ouvem. – Disse o motorista ao amigo insistente.

E o amigo continuou insistindo – Não sei o que você está esperando para matá-la. Vamos, é a nossa chance, acaba de uma vez com ela! A cobra por sua vez, enrolou-se em volta de si mesma, colocou a cabeça por cima do corpo, lambeu a língua, levantou a cauda e tocou o guizo.

Assustados e sem entender absolutamente nada o motorista pediu que seu amigo calasse a boca e disse em tom extremamente baixo: – cobras não ouvem, mas tem uma sensibilidade muito aguçada capazes de perceber uma ameaça a metros de distância. O amigo insistente respondeu-lhe também sussurrando: -Mas nós estamos em vantagem, ela não. Portanto, não pode nos fazer mal algum, ela está vulnerável é só ligar o carro e pronto… O motorista continuou firme na sua decisão e respondeu – Não posso fazer isso, é só um animal e não está nos fazendo mal algum, além disso, está machucada por isso está lenta. Vou deixá-la seguir. Devagarinho a cobra foi saindo da sua posição defensiva, se desarmou e continuou seu caminho até atravessar totalmente estrada.

Os dois amigos mais uma vez se entreolharam e seguiram, mas não foram muito longe, logo adiante o carro enguiçou e tiveram que descer para tentar consertá-lo. O pneu havia furado e precisava trocá-lo, mas para isso precisavam de suporte para a manobra. O motorista virou-se para seu amigo e disse: – Precisamos encontrar alguns troncos para apoio. Os dois saíram à procura da suposta ferramenta e logo o motorista retornou, porém, seu amigo não.

Esperou por uma, duas horas e nada… Resolveu ir à procurado companheiro. Após alguns metros não muito longe dali, ouviu uma voz de súplica:- Por favor, deixe-me ir…, Choro…, soluços, e, um barulho estranho entre as folhagens… O motorista parou um pouco e depois apertou o passo – Meu Deus o guizo!

Era o chocalho de um cascavel. Não pode ser…, pensou o motorista que, guiado pelos sons e súplicas conseguiu encontrá-lo.

Lá estava seu amigo rodeado por várias serpentes em posição de ataque – Socorro! Tire-me daqui! Vão me matar… – Era possível sentir o pavor em sua voz. – Tire-me daqui, eu não mereço isso…

– “Não se aproxime”, disse uma das cobras ao motorista.

– “Deixem-no!” A ordem veio da cobra maior. Às outras cobras, ordenou que não o atacassem, pois era um bom homem, sensível, e de bom coração. Ouvindo aquilo, o motorista deu um, dois, três passos atrás e depois parou sem acreditar no que estava vendo.

– “Senhor, isso não pode ser possível!” A cobra olhou para o motorista e disse-lhe – “Aproxime-se, não tenhas medo, não vamos lhe fazer mal e também não deixemos que outras serpentes o façam”. E continuou. “Seu amigo está aqui nessa condição apenas para entender como é se sentir ameaçado, indefeso e vulnerável; realmente, não nos foi concedido o dom de escutar, porém, nós serpentes, temos uma sensibilidade incomparável a qualquer outro animal.”- “Sentimos cheiro de perigo há metros de distância, e essa capacidade vocês humanos não a têm; a prova disso é a presença do seu amigo aqui.”

– “Então, me diz agora quem está em condição de vulnerabilidade; quem está em desvantagem?” – Continuou o discurso.-“Sou capaz de adivinhar cada palavra de incentivo dita ao seu amigo; sentir o perigo na pele e não poder fazer nada é uma sensação de impotência terrível; não fiz nada, só queria voltar para casa em paz, minha família, assim como a sua, esperava por mim; estava muito machucada e com dor, não pude correr.” – “Não pode julgar- me se não conheces minha estória.” A cobra continuou firme em suas palavras. – “Somos peçonhentas sim, somos venenosa sim, mas… Nesse momento ela baixou a cabeça e entre soluços soltou: …não sou cruel, e diferente de vocês humanos que perdem para a intolerância, uso meu veneno para defender-me; não atacamos ninguém aleatoriamente; e assim como vocês também temos o nosso papel aqui na terra, somos essenciais sim.” Continuou. – “Contento-me em saber que, apesar da maldade de pessoas como você ainda existem pessoas como seu amigo; ele me salvou avida e agora acabo de salvar a sua.” E ordenou: – “Soltem-no!” – “Deixem que vá!” – “Tenho certeza de que, se não aprendeu a lição ao menos refletirá sobre tudo que sentiu aqui; assim, saberá diferenciar sensibilidade e generosidade de covardia e maldade; saberá diferenciar os sentimentos de impotência, diante da vulnerabilidade, de coragem e medo.” – E concluiu. -“Entenderá que, se colocar no lugar do outro é respeitar-se a si mesmo; e que o perdão liberta a alma e a gratidão acalenta-a.

Moral da história: ainda que conheçamos a história do outro, não estamos aqui para julgá-la. Portanto, não faça com ninguém aquilo que você não quer para si.

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Roupa no varal

Eu gostaria de saber quantos botões eu aperto desde a hora que me levanto até a hora que me deito. O último é sempre o do abajur que fica ao lado da cama, mas o primeiro depende das atividades de cada dia. Alguns dias é o do alarme do celular, outros é o botão do micro-ondas, já que não acordei muito cedo.

Os botões que aperto são os mesmos apertados pela grande maioria das pessoas neste momento: do forno, do fogão, do carro, …, mas um em particular, eu deixei de apertar.

Com mais tempo em casa, não somente parei de apertar o botão da secadora de roupas, como também parei de pendurar as roupas na lavanderia, e passei a usar os varais lá do quintal da casa, que sempre estiveram no mesmo local, esperando pacientemente para poder me ajudar, mas eu passava correndo por eles, como se não existissem.

 

Certo é, que ao pendurar as roupas no varal, sou forçada a olhar para cima, e o “teto” é o céu! Os cordões verticais dos varais de teto são substituídos por cordões horizontais presos às paredes, e o teto, sempre branco, é substituído por diferentes tons de azul, de branco, de cinza…

O monge budista Vietnamita Thich Nhat Hanh, no seu livro A Arte de Viver, me ensinou que podemos entrar em um estado meditativo enquanto cozinhamos, limpamos a casa, ou fazemos qualquer outra tarefa, sem a necessidade de estarmos em posição especial, nem em um lugar especial.

Ao olhar para cima, amplio meu olhar, meu pescoço agradece e a tela do computador, do celular ou a página do livro, que estão sempre a dois palmos de distância dos meus olhos, vão lá longe, muito alto! “Far, far Away!”, como diz Shrek.

Nestes momentos, mesmo estando ocupada pendurando as roupas, viajo nas nuvens, observando suas cores, formas e tamanhos. Às vezes, vejo o Sol! É claro que isto depende do horário. Às vezes, vejo a Lua, mas isto depende não só do horário como também da sua fase. Mas sempre vejo as três imensas palmeiras que tenho no jardim, com suas enormes folhas de um lindo verde escuro, e os frutos, vermelhos quando maduros, que atraem as aves.

Voltando aos varais, eles me remetem ao passado, quando isto era o que todos faziam, e quando os relógios davam todas as suas voltas com menos pressa.

 

Será que observavam o céu?

Sim! Porque lhes dava informações importantes para o cultivo da terra, não é?

Agora, eu também observo muito mais, porque “tenho roupas no varal” e é importante saber sobre a chuva, a garoa, o vento…

Porém, mais relevante do que tudo isto, pois se as roupas molharem, serão lavadas novamente, e tudo bem, é que quando eu olho para o céu, para cima, para fora de mim, estou na verdade olhando para bem dentro de mim, me vejo ínfima diante do Universo, mas ao mesmo tempo imensa porque sou parte deste todo!

Somos parte do Todo!

E saber disto faz muita diferença!

 

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Ah! o dinheiro… Um papo sobre finanças comportamentais

“Pensar em termos monetários, além de não colaborar para a melhoria de nossas decisões financeiras, ainda nos altera de forma profunda e, por vezes, problemática”. É com esta mensagem que Dan Ariely e Jeff Kreisler iniciam a discussão sobre finanças comportamentais em seu livro “Dollars and sense”, publicado em 2017 [1].

Embora o dinheiro em si seja algo aparentemente simples, assim que usamos o nosso passamos por uma transformação em que a simplicidade de cálculos numéricos dá lugar a uma complexidade de emoções que determina nosso comportamento de maneiras peculiares, das quais não nos julgaríamos capazes, e que frequentemente nos empurra para bem longe de nossos interesses declarados.

O curioso é que, geralmente, nós nos sentimos confiantes a respeito de nossa capacidade de precificar as coisas e, mais ainda, nossa habilidade de identificar bons negócios e aproveitá-los.

Imagine que você está chegando do supermercado com várias sacolas na mão – há itens de geladeira aí no meio – e, ao colocar a chave na fechadura de casa, ouve um ruído estranho e percebe que parte dela ficou presa lá dentro, quebrada. Você então chama um chaveiro para resolver o problema. No primeiro cenário, o profissional conserta a fechadura em meros 5 minutos e cobra R$ 100,00 pelo serviço; no segundo, o profissional leva 1 hora para finalizar o trabalho, cobrando também R$ 100,00.

‍Em qual das duas situações você consideraria mais justo pagar esse valor?

 

Se você é como a maioria das pessoas pesquisadas, sua resposta indica que o segundo profissional “merece” mais os R$ 100,00 do que o primeiro. Afinal, ele trabalhou mais.

Mas será que essa lógica está correta? Neste caso, o segundo profissional pode ter demorado mais simplesmente porque tinha menos habilidade ou não dispunha das ferramentas adequadas para consertar a fechadura – em outras palavras, você não estaria remunerando propriamente o “esforço adicional”, mas sim a incompetência ou a falta de planejamento.

A precificação de um serviço, portanto, não deveria ter nada a ver com o esforço (tal como horas de trabalho ou custo médio dessas horas) dedicado à sua conclusão. Pelo contrário: ela seria mais assertiva se remunerasse amaneira como esse serviço serviu ao nosso objetivo – no exemplo, entrar em casa o mais rápido possível para guardar as compras e descansar.

Pense em quantas vezes você gastou centenas de reais em um equipamento eletrônico, um item opcional para o carro ou alguma extravagância durante viagem, sem pensar muito no impacto que essa compra traria ao seu fluxo de caixa; agora pense em quantas vezes você dirigiu por mais três ou quatro quarteirões só para economizar R$0,10 no preço do combustível – uma diferença que, projetada no tanque cheio, fica entre R$5,00 e R$6,00.

‍‍

Será que temos usado nosso tempo corretamente quanto o assunto é dinheiro?


Segundo Ariely (2008): “Nós não possuímos uma régua interna capaz de dizer quanto cada coisa vale. Em vez disso, focamos na vantagem relativa de uma coisa sobre a outra, e a partir daí estimamos seu valor”. Há, portanto, uma relação precária entre a racionalidade que julgamos ter e as decisões que tomamos a respeito do dinheiro. E a maioria delas, como veremos a seguir, passa pelo campo das emoções e sentimentos.

Por que os meios de pagamento são cada vez mais abstratos?

No passado, tínhamos de pagar nossas compras com dinheiro em espécie, havendo assim um conjunto de ações muito concretas envolvidas nessa transação: tirar a carteira do bolso, abrir o compartimento de cédulas, pegar um punhado de notas, contá-las, entregar a quantia ao vendedor e, por fim, guardara carteira de volta, agora menos “recheada”. Essa sequência, aparentemente trivial, trazia consigo um símbolo importante: elas indicavam de maneira inequívoca que estávamos gastando dinheiro, nosso dinheiro, pois víamos uma determinada quantia literalmente sair de nosso bolso em direção à gaveta da caixa registradora desse comércio.

O resultado é algo que as Ciências Comportamentais chamam de “dor de pagar”: sempre que desembolsamos uma quantia, seja ela direcionada a uma compra útil e extremamente satisfatória ou a algo frugal, nosso cérebro ativa algumas respostas químicas que provocam desconforto. Com o perdão do trocadilho: gastar dinheiro é desgastante.

Mesmo o cartão de crédito, antigamente, tinha um pouco dessa sensação: nós o entregávamos ao lojista, que o passava por uma máquina munida de papel carbono, emitindo assim três vias de comprovação da venda, assinadas pelo portador. Só depois recebíamos o plástico de volta para guardá-lo na carteira.

 

Hoje, porém, as transações financeiras assumem formatos cada vez mais abstratos. Se por um lado essa virtualização simplifica e acelera o processo, por outro ela suprime uma espécie de “proteção natural” que tínhamos.

Das máquinas de cartão de crédito, como esta da figura acima, passamos para cartões magnéticos; destes para os cartões com chip; a partir da internet e advento do e-commerce, vieram os cartões virtuais, dedicados a compras online; seguidos pelos meios de pagamento contactless (popularizados agora, com a pandemia, já que evitam o contato com as teclas da máquina); e, por fim, as carteiras virtuais, um tipo de conta corrente que pode ser associada a sites e lojas, que realizam assim movimentações automáticas.

Observe que o processo, além de digital, foi desvinculado quase totalmente da sensação de compra e, por conseguinte, da dor de pagar. Quando apontamos nosso celular para um QR Code que, por sua vez, debita uma quantia correspondente do saldo disponível em uma carteira virtual, não nos damos conta desse dispêndio. É como se a transação econômica não tivesse existido – ao menos, não para o nosso cérebro envolvido no piloto automático (leia mais aqui sobre o Sistema 1) e para as nossas emoções.

Segundo diversos experimentos conduzidos por Ariely, o impacto dessa transição dos meios de pagamento físicos para os 100% digitais provoca sérias mudanças de comportamento de consumo. Usando cartões de crédito, por exemplo, as pessoas geralmente gastam mais, fazem compras maiores e deixam gorjetas mais altas. Adicionalmente, tendem a subestimar ou até ignorar a evolução de gastos ao longo do mês.

Você já deixou de conferir o extrato do seu cartão de crédito no app por medo de descobrir que gastou mais do que deveria?

 

Dupla ilusão no tempo

Além dos pontos tratados anteriormente, a utilização do cartão de crédito nos torna sujeitos a duas ilusões:

1. Quando efetuamos a compra, pois temos a sensação de que o pagamento só acontecerá “lá na frente”, visto que o desembolso financeiro é efetivado apenas na data de vencimento da fatura (a menos que, por alguma razão, você decida antecipá-lo). Dessa forma, ficamos com a falsa percepção deque a transação ainda não foi consumada e, consequentemente, de que o valor ainda não foi comprometido;

2. Pouco depois de efetuarmos a compra, já que somos tomados pela sensação de que “já está pago”, mesmo ainda não tendo desembolsado o valor da fatura

Essa combinação ilusória reduz nossa dor de pagar, na medida em que trabalha as diferenças temporais existentes entre a compra, o fechamento da fatura e o pagamento propriamente dito. E embora isso nos permita aproveitar melhor a compra – como veremos a seguir –, é também um caminho perigoso para o descontrole financeiro, por permitir que essa satisfação resulte em gastos mais frequentes e maiores.

Como (não) estragar uma viagem de férias

Vamos supor que você vai sair de férias e passar duas semanas em um resort cinco estrelas. Para isso, você está organizando sua reserva pela internet, através de um site de viagens. Lá você se depara com três opções de pagamento:

1. Total antecipado: nesta opção, você tem de quitar 100% do valor da reserva online e até um dia antes do check in. A partir daí, não haverá mais nenhuma cobrança: durante sua estadia, você poderá consumir tudo o que quiser (all-inclusive) e, no check out, apenas devolver a pulseira de acesso e ir embora;

2. Postecipado: você já sabe o valor total da hospedagem, mas todos os outros custos – a cerveja tomada à piscina, o sorvete, o couvert artístico do jantar e assim por diante – serão apurados no momento do check out. Dessa forma, sua última experiência no hotel será conferindo uma lista com todo esse detalhamento de consumo. Ao final, você assina o documento e passa o cartão de crédito, podendo parcelar a compra;

3. No ato: no momento do check-in o atendente confere seus documentos, entrega a pulseira de acesso e já cobra a primeira diária. A partir daí, e cada vez que você consumir algo, um funcionário do hotel virá com a maquininha de cartão de crédito para que o pagamento seja realizado na hora. Isso significa que, durante o check out, você só precisará devolver a pulseira e ir embora; mas também que você terá de andar o tempo todo com sua carteira por perto, pois a cada cerveja, sorvete, cafezinho, garrafa d’água, drink etc., você terá de tirá-la do bolso, sacar o cartão de crédito e digitar sua senha.

Qual dos três formatos proporcionaria a melhor experiência de viagem? E a pior?

 

 

Pagar por uma experiência de forma antecipada pode causar certo desconforto no momento da finalização da compra. Entretanto, assim que você chegar ao resort, ciente de que não haverá mais nenhuma cobrança ao longo das próximas duas semanas, seu cérebro sentirá um grande alívio por não precisar mais pensar em dinheiro. Aqui, a ilusão de que “já está pago” fortalece a satisfação a respeito da viagem e nos permite aproveitar melhor esse tempo, livres de preocupações financeiras. Mesmo que isso seja uma situação ilusória, devemos ter em mente que viagens como essa não acontecem o tempo todo. Por isso mesmo, precisamos buscar recursos – especialmente os emocionais e psicológicos – que nos permitam tirar o máximo dessa oportunidade. A alternativa 1, portanto, é a que potencializa a experiência positivamente.

Do lado oposto, temos a opção 3. Neste modelo, a dor do pagamento é reforçada a todo instante: desde nossa chegada, quando temos de desembolsar um valor significativo referente à primeira diária (e todos os impostos e taxas associados), e durante cada micro consumo, tornando o pensamento sobre dinheiro, e todas as ponderações de custo-benefício associadas a ele, uma constante. Imagine-se sentado à beira da piscina da foto, com uma vista belíssima da praia, tendo de decidir se realmente vale a pena pagar R$ 17,00por uma garrafa de água que custaria, na pior das hipóteses, R$ 5,00 no mercado do bairro em que você mora. Essas pequenas decisões de compra acumulam-se na forma de uma tortura psicológica, e o resultado é uma viagem de férias miserável.

 

Por que tudo isso importa

Gary Belsky e Thomas Gilovich recontam a fábula em que um homem foi ao cassino e decidiu apostar na roleta os US$5 que trazia no bolso. Por um golpe de sorte – ou qualquer outro termo que você prefira para explicar esta situação –, ele começou a ganhar jogada após jogada, a ponto de acumular quase US$300 milhões em pouco mais de uma hora.

Porém, logo em seguida, ele resolve apostar tudo em uma última rodada; e perde a quantia inteira. Chegando ao hotel, e questionado por sua esposa sobre como tinham sido suas apostas, ele responde: “Perdi US$5”.

Nossa relação com dinheiro é complicada. Incapazes de avaliar todas as opções disponíveis para calcular o valor real das coisas, nós nos resignamos a comparações simples – e muitas vezes desconexas. Fora isso, fatores emocionais e perspectivas míopes fazem com que tomemos decisões equivocadas:

Lembre-se da última vez em que você ganhou um vale presente. Normalmente, as pessoas usam o saldo desse cartão para adquirir itens e serviços que elas não comprariam se tivessem de desembolsar aquantia elas mesmas, isto é, debitá-la de seus salários. Temos a impressão – esquisita, você há de concordar – de que o dinheiro representado pelo vale presente não faz parte do nosso conjunto de receitas e, justamente por isso, pode ser gasto de um jeito mais frívolo.

É comum comemorarmos uma economia como, por exemplo, não ter tomado café na rua esta semana, com um gasto desnecessário (a compra de uma revista), invalidando assim, sob o ponto de vista financeiro, o benefício de ter gastado menos dinheiro.

Quando o assunto são decisões financeiras, devemos ter em mente o custo de oportunidade. A menos que você seja bilionário(a), a compra deum bem ou serviço implica diretamente na impossibilidade de adquirir outro bem ou serviço de igual valor. Afinal, nosso patrimônio é finito.

Por esta razão, a forma ideal de lidar com dinheiro tem a ver com esse olhar para todas as coisas de que abrimos mão quando desembolsamos uma determinada quantia. Se o benefício dessa compra – a utilidade, a satisfação, o prazer – for suficientemente alto em relação ao que está sendo deixado de lado, então, siga em frente. Do contrário, atenção: podemos estar fazendo um mau negócio.

 

Saiba mais em:

[1] Ainda sem tradução para o português.

ARIELY, Dan. (2008). Previsivelmente irracional – como as situações do dia a dia influenciam as nossas decisões. Rio deJaneiro: Alta Books.

ARIELY, Dan& KREISLER, Jeff. (2017). Dollars and sense: how we misthink money and howto spend smarter. Harper, Illustrated.

BELSKY, Gary& GILOVICH, Thomas. (2010). Why smart people make big money mistakes… andhow to correct them. Lessons from the Life-Changing Science of Behavioral Economics. New York: Simon & Schuster.

DOS SANTOS, Edson Luiz. (2014). Do escambo àinclusão financeira: a evolução dos meios de pagamento. São Paulo: Linotipo Digital.

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A roda do futuro

Muito além da ficção científica

Sistema Solar, ano 2120. Um grupo de empreendedoras e algoritmos representados por seus avatares humanos discute a viabilização de frotas interespaciais capazes de despachar artefatos terrestres dentro de apenas um dia útil – em Marte! O setor de turismo agora oferece experiências cósmicas: um pacote para dois adultos, uma criança e seis robôs permite assistir ao equinócio terrestre a partir de um resort em órbita – e dizem que o panorama é deslumbrante. Enquanto coloco minha xícara de café na desimpressora [1] observo a trajetória subaquática de uma baleia pré-histórica, pela sua própria perspectiva, como se estivesse agarrado a ela.

Mais do que ficção científica, imaginar o futuro tornou-se uma ferramenta estratégica de alta importância: todos nós, pessoas e empresas, precisamos desenvolver e praticar um olhar crítico para além de nosso tempo, projetando possibilidades (tecnológicas, sociais, culturais, humanas). Assim, vislumbrando caminhos à frente, somos capazes de agir de forma a garantir nossa perenidade e relevância frente às transformações – que, convenhamos, acontecem cada vez mais rápido.

Oportunidades ilimitadas

Pensar o futuro abre um leque infinito de oportunidades, mas pode ser um exercício desafiador: normalmente, ao discutir cenários e suas consequências, as pessoas tendem a se pronunciar de maneira contida, levantando aspectos vagos, características incompletas ou fatos confusos demais para serem analisados.

Por isso, em 1971, Jerome Glenn, futurista americano nascido no dia em que a segunda bomba nuclear nascido na trágica data em que a segunda bomba nuclear foi detonada [2], concebeu uma ferramenta para extrair esses resultados através de uma espécie de brainstorming estruturado – porém, sob a ótica do que poderia acontecer no futuro.

Preocupado em oferecer algo suficientemente intuitivo, a chamada “roda do futuro” (originalmente: futures wheel) representa um método poderoso para identificar consequências primárias, secundárias e terciárias de qualquer evento, situação emergente ou decisão futura, incentivando a busca por impactos e alternativas. Ademais, esta é uma forma de deixar o pensamento linear, hierárquico e simplista de lado em prol de uma visão mais orgânica, orientada a redes e a complexidade de relacionamento entre suas partes.

‍Alô, alô! Planeta Terra chamando!

Antes de começar nosso exercício, tenha em mente que a rodado futuro requer as mesmas características de facilitação e colaboração de um brainstorming tradicional – caso você precise de algumas dicas, clique aqui e aqui para acessar nossos artigos sobre o tema. Duas outras premissas são importantes:

nenhuma ideia deve ser julgada. Estamos falando sobre o futuro, uma abstração da mente humana composta, essencialmente, por incertezas. Sendo assim, não faz sentido discutir se algo é ou não factível. Mesmo ideias completamente absurdas – ao menos sob uma perspectivado nosso mundo contemporâneo – devem ter o mesmo peso de qualquer outra. Eventualmente, elas poderão ser refinadas ou integradas e, de repente, tornarem-se muito mais plausíveis (e até prováveis);

não existem limitações. Tecnologia, budget, horas de trabalho, espaço, seja-lá-o-que-for: nada dever ser um empecilho para a sua ideia. Resgatemos o nostálgico Lucas Silva e Silva [3],criando nosso próprio mundo da Lua, “onde tudo pode acontecer”. Durante a sessão, portanto, todos os seus recursos devem ser considerados infinitos.

Acelerando o tempo em 50, 100 anos!

Desenhar a roda do futuro é simples: comece identificando o cenário que será abordado. Conforme nosso exemplo inicial, vamos falar em logística:

 

A partir daí, crie esferas representando possibilidades ainda inexistentes para esse cenário. Costumo pedir que participantes pensem em como as coisas serão daqui a, no mínimo, 50 anos.

Deixo aqui minhas contribuições para o próximo blockbuster distópico – caso tenha interesse em conhecer mais detalhes sobre essas perspectivas, leia o Anexo 01:


Legenda:

01 – Entregas interplanetárias: cápsulas espaciais

02 –Oceanovias: túneis subsquáticos

03 –Teletransporte: impressoras multissentido super-rápidas

04 – Morfeu: experiências oníricas imersivas

05 –Inse-tech: nanopartículas carregadas por insetos

Importante: observe que essas perspectivas provavelmente não sobreviveriam a uma análise crítica focada no que é possível fazer hoje. Entretanto, estamos falando de 50 anos de avanços científicos, totalmente imprevisíveis, que podem torná-las todas as próximas etapas de troca de serviços e mercadorias no futuro da humanidade. Sendo assim, continuamos com o exercício satisfeitos de nossas contribuições.

O próximo passo são os desdobramentos de cada uma das esferas que criamos no item anterior. Agora, no entanto, não desejamos novas possibilidades (elas fazem parte apenas das esferas de primeiro nível); queremos questões contextuais que tragam mais detalhes sobre como cada uma dessas possibilidades afetaria a vida – no caso, em 2070:


A partir daí, e rumo ao terceiro nível, discutimos as implicações de cada desdobramento. Com isso, nosso panorama do futuro ganha relações de causa e consequência, além de apresentar interrelações e possibilidades complementares ou conflitantes:

Neste ponto, é bem provável que o facilitador(a) tenha de priorizar alguns caminhos em detrimento de outros, já que o modelo passa a ficar bastante grande. Logo, é importante definir (antecipadamente) formas de votação que permitam a todos legitimar o caminho mais relevante a ser desbravado.

De acordo com a configuração do grupo e seus participantes, pode ser necessário distribuir pesos diferentes durante essas votações: uma investidora que acabou de aportar US$ 1 milhão na empresa talvez seja elegível a dois votos, em vez de um – garantindo, ainda que parcialmente, que a continuidade do projeto estará alinhada a seus interesses e expectativas. Esta opção, no entanto, pode ser ambígua, na medida em que torna o grupo mais sujeito a perspectivas enviesadas ou que não necessariamente contribuirão para a melhoria, crescimento e inovação. Ao final, teremos um modelo parecido com este:

Em que as esferas verdes (N2) representam desdobramentos e contexto, e as esferas laranja (N3), implicações e consequências. A relação entre possibilidades, N2 e N3 não é obrigatoriamente 1 para 1, cabe uma análise das interseções que podem acontecer.

Ao final deste exercício, talvez tenha surgido uma dúvida a respeito de “onde ele vai parar”. Nada impede que você inclua ainda mais detalhes, desdobrando o método em um quarto ou quinto nível. O problema é que a organização visual e as discussões a respeito de causalidade podem acabar se tornando complexas demais, prejudicando o andamento da dinâmica.

Se isso ocorrer, é preferível definir o terceiro nível como o último e, caso o grupo demonstre interesse em seguir adiante (e o escopo definido para o trabalho assim o permitir), transformar a roda do futuro em uma espécie de roteiro de ficção científica – falaremos sobre essa técnica com mais detalhes em outra ocasião –,criando assim um enredo social, econômico, cultural, tecnológico, ético etc. a respeito dessas possibilidades futuras.

Roda do futuro e também da fortuna

Pense comigo: os carros do futuro precisarão de pneus? A resposta para esta pergunta vale US$ 2.54 bilhões [4] para a Goodyear. Visa e Mastercard, por exemplo, têm enorme interesse em projetar o futuro dos meios de pagamento; se eu pudesse imprimir qualquer coisa em minha casa a partir de uma impressora multidimensional – e multissentidos, como mencionamos anteriormente –, qual seria o impacto econômico às empresas de e-commerce? E ao mercado de trabalho como um todo, considerando as dezenas de milhões de pessoas pelo mundo que atuam nesse segmento?

Discutir – não se trata de prever! – o futuro é, portanto, uma ferramenta de extrema importância, e será questão de sobrevivência em determinados momentos. Deixo aqui, então, uma provocação a ser levantada ao final da dinâmica: o quanto estamos preparados para enfrentar esses cenários futuros que acabamos de vislumbrar?

Anexo 01

‍Roda do futuro: outros modos de usar

De acordo com o próprio Jerome Glenn, a roda do futuro pode ser usada para:

– pensar possíveis impactos delongo prazo causados por tendências ou situações atuais;

– organizar ideias sobre evento sou tendências futuras;

– trabalhar com previsões decenários alternativos;

– discutir interrelações complexas;

– demonstrar oportunidades de pesquisa futuras;

– desenvolver vários conceitos a partir de uma tendência ou evento inicial;

– fomentar o pensamento sobre o futuro em grupos de inovação, estratégia organizacional, dentre outras áreas;

– fomentar uma perspectiva consciente a respeito do futuro;

– apoiar sessões de brainstorming com mais liberdade de participação;

– mitigar riscos, especialmente o de ser “pego de surpresa” em um mercado em rápidas transformações

Anexo 02

Realinhando a órbita dos planetas

 

Ao longo da facilitação de uma roda do futuro, você pode se deparar com situações que, se não forem prontamente corrigidas, transformarão o exercício em uma mera projeção de como tecnologias e cenários atuais podem se desdobrar ao longos dos próximos… dois ou três anos. Como este não é o objetivo, separamos algumas dicas para contribuir com o sucesso da sua jornada:

– futuro, mas nem tanto: é bastante comum que as primeiras ideias levantadas pelo grupo sejam desdobramentos temporais muito mais próximos do que os 50 anos propostos pelo exercício. Como orientar sem julgar? Com base em nosso cenário sobre logística, alguém pode sugerir, por exemplo, entregas por drones. A tecnologia de drones já existe, e há diversos testes de entrega em domicílio sendo realizados com esse tipo de equipamento (surpreenda-se (ou não) com este). Logo, não é um caminho muito inovador para o nosso horizonte de meio século. Sempre que isso ocorrer, incentive um olhar mais além, começando por formas de ressignificar essa primeira ideia, empurrando-a mais a frente, na linha do tempo. Repita essa provocação até que a sugestão se liberte de suas raízes naquilo que já é factível no presente (ou uma tendência que já desponta como provável para os próximos anos);

– mapa mental: Alguns participantes sugerem o desmembramento completo de cada possibilidade antes de prosseguir com a demais. Isso dá ao método ares de mapa mental. Uma das grandes vantagens da roda do futuro é o desenvolvimento de visões sistêmicas – competência que repetidamente aparece na lista das 10 mais para os profissionais do século XXI. Sendo assim, evite esta rota e explique, logo no início da sessão, que o preenchimento acontecerá por círculos concêntricos, começando de dentro para fora:


– briefing: a menos que esteja sendo usada unicamente como uma ferramenta de brainstorming para exercitar o pensamento sistêmico e colaborativo, nunca abra mão do briefing com os sponsors ou organizadores da sessão. Esta conversa vai indicar os fatores críticos de sucesso e ajudar o facilitador a conduzir a discussão rumo a esse objetivo;

– versão 2.0: alguns anos após a elaboração do método, Jerome Glenn resolveu atualizá-lo com uma nova possibilidade: a discussão a partir de esferas de impacto específicas. Embora bem menos usada que a original, esta versão pode oferecer respostas interessantes, especialmente se a prototipação faz parte do escopo. Neste caso, teríamos algo como:

Anexo 03

Distopias tiago-rodriguianas

– entregas interplanetárias: cápsulas com propulsão de altíssima eficiência, estabelecendo uma rota de entregas entre a Terra e Marte (com possibilidade de conexão na Lua, agradando também àqueles que preferem conhecer com calma o que tem pelo caminho). Essa esfera viabilizaria a colonização deste último, visto que insumos e matérias-primas poderiam ser recebidos em pouco tempo, reduzindo assim o efeito de potenciais hostilidades oriundas do planeta vermelho;

– oceanovias: túneis subaquáticos ligando todos os portos do mundo. Em vez de navios cruzando distâncias enormes sobre a superfície do mar, sujeitos às mais ferozes reações da natureza, poderíamos ter um novo conceito de embarcação, flutuando pelo vácuo;

– teletransporte: impressoras capazes de construir e reconstruir não apenas objetos físicos, mas experiências sinestésicas, envolvendo os outros quatro sentidos. Ao comprar um caju nordestino, por exemplo, o vendedor “desimprime” a fruta em sua máquina que, por sua vez, mapeia toda sua composição, a fim de que eu possa reconstruí-la em minha casa, em São Paulo, aproveitando inclusive seu aroma e sabor;

– MorfEu: o terreno fértil dos sonhos ganharia um aliado cinematográfico, capaz de projetar ao longo do meu sono, experiências imersivas completas. Por exemplo: visitas a países e planetas estrangeiros, com certo nível de autonomia, em que pudesse escolher aventuras, degustação de pratos, bebidas, interação com pessoas nativas, presença em espetáculos – tudo construído como um roteiro, a partir de experiências reais;

– Inse-tech: nanopartículas contendo elementos essenciais para nutrição, fertilização, recuperação e semeação de terrenos, instaladas em e transportadas por insetos. A partir do fluxo dessas colônias, seria possível estudar, proteger e revitalizar áreas inteiras.

Saiba mais em:

[1] Eletrodoméstico inventado no início do século XXII que decompõem objetos em suas partículas elementares, se retroabastecendo de matéria-prima para fabricar outras coisas, conforme necessidade.

[2] A segunda bomba nuclear foi lançada sobre a cidade de Nagasaki em 9 de agosto de 1945.

[3] Ocasionalmente, o artigo fará alguns movimentos para trás, de volta ao passado.

[4] Calculado com base no preço de fechamento do mercado acionário em 17 de dezembro de 2020.

DUNNE, Anthony, RABY, Fiona. (2013). Speculative everything: design, fiction and social dreaming. Massachusetts: MIT Press.

MCGONIGAL, Jane, in: Coursera. (2020). “Collaborative foresight: how to game the future.

MOOC disponível em: https://www.coursera.org/learn/collaborative-foresight

MILLER, Riel. (2018). Transforming the future: anticipation in the 21st century. Routledge. Disponível gratuitamente para o Kindle – clique aqui.

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Li e concordo: a maior mentira da internet

Todos nós já passamos por isso: ao nos cadastrarmos em um serviço, preenchemos certas informações pessoais e, logo a seguir, nos deparamos com uma lista enorme, contendo todas as condições de uso imagináveis. Depois, rolamos a tela para baixo, clicamos em “Li e concordo”, e começamos a usá-lo, indiferentes a possíveis coletas de dados ou outros tipos de nuance.

Você já se perguntou o quão longos são esses termos e políticas de uso, nos principais serviços online? O artista Dima Yarovinsky já e até os transformou em arte [1]. Os resultados, impressos em folhas A4 e fonte padrão, são ao mesmo tempo fascinantes e paradoxais: tudo está lá — desde o armazenamento de dados pessoais até estratégias de anúncios e permissões para usar qualquer conteúdo que você compartilhe, inclusive em canais ainda inexistentes. Mas só porque tudo está lá, negligenciamos essas informações, concordando com cláusulas que não nos preocupamos em ler.

Esta questão não é exclusiva do mundo online: termos de uso de software, apólices de seguro, contratos de locação de imóveis e manuais de carro também se juntam a essa literatura técnica, não tão inspirada. Um estudo recente da Bristol Street Motors, por exemplo, levantou que o manual do Audi A3 possui 167.699 palavras [2]. Considerando a velocidade média em que um adulto consegue ler, isso representa 11 horas e 45 minutos — ou 49 minutos a mais do que levaria para concluir “O Senhor dos Anéis: as duas torres”, de J. R. R. Tolkien. Um número alarmante, se comparado a nossa média de leitura semanal (16 minutos) [3].

 

A natureza humana em relação ao conhecimento

O professor Donald O. Case e colegas afirmaram que “Muitos estudos iniciais de comunicação (…) assumiram que os indivíduos buscam, ou pelo menos prestam alguma atenção, às fontes de informação. Essa suposição está enraizada na cultura ocidental, pelo menos desde a afirmação de Aristóteles de que ‘todos os homens, por natureza, desejam saber’”. Sob esta ótica, a busca por informação seria um aspecto intrínseco da natureza humana [4,5].

 

 

No entanto, as evidências não necessariamente apoiam a ideia de que as pessoas sempre buscam informações quando estas lhes são benéficas. Um trabalho de pesquisa de Golman, Hagmann e Loewenstein apontou que as pessoas, por vezes, evitam informações, mesmo quando elas “são úteis, livres e independentes de considerações estratégicas” [6]. Abraham Maslow também escreveu sobre este ponto, dizendo que nós podemos buscar conhecimento para reduzir a ansiedade, como também evitá-lo pela mesma razão [7].

Em um experimento com participantes de seis países que mantinham um diário com os pensamentos e atividades relacionadas à informação, Bhuva Narayan e colegas identificaram que, às vezes, quando as informações podem causar desconforto mental ou aumentar a incerteza, as pessoas tendem a evitá-las [8]. Assim, entender por que as pessoas buscam alguns tipos de dados e evitam outros pode ajudar governos e empresas a projetar melhores sistemas e aprimorar a experiência geral do cliente.

Sobrecarga de informações

Em 2012, um projeto chamado “Muito longo, nem li” (do acrônimo em inglês TL; DR – Too long; didn’t read) foi criado para corrigir o que seus autores classificaram como “a maior mentira da internet”, ou seja, o fato de que quase ninguém lê os termos de serviço com os quais concordam. Esta iniciativa analisa termos de uso e políticas de privacidade de vários sites, classificando-os de A (muito bom) para E (muito ruim) [9].

Mas por que exatamente não lemos esses detalhes quando eles poderiam nos ajudar a entender as características dos serviços e produtos que estamos prestes a usar? Afinal, a maioria das empresas declara tudo isso explicitamente.

O psicólogo Barry Schwartz levantou uma hipótese: em sua TED Talk, explicou que a sobrecarga de informações muitas vezes traz paralisia em vez de liberdade de escolha. Com base em vários experimentos, descobriu que, embora as pessoas geralmente desejem mais opções e detalhes, elas também querem simplificar suas vidas. Ter mais opções, então, contribui para um efeito cumulativo na tomada de decisão que causa ansiedade e angústia [10].

Sheena Iyengar e Mark Lepper testaram uma abordagem semelhante: a partir de quiosques de degustação da geleia Wilkin & Sons dispostos em supermercados, observaram quantas pessoas parariam, provariam e comprariam o produto. A diferença: enquanto uns ofereciam 6 sabores, outros dispunham de 24 variedades. Os resultados indicaram que os quiosques com mais opções atraíram mais consumidores (60%). No entanto, apenas 3% deles compraram a geleia, em comparação com os quase 30% que o fizeram na condição de escolha limitada. Dessa forma, os pesquisadores sugerem que uma grande variedade de opções pode ser mais atraente no início, mas também pode reduzir a motivação intrínseca ao comportamento de compra subsequente [11].

Um exemplo pessoal: meu smartphone recentemente atualizou sua principal ferramenta de gerenciamento de downloads. Quando eu a acessei, um pop-up informou que a política de privacidade tinha sido alterada, solicitando que eu a lesse. Ok… até eu perceber que o documento tinha 19 páginas (8.246 palavras, ou 27 minutos de leitura) e nenhuma pista sobre quais cláusulas realmente mudaram. Embora este documento fornecesse informações essenciais sobre a privacidade dos dados, era difícil encontrar a motivação para analisar seu conteúdo. E as consequências podem variar de dados pessoais compartilhados com terceiros, questões de direitos autorais em arquivos armazenados e até processos judiciais.

Portanto, quando as empresas fornecem quantidades enormes de informação, especialmente se estas não estiverem categorizadas e destacarem as principais ideias tratadas, elas sobrecarregam os usuários com detalhes que estes talvez nem queiram saber — seja naquele momento ou em qualquer momento posterior [12,13].

Sludges: como corrigir esses termos

Richard Thaler e Cass Sunstein, economistas comportamentais responsáveis pela Teoria dos Nudges, enfatizaram como esse tipo de intervenção pode ajudar as pessoas a tomar melhores decisões [14]. Nudges são incentivos simples e baratos, projetados para apoiar a tomada de decisão nos contextos em que vieses, hábitos e atalhos mentais podem nos levara resultados sub ótimos. Eles se baseiam, portanto, em princípios comportamentais e não promovem alterações significativas nas motivações financeiras. Opções padrão que inscrevem trabalhadores em programas de previdência, lembretes para consultas médicas e adesivos mostrando o caminho para a lixeira mais próxima, por exemplo, são todos tipos de nudges; uma multa por jogar lixo no chão, não.

Contudo, e junto aos nudges, uma abordagem com objetivos opostos foi criada: “(…) situações em que essas variáveis contextuais dificultam atividades que são do interesse dos consumidores, resultando em uma redução do seu bem-estar. Elas são conhecidas como sludges [15]. Nas palavras de Sunstein, ‘Consumidores, funcionários, estudantes e outros são frequentemente submetidos a sludges: atritos excessivos ou injustificados, processos burocráticos que custam tempo e dinheiro e dificultam a vida, etapas frustrante sou humilhantes e que podem acabar privando as pessoas de acesso a bens, oportunidades e serviços importantes” [16].

Alguns sludges podem ser propositais para causar confusão e ambiguidade, ou levar os consumidores a escolhas que não são de seu melhor interesse. Outros, no entanto, podem ser criados sem querer, seja porque a equipe de desenvolvimento estava muito próxima de seu produto ou serviço para notar pontos de atrito, ou porque as empresas não analisaram minuciosamente todas as interações envolvidas.

Em um relatório recente intitulado “Seeing Sludge”, o cientista comportamental Dilip  Soman e seus colegas defendem que “as organizações devem ter em mente que estão projetando para seres humanos que são cognitivamente preguiçosos, esquecidos, emocionais e míopes (…)”. Consequentemente, eles criaram um dashboard para ajudaras empresas a revisar processos, comunicações e inclusão, e assim maximizar a eficácia sob a perspectiva do usuário final, simplificando sua jornada [15].

 

Esta ferramenta contém blocos de verificação para cada um dos três aspectos e apoia na identificação e ajuste desses pontos de fricção. Por exemplo:

 

–         Os canais para realizar a tarefa são fáceis de usar ou requerem múltiplas interfaces e múltiplas interações?

–         Quantas atividades ou etapas exclusivas são necessárias para completar uma tarefa?

–         Com quantas entidades distintas o usuário final precisa interagir para completar a tarefa?

–         Algumas partes do processo interferem com outras?

Este painel deve ser usado como um esforço inicial para rever as três esferas. Os autores também recomendam que as organizações criem equipes dedicadas e personalizem seus próprios dashboards, melhorando assim o relacionamento com os clientes. Afinal, é do seu próprio interesse que as interações corram sem atrito, e os usuários atinjam seus objetivos ou tarefas da maneira mais simples possível.

Essa estratégia também se estende à divulgação de informações, já que listar todos os termos em um documento longo e chato não ajuda as partes a estarem totalmente alinhadas em condições e políticas. “Sabemos que o cérebro humano é particularmente eficiente no processamento de informações estruturadas, lineares e que assumem a forma de listas de verificação concretas, em vez de informações idênticas que são apresentadas em um bloco de texto” [15]. O mero ato de dividir informações em blocos distintos, resumir seu contexto e usar referências de fácil acesso pode, então, aumentar o engajamento do usuário [17,18], a consciência sobre as informações, além de evitar mal-entendidos ou expectativas frustradas — uma situação ganha-ganha.

 

Conclusão

Soman e colegas destacam que “encontrar e corrigir os sludges envolve uma apreciação do fato de que coisas aparentemente irrelevantes importam. Somente se desenvolvermos o hábito de pensar nos detalhes e procurar as pequenas coisas que podem criar fricção, teremos sucesso no desenvolvimento de organizações mais compatíveis com o ser humano”. Assim, podemos apoiar nossas organizações com ferramentas como o dashboard de Soman para construir uma nova perspectiva sobre como implementar produtos e serviços, garantindo que as informações relevantes sejam acessíveis realmente acessadas.

 

Referências:

  1. Designboom. (2018). Artist visualizes the lengthy terms of services of large corporations like Facebook and Instagram.
  2. Bristol Street Motors. (2020). Car handbooks are longer than many famous novels – have you read yours?
  3. American Academy of Arts & Sciences. (2018). Time spent reading.
  4. Case, D. O., Andrews, J. E., Johnson, J. D., & Allard, S. L. (2005). Avoiding versus seeking: the relationship of information seeking to avoidance, blunting, coping, dissonance, and related concepts. Journal of the Medical Library Association : JMLA, 93(3), 353–362.
  5. Aristotle. (1984). Complete works of Aristotle: the revised Oxford translation. New Jersey: Princeton University Press.
  6. Golman, R., Hagmann, D., & Loewenstein, G. (2017). Information avoidance. Journal of Economic Literature, 55 (1): 96-135. DOI:10.1257/jel.2015124.
  7. Maslow, A. H. (1963). The need to know and the fear of knowing. Journal of General Psychology 68 (1): 111–25.
  8. Narayan, B., Edwards, S. L., & Case, D. O. (2011). The role of information avoidance in everyday-life information behaviors. In Proceedings of the 74th ASIS&T Annual Meeting, ASIST, New Orleans Marriott, New Orleans.
  9. ToS;DR Team. (n.d.). Terms of service; Didn’t read.
  10. Schwartz, B. (2005, July). The paradox of choice [Vídeo]. TED: Ideas worth spreading.
  11. Iyengar, S., & Lepper, M. (2000). When choice is demotivating: can one desire too much of a good thing? Journal of Personality and Social Psychology, 2000, Vol. 79, No. 6, 995-1006.
  12. Schwartz, B., Ward, A., Monterosso, J., Lyubomirsky, S., White,     K., & Lehman, D. (2002). Maximizing versus satisficing: happiness is a matter of choice. Journal of Personality and Social Psychology, Vol. 83,     No. 5, pages 1178–1197; 2002.
  13. Schwartz, B. (2016). The paradox of choice: why more is less, Revised edition. New York: Ecco.
  14. Thaler, R., & Sunstein, C. (2009). Nudge: improving decisions about health, wealth, and happiness. Penguin Books.
  15. Soman, D., Cowen, D., Kannan, N., & Feng, B. (2019). Seeing Sludge: towards a dashboard to help organizations recognize impedance to end-user decisions and action. Behavioural Economics in Action at Rotman, September.
  16. Sunstein, C. R. (2019). Sludge and ordeals. Duke Law Journal, 68, 1843-1882. doi:10.2139/ssrn.3288192.
  17. Bhargava, S. & Manoli, D. (2015). Psychological frictions and the incomplete take-up of social benefits: Evidence from an IRS field experiment. American Economic Review, 105(11), 3489-3529. doi:10.1257/aer.20121493.
  18. Manoli, D. S., & Turner, N. (2014). Nudges and learning: Evidence from informational interventions for low-income taxpayers. NBER Working Paper, No. 20718.

 

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Caixas e Caminhão

Pulou da cama bem cedo, tomou um banho rápido, comeu algo bem depressa sem prestar atenção ao que comia, escovou os dentes, vestiu a roupa que havia deixado sobre a cadeira na noite anterior, falou um “tchau” rapidinho e escutou um “tchau” rapidinho também, saiu, dirigiu o dia todo pela cidade grande, trabalhou muito, ficou estressado/a, almoçou qualquer coisa, voltou para casa tarde, tomou um banho para relaxar, comeu um lanche, dormiu e… começou tudo de novo!

Mas um dia, sem muitos avisos, alguém gritou: “O caminhão da mudança chegou!”

O caminhão que estacionou em frente ao imóvel era da empresa COVID e veio disfarçado de vírus e quarentena, e trouxe dentro dele muitas caixas vazias, e apenas uma caixa cheia.

A caixa cheia foi aberta e ela estava repleta de tecnologia, para ser usada por quem a conhecia, para ser aprendida por outros e até para ser ignorada e deixada de lado por muitos.

E as caixas vazias, como em todas as mudanças, foram sendo preenchidas uma a uma, respeitando ritmos diferentes, de acordo com a delicadeza dos conteúdos. Algumas ficaram cheias de objetos guardados por muito tempo, de relíquias de antepassados, de roupas que não serviam mais, de acessórios fora de moda, de livros que não seriam relidos, e até mesmo dos que não tinham sido lidos, de brinquedos antigos que haviam sido a alegria de filhos e/ou de netos, e muitas outras coisas para serem doadas.

Outras caixas, entretanto, foram preenchidas com a culpa, o perdão, o autoperdão, o arrependimento, a tristeza, a mágoa, o ego inflado, o orgulho, o choro, o desprezo, o negativismo, o medo … Estas caixas ficaram abertas para que mais conteúdo fosse acrescentado a qualquer momento, como por exemplo, a solidão. Elas ainda tinham espaço para muito conteúdo para ser transformado/transmutado.

É obvio que os conteúdos das caixas dependem de cada pessoa ou cada família, então algumas caixas foram preenchidas com muitas orações, amor, humildade, companheirismo, paciência, tolerância, compaixão, diálogos…e estas caixas também foram mantidas sempre abertas para receber mais itens e seu conteúdo pronto para ser levado para a grande teia do universo.

Ah! Ainda existia a caixa cheia de abraços que foram guardados lá desde o dia que o caminhão da mudança chegou. Esta caixa, repleta de abraços apertados, sinceros apertos de mão e todos os outros tipos de contatos físicos, um dia será aberta e um desejo enorme de se expressar eclodirá. Porém, enquanto isto, vamos nos lembrar de que os olhos – as janelas da alma – podem expressar todo o amor que temos para dar e, além disto, podem sorrir.

Mas nem tudo pode ser encaixotado, então os cães e os gatos que caminham pelas casas em meio a tantas caixas estão felizes com a presença de seus donos, e a natureza, em todas as suas formas, resplandece.

É certo que todas as mudanças requerem muitas adaptações às novas casas, aos espaços que habitamos dentro e fora de nós e este processo pode ser lento, mas que tudo de bom venha a nós, com leveza, gratidão e amor.

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Criatividade: modo de usar

Antes de falar sobre criatividade, precisamos quebrar alguns paradigmas: crenças limitadoras que distorcem nossa percepção acerca de nós mesmos e de nossas capacidades. Vamos a eles:

-criatividade é uma habilidade inata a algumas pessoas;

-ideias originais têm necessariamente de ser criativas;

-a criatividade é, em geral, um “momento Eureka!”;

Preparado(a)?

Então:

 

Todos nós somos criativos(as). O problema é que, na correria cotidiana – e naquilo que o filósofo sul-coreano Byung-chul Han define como “estado de hiperatenção”, acabamos não nos dando conta das diversas ideias que surgem em nossa mente ao longo do dia. E isto ocorre justamente porque, não tendo tempo (ou a prioridade adequada) para colocar essas ideias em prática no momento em que elas ocorrem, acabamos por confiá-las à memória e, em razão da grande quantidade de tarefas com que temos de lidar, perdendo-as – por vezes, para sempre.

Pense em uma situação em que você tinha uma tarefa importante para concluir. Porém, por não a ter escrito em um papel ou digitalizado em alguma ferramenta do celular, por exemplo, passou horas e horas tentando “se lembrar de não esquecer” o que tinha para fazer. No caso das ideias criativas, entretanto, há um facilitador do esquecimento: são propostas pelas quais não seremos cobrados e que, por si só, não têm um prazo definido para serem realizadas.

A dica aqui, portanto, é manter papel e caneta sempre por perto (preferencialmente, embora apps de notas, como Evernotee Google Keep, também ajudem) e anotar essas ideias o mais rápido possível. Pode ser que você nunca as utilize e que, no fim das contas, sejam apenas elucubração. Mesmo assim, vale manter o registro, porque ele pode se desdobrarem alguma solução importante, proposta de negócios ou naquilo que se costuma chamar de “disrupção”. Vai que…

Observe também que ideias criativas não precisam ser totalmente originais. Podemos muito bem nos apoiarem conceitos, processos, ferramentas e tecnologias existentes e, a partir delas, idealizar uma nova abordagem capaz de resolver questões específicas de nosso cotidiano. Talvez elas não tenham o mesmo “glamour” de um foguete espacial capaz de pousar na superfície de algum planeta distante, mas cumprem seu papel de promover transformações e melhorias incrementais que facilitam nossa vida. Atente-se a elas, pois são o tipo de ideia que mais nos ocorre e que mais nos beneficia em termos absolutos.

Há muitas histórias – inclusive com personagens famosos – que descobriram tecnologias, respostas para questões matemáticas antigas ou as bases de suas principais teorias em um momento repentino, de inspiração filosófica – o tal do momento Eureka.

 

 

Embora personalidades como Albert Einstein e Charles Darwin tenham relatado que sentiram o momento em que uma linha de pensamentos começou a fazer sentido e logo transcreveram essas ideias naquilo que viria a ser a Teoria da Relatividade e a Teoria da Origem das Espécies, respectivamente, essa clareza não foi tão súbita assim: biógrafos e pesquisadores que se debruçaram sobre a trajetória dessas duas grandes mentes observaram um processo longo, lento, porém consistente, de captura de elementos, insights, observações, anotações, prática e experimentação que, com o passar do tempo, foram se cristalizando no entendimento e tomando forma.

Outro ponto é que existe uma crença de que quantidade e qualidade são excludentes: uma grande ideia só poderia ser desenvolvida por alguém que trabalha pouco, dedicando-se exclusivamente a esse único projeto que, mais cedo ou mais tarde, assumiria as formas de obra de arte que lhe fossem devidas. Entretanto, essa premissa é falsa. De acordo com Robert Sutton, Professor de Stanford:

“Os pensadores originais “apresentarão muitas ideias que parecerão anomalias estranhas, becos sem saída e fiascos completos. Mas o custo vale a pena porque eles também criarão um conjunto maior de ideias – principalmente novas ideias.”

Em outras palavras, o caminho mais seguro para a originalidade passa justamente pela quantidade: a produção sistemática azeita os mecanismos cerebrais e motores, que com isso ganham experiência, além de explorar campos novos – e esse processo é fundamental para que a mente divague em possibilidades, transformando iniciativas por vezes insossas em pequenas contribuições para algo de grande qualidade, tempo depois.

Adam Grant aponta que:

“Muitas pessoas deixam de atingir a originalidade porque concebem algumas poucas ideias e depois ficam obcecadas em aperfeiçoá-las.”

Sendo assim, dê livre vazão a suas inspirações intelectuais e artísticas, produzindo, treinando, e (por que não?) atrevendo-se por trilhas ainda não percorridas.

 

Olhos atentos, mente aberta


‍A arte da criatividade, se podemos pintá-la desta forma, compreende também uma visão externa, curiosa, sobre o mundo em que vivemos. Já falei sobre a importância do mindset de crescimento, e como ele se casa perfeitamente com uma competência chamada lifelongl earning – o aprendizado contínuo ao longo de toda a vida. Mas, mais do que isso, é preciso assumir uma postura que Austin Kleon denomina “colecionador de ideias”.

Não precisamos partir do zero para sermos originais. Podemos – aliás, devemos – coletar boas ideias e utilizá-las como base de um processo criativo que tem por intuito aprimorar algo.

“Estamos falando de prática, não de plágio – plágio é tentar fazer o trabalho de outro passar por seu. Copiar é engenharia reversa. É como um mecânico removendo partes de um carro para ver como ele funciona.” (Kleon, 2013)

Dessa forma, as referências coletadas podem ser metamorfoseadas em soluções distintas, melhores.

Na final da adolescência, devorei “Algo sinistro vem por aí”, uma obra de horror, escrita por Ray Bradbury – sim, sempre dou um jeito de falar dele. A história traz um parque de diversões itinerante que chega a uma cidade americana e atrai espectadores para suas atrações macabras, transformando-os, e suas vidas, completamente. Mas esse livro tem uma particularidade: o enredo dos personagens possui diversas lacunas e possibilidades de continuação com que o autor nos presenteou. Aceitei o desafio e produzi alguns rascunhos com desfechos e aventuras distintas para a dupla de jovens exploradores, Jim Nightshade e William Halloway, e as diversas pessoas bizarras com quem eles interagem (e quase se perdem). Esse exercício, sempre tensões senão aquelas de um adolescente com tempo livre e ideias na cabeça, foram meu primeiro contato com a produção literária, e uma maneira divertida de passar eu também a produzir minhas histórias. Essa experimentação, que se estende até hoje, é um aprendizado e um refinamento que jamais poderiam ter ocorrido por meio de uma única produção.

Em “Roube como um artista”, Austin Kleon conta como o tédio – entenda-o aqui como uma alternativa ao modo executor, quando apenas desempenhamos tarefas, sem tempo reflexivo – tem um papel relevante em sua produção criativa: sem essas pausas, suas ideias não teriam espaço nem motivação para se organizar e reorganizar, dando espaço ao novo.

Na edição 224 da Vida Simples, Luciana Pianaro, CEO e Publisher da revista, compartilha uma perspectiva parecida no artigo “A louça e a meditação”. Recordando-se da infância, trouxe à tona atividades que a divertiam, como escolher feijão, e outras menos agradáveis, como lavar a louça. As pazes com esta última só foram feitas muitos anos depois, quando, em conversa com uma amiga, esta lhe trouxe uma visão bastante diferente da tarefa:

“(…) ela me contou como o momento de lavar a louça era especial, pois esvaziava a mente dos problemas, entrava em fluxo calmo e tranquilo. Meditava. Eu focava na chatice de lavar a louça. Ela focava no vazio, na serenidade. Aquela nova perspectiva mudou meu olhar sobre a ‘função’ para sempre.”

 

Não há uma fórmula específica que “desperte” a criatividade que há em cada um de nós. Precisamos, por isso, facilitar sua presença, tornando simples o ato de registrar ideias, mantendo o olhar sempre atento, experimentando e, principalmente, nos permitindo momentos de encontro com nossa imaginação.

Daqui pra frente é com você 😉.

 

 

Saiba mais em:

BRADBURY, Ray. (2019). Algo sinistro vem por aí. Rio de Janeiro: Difel.

GRANT, Adam. (2017). Originais – como os inconformistas mudam o mundo. São Paulo: Sextante.

KLEON, Austin. (2013). Roube como um artista: 10 dicas sobre criatividade. São Paulo: Rocco.

PIANARO, Luciana. (2020). A louça e a meditação. In: Vida Simples, edição 224.

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Vamos investir na saúde mental

Esse é o tema da campanha de 2020 do Dia Mundial da Saúde Mental, celebrado no último 10 de outubro. A ação é promovida desde 1992 por uma instituição internacional chamada World Federation for Mental Health (WFMH), criada em 1948 com o fim de impulsionar a conscientização da necessidade de cuidados e prevenção dos transtornos mentais e emocionais, além da promoção da saúde mental em todas as nações.

Entretanto, foi somente agora, quase 30 anos depois, que o dia ganhou a mídia internacional e muitos textos como este. O apelo da campanha de 2020 é investir, tanto como indivíduos quanto como sociedade. E um dos incentivos é justamente espalhar pelas redes sociais imagens e palavras sobre experiências pessoais e de comunidades com o cuidado mental.

Viralizar – essa é a ordem do dia. Verbo que apenas gente do nosso tempo entende. Tudo voa nos dias de hoje. E a ideia da WFMH é que voem aos quatro cantos do planeta a urgência de perceber que mente é corpo, mente é sociedade, mente é vital também.

A campanha também é um apelo para que os governos tenham propostas de investimento substancial, levando os cuidados de saúde mental de qualidade para muitos.

A situação de confinamento, de distanciamento social, além do grande volume de tristeza e luto consequentes do Covid-19, excedeu a preocupação com o adoecimento físico; agora importa igualmente o adoecimento mental. Jornais no mundo todo vêm desde maio publicando uma série de reportagens sobre como todas essas mudanças afetaram o modo de pensar e sentir de muitas pessoas – em especial dos adolescentes.

Assim como na saúde física, a prevenção é crucial na saúde mental, pois o assustador em tudo que toca a mente, a alma, os pensamentos, as emoções (o leitor pode escolher a palavra que melhor lhe transmite o que é costumeiramente chamado de mental) é que, quando o barulho é escutado, a doença já se instalou. A instalação do patológico é sempre e invariavelmente silenciosa.

O que chamamos de Transtornos Mentais são, na verdade, já as tentativas de recuperação de um estado mais adaptado ao engajamento com a vida e suas demandas, que foi perdido ou afetado. Os transtornos mentais são a luta pela restauração da sanidade. Quando os transtornos aparecem, a doença já fez seu estrago. A doença é o sutil e silencioso desligamento de si mesmo, das pessoas à sua volta, das instituições, da natureza, enfim: um afastamento das convenções da vida civilizada. É por isso que o psiquiatra receita a medicação, mas não deixa jamais de incentivar e encaminhar a pessoa para a psicoterapia, que irá, por sua vez, contribuir com os esforços que a própria mente da pessoa já vem fazendo.

Na grande maioria das vezes, após um tratamento de longo termo, a condição “saudável” se restabelece. Em outros casos, como as diversas psicoses, negações e neuroses graves será uma sequela a observar por toda a vida. Portanto, prevenir é imperativo.

Bem, mas o que é exatamente saúde mental?

Para responder a essa pergunta precisamos pensar na infância, e em como as crianças nos parecem felizes e satisfeitas enquanto brincam. Sabemos bem, elas brincam todo o tempo.

Os pais colocam os divertidos mobiles planando sobre berço do recém-nascido porque sabem que logo que abriremos olhinhos, imediatamente, irão começar a brincar. Quando uma criança está amuada e não brinca é porque está doente.

Pois nosso caminho até a compreensão da saúde mental começa justamente com a experiência do não brincar: quando um adulto deixa de viver num estado semelhante ao da brincadeira para a criança, ele está mentalmente adoecido. A graduação da patologia e suas especificidades irão variar, mas a raiz está na impossibilidade de construir, suportar e manejar brincadeiras. Na insuficiência de poder viver, como diz o poeta, “nesse mundo divinamente absurdo do cérebro”.

Brincadeira não se trata apenas de fazer graças ou piadas. No entanto, para a criança assim como para o profissional de saúde mental, brincar é coisa séria e dolorida. A brincadeira é dura como a vida. Há esforço, persistência e paciência. Há muita angústia, choros, medo, alegria, celebração – tudo isso e muito mais. A função do brincar é biológica, psicológica e social.

Não se trata tão somente de rir: estamos em terrenos muito além da bufonaria ou do deboche; estamos em terrenos do trágico. Estamos em dimensões de profunda satisfação com a brincadeira em si, isto é, com a experiência de viver.

 

Experimentar a vida em toda sua dimensão e extensão é tudo o que uma pessoa precisa para uma existência feliz e satisfatória, sem adoecimento mental. As experiências de viver garantem nossa continuidade; inserimo-nos como um elo na corrente da humanidade, engajados com aqueles à nossa volta, com aqueles que já não existem mais – através da história, das obras criativas que deixaram; e ainda também engajados com as pessoas que virão a existir um dia, através da preocupação e cuidado com o nosso legado.

Sim, há sim um pouco de loucura em viver criativamente. Por exemplo, por vezes nos pegamos em pleno diálogo compartes de nós mesmos – logo voltarei à importância do diálogo.

Para a criança usamos a palavra brincadeira; para o adulto, o lúdico. É disso que estamos falando. É na ludicidade que a natureza humana se mostra assustadora, fascinante e poética. É somente ali, nessa exclusiva posição, onde é possível construir e compartilhar. Essa constatação é ecumênica, ponto de consenso entre todas as escolas que se debruçam sobre o tema e se propõem a cuidar da saúde mental.

O historiador holandês Johan Huizinga, em Homo Ludens faz um levantamento das diversas derivações do jogo na civilização. Destaca, por exemplo, que Platão costumava dizer que a própria humanidade era um jogo de deus. Esse grego tão influente também acreditava que a religião é essencialmente constituída por jogos lúdicos, dedicados à divindade, os quais são para os homens a mais elevada atividade possível. Aprender é outra atividade lúdica. As raízes do direito e do sistema jurídico estão nos jogos; também a guerra é um jogo, ainda que perigoso; a filosofia, a arte e, claro, a poesia. Em outras palavras, atividades da mais alta abstração como o mistério, o sacro, o rito, produzem na alma humana os efeitos do brincar. A experiência de todos os jogos escapa à lógica. Vai além, até a experiência humana.

Donald Winnicott, pediatra e psicanalista inglês, também se ocupou das experiências de estar saudável. Descreve a condição do que estamos falando de um modo encantador:

“Observe-se que estou examinando a fruição altamente apurada do viver, da beleza, ou da capacidade inventiva abstrata humana, quando me refiro ao indivíduo adulto, e, ao mesmo tempo, o gesto criador do bebê que estende a mão para a boca da mãe, tateia-lhe os dentes e, simultaneamente, fita-lhe os olhos, vendo-a criativamente. Para mim, o brincar conduz naturalmente à experiência cultural e, na verdade, constitui seu fundamento.”

“Sem o elemento lúdico não podemos sobreviver”, destaca Huizinga. Nossa vida psíquica é imaginativa. Vivemos dentro de um espaço imaginativo e lúdico da experiência. O filósofo americano Stephen K. Levine concluiu: “psicopatologia é resultado de uma injúria à nossa capacidade imaginativa”. Já James Hillman, psicólogo americano, insiste que em nossa imaginação somos livres, e devemos saber bem a diferença, fato que é, por si só, um enorme alívio para os seres humanos.

O que pode parecer irrelevante, no entanto, é uma das coisas mais difíceis para nosso aparelho de pensar: a distinção entre imaginação e realidade. Justamente, porque nosso corpo e nossa fisiologia respondem quase da mesma forma frente a um fato ou a uma cena de filme, um parágrafo de um romance, um trecho de música. Nossas lembranças, igualmente, incorporadas têm a mesma química da realidade.

 

Em diferentes áreas das ciências humanas os homens vêm se dedicando a compreender esse estado de satisfação. Marc Chagall, artista plástico do século XX, muito se interessou pela experiência de felicidade, e se dizia feliz. Aproximou essa experiência às cores de sua arte. Para ele, a cor é química, é amor: assim como as cores são reações químicas encontradas na natureza, o amor é uma reação química presente e factível em nossa fisiologia. Questionava-se a respeito do que é capaz de gerar tal química nas pessoas e afastá-las da exagerada ansiedade. E chegou à conclusão de que o processo de desintegração de valores iniciado há dois mil anos no Ocidente, com a ascensão da ciência, vem estreitando a experiência de viver das pessoas. Essa fragmentação que nos trouxe aos labirintos do Cubismo provoca os mais altos níveis de angústia.

Compreender e aprender a lidar com essa experiência humana, de múltiplas escolhas, não registrada antes do advento da modernidade, é uma das maneiras de prevenção do adoecimento psíquico. Acreditava Chagall que a observação e a exposição aos efeitos das cores cooperam na difícil tarefa de incorporação das experiências de vida, com todas as nuances – das mais desagradáveis às mais belas. Assim, cada um de nós estabelece sua própria paleta ética amorosa. Ele resumiu:

‍“Se há uma crise moral, é uma crise de cor, de matéria, de sangue e suas partes, de palavras e sons, e de todos os outros elementos com os quais se constrói uma obra de arte, assim como uma vida.”

As obras da humanidade são genuinamente um bálsamo. Boécio, um prodígio jurista e filósofo do século VI, vítima de mal-entendido e perseguições, foi condenado à morte e manteve sua sanidade, durante a clausura, usando de um jogo. Enquanto preso, presenteou a humanidade com uma obra excêntrica, uma dessas leituras obrigatórias. Sem dúvida, um tratado de como a imaginação, o jogo, a brincadeira e o diálogo nos previnem de qualquer enlouquecimento prolongado. Em A Consolação da Filosofia, um diálogo com sua própria imaginação, Boécio brinca, desafia, provoca, argumenta e compete com sua razão e com todo o conhecimento que acumulou durante sua vida de humanista, um devoto das obras da humanidade. A Filosofia se personifica, os textos clássicos incorporados tornam-se “fontes vivas, à prova da tristeza, do sofrimento, da morte”. O lúdico é lúcido.

 

*Quadro Commedia dell’Arte, óleo sobre tela. Marc Chagall, 1958.

 

Há uma diversidade volumosa dos tipos de ludicidade – algumas solitárias, como lavar uma louça e escrever um livro, outras em grupo, como um conselho administrativo, um time de basquete ou ainda um grupo de jovens se divertindo. Entretanto, mesmo as mais solitárias não são assim tão solitárias: há sempre, ao menos, uma musa.

Os exemplos nas artes são muitos: John Lenon e Yoko Ono, Elena Ivanovna Diakonova e Salvador Dalí, Alma Mahler(talvez a musa das musas) e Gustav Mahler, Oskar Kokoschka e Walter Gropius, Camile Claudel e Auguste Rodin, Joseph Conrad e Ford Madox, Sigmund Freud e Wilhelm Fliess – enfim, a lista é enorme. Dialogar com nossas musas é imprescindível para criar arte e vida.

Mergulhando rapidamente na etimologia do vocábulo diálogo, aprendemos que é uma palavra que vêm do grego antigo, formada por duas partes, dia que significa “através” e logos que significa “palavra” e/ou “conhecimento”. Portanto, poderíamos dizer que dialogar é um processo de conhecer pela palavra o que é ser humano neste mundo.

Dialogar, demanda intensa emoção, é uma das maneiras mais utilizadas na cura dos distúrbios do pensamento. Por isso, as terapias são também um treino para se aprender a falar de modo autêntico, genuíno; primeiro com seu terapeuta e, então, com todos os que lhe importam. Falar e ser ouvido é a única forma, embora ainda precária, de tatearmos e apalparmos as cores de nossa experiência humana.

Assim sendo, vamos investir!

“Se quiser a cura mostre ao médico a doença”. Anicius Manlius Severinus Boëthius, séc.VI

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Biden, Trump, colégios eleitorais: um guia (quase) definitivo para entender as eleições presidenciais dos EUA

Neste 3 de novembro, 150.000.000 de votos são esperados para decidir quem será o 46º Presidente dos Estados Unidos: o democrata Joe Biden ou o republicano Donald Trump. Este número representa 65% da base de cidadãos legalmente aptos a votar e, possivelmente, o maior número de eleitores já registrado em uma votação americana. Este dado, contudo, traz consigo uma série de nuances importantes para entender como, exatamente, funciona o sistema eleitoral dos EUA. Apertem os cintos, pois há algumas curvas bruscas pelo caminho.

Voto… antecipado?

De acordo com o U.S. Elections Project, iniciativa desenvolvida pelo Professor Michael McDonald, da Universidade da Flórida, este ano foram registrados 101.214.494 votos antecipados, sendo pouco mais de 35,93 milhões na forma de votação presencial e 65,28 milhões através de cartas. Embora a pandemia certamente tenha tornado este formato mais interessante, na medida em que evita aglomerações, os votos por carta (mail-in voting) já existem há muito tempo. Em seu livro “O direito de voto: a controversa história da Democracia nos Estados Unidos”, Alex Keyssar aponta que desde o século XVII, no Estado de Massachusetts, homens podiam votar de casa, se suas residências fossem “vulneráveis ao ataque de índios”. Mais à frente, durante a Guerra Civil, o modelo ganhou escala nacional, permitindo que combatentes participassem das eleições. Na disputa presidencial de 1864, por exemplo, que teve como vencedor o republicano Abraham Lincoln, soldados da União puderam votar a partir de campos e hospitais de campanha, supervisionados por seus oficiais. Segundo Paul Gronke, Professor de Ciências Políticas no Reed College e fundador do Early Voting Information Center, essa medida foi adotada porque Lincoln “queria assegurar os votos dos soldados que estavam servindo fora de casa” (Time, 2016).

Finda a Guerra Civil, a mesma lógica foi adotada em períodos de conflito posteriores, como durante as Guerras Mundiais, a fim de garantir o direito de escolha democrática a todos os cidadãos, inclusive aqueles fora do território americano. Mais ainda: entre 1917 e 1918, a Convenção Constitucional de Massachusetts entendeu que esse benefício (absentee ballot) deveria ser estendido a outras categorias, como profissionais do sistema ferroviário e vendedores, visto que eles também se sacrificavam para o bem comum – tal como os soldados.

Se a princípio o voto por carta era autorizado apenas a essas pessoas e algumas situações específicas de doença e imobilidade, a regra começou a mudar nos anos 1970, quando o Estado da Califórnia permitiu que seus habitantes se inscrevessem para essa modalidade, a despeito de terem uma justificativa plausível para isso – o que ficou conhecido como no-excuse absentee ballot. Daí em diante, diversas iniciativas semelhantes foram adotadas por outros Estados americanos, em eleições estaduais e federais. Oregon, por exemplo, oficializou em 2000 o sistema único de votação por carta.

 

 

Para as eleições de 2020, mais quatro Estados já haviam adotado totalmente o modelo postal, sendo eles: Colorado, Hawaii, Washington e Utah. Dos 50 Estados americanos, portanto, 29, além de Washington D.C., já permitem o no-excuse absentee ballot e outros 16 oferecem a opção de voto por carta, ainda que sob determinadas condições – para o detalhamento completo, vide referência da NCSL (2020).

O interessante é que o sistema de voto antecipado tem início até 45 dias antes da data oficial de votação, dependendo do Estado. Motivo: o tempo necessário para que as pessoas recebam os envelopes em suas residências, preencham-no e o remetam de volta às autoridades eleitorais. Em média, contudo, esse período é de 19 dias e se encerra até a última sexta-feira antes das eleições – no caso, 30 de outubro.

Por fim, alguns Estados permitem a votação antecipada presencial, organizada por oficiais representantes das autoridades federais, do próprio condado em que o voto é realizado, ou membros de câmaras e comissões estaduais. Entretanto, as regras variam de Estado para Estado, sendo alguns locais mais flexíveis, permitido voto nos finais de semana, e outros mais restritos, em datas e horários previamente determinados.

Como recomendação, os eleitores americanos são orientados a procurar as regras de sua região a partir da página da Conferência Nacional de Legislaturas Estaduais (NCSL) ou sites independentes que surgem com o propósito de compilar e, principalmente, simplificar o acesso à informação, como o Rock the Vote – este, em particular, online desde os anos 90, quando executivos da indústria musical se uniram em resposta à censura de artistas do hip-hop e do rap, engajando milhões de jovens no exercício de seu direito e representação de seus interesses.

 

O sistema de voto por carta está sujeito a fraudes?

Ao longo dos últimos meses, o atual Presidente Donald Trump fez diversos pronunciamentos públicos contra esse modelo de votação, alegando que o mesmo favorecia candidatos democratas, estaria sujeito a fraudes ou poderia sofrer interferência estrangeira. Durante um evento de campanha em 17 de agosto, em Wisconsin, chegou a afirmar que “a única forma de perder esta eleição é se ela for fraudada”.

Mas será que essas afirmações encontram respaldo?

O partido democrata incentivou seus apoiadores a votar de maneira antecipada, temendo que o serviço postal dos EUA (USPS – United States Postal Service) não daria conta de entregar todos os votos a tempo. Neste âmbito, Donald Trump promoveu um grande impasse a respeito de um fundo adicional de US$ 25 bilhões que seria destinado a fortalecer o serviço, aprovado pela Câmara, mas barrado na Casa Branca.

Não obstante, existem diversas regras que mitigam fraudes no sistema – e que geram mais embates entre as visões democrata e republicana.

Para votar para presidente nos EUA, você precisa ter cidadania americana e ao menos 18 anos de idade. Alguns Estados, porém, influenciados por medidas republicanas, aprovaram leis obrigando eleitores a portar documentos de identificação e/ou se registrar para que seu voto possa efetivamente ser computado. Segundo os democratas, este foi um artifício para dificultar o voto dos cidadãos de mais baixa renda e membros de minorias, que não teriam uma carteira de motorista, por exemplo, para comprovar sua identidade.

De qualquer forma, e tomando as eleições presidenciais de 2016 como base, de um total de 57,2 milhões de votos por carta, apenas 318,728 (ou 0,006%) foram rejeitados, segundo The Election Administration and Voting Survey, e pelas seguintes razões:

– 27,5% por divergência de assinatura;

– 23,1% por perda do prazo de votação;

– 20,0% por voto sem assinatura;

– 3,0% por voto sem assinatura de testemunha;

– 1,5% devido ao falecimento do eleitor;

– 1,3% porque eleitor votou presencialmente; e

– 1,1% quando eleitor, em sua primeira participação, não tinha o devido registro eleitoral

A análise da base de dados de eleições anteriores demonstrou indicadores ainda mais baixos: dentre 250 milhões de votos por carta analisados por uma iniciativa de cientistas políticos do MIT a partir dos números do Heritage Foundation’s Election Fraud Database, apenas um percentual irrisório de 0,00006% apresentou algum tipo de fraude propriamente dita.

As falas de Trump, porém, têm um outro efeito adverso, uma vez que a desinformação pode ser nociva e ganhar espaço rapidamente na opinião popular: de acordo com uma pesquisa conjunta da ABC News e Washington Post, realizada em julho deste ano, 49% dos americanos acreditam que esse modelo é vulnerável a fraudes.

Contagem de votos

Devido às diferentes modalidades de voto, a contagem até hoje nunca se encerrou no mesmo dia da votação. No entanto, é comum que já no dia seguinte haja um percentual de apuração suficiente para determinar o vencedor.

A maioria dos sites jornalísticos trabalha com “projeções” por Estado, ou seja, marcos que indicam que um dos candidatos atingiu uma quantidade tal de votos improvável de ser ultrapassada com base na votação restante. A partir daí, calculam o total de colégios eleitorais correspondentes a esse Estado e os atribuem ao candidato. Ademais, existe uma tradição de votos: Estados republicanos quase sempre votam no candidato republicano, assim como os Estados democratas, em seu correspondente do partido simbolizado pelo asno , facilitando assim essa análise.

 

Agora vem a parte curiosa: o Presidente dos Estados Unidos não é eleito por maioria de votos diretos e, sim, por maioria de votos colegiados. Ao todo, existem 538 colégios eleitorais no país, distribuídos entre os 50 Estados federativos, proporcionalmente a sua população. Assim, Estados muito populosos, como a Califórnia, têm mais colégios eleitorais do que os menos populosos, como o Maine. Entretanto, existe uma regra de que um Estado, a despeito dessa mesma população, não pode ter menos do que 3 colégios eleitorais. Dessa forma, temos a seguinte distribuição:

Os votos computados em 3 de novembro são então delegados a cada um dos membros dos colégios eleitorais que, por sua vez, elegem o novo (ou reelegem o atual) Presidente dos Estados Unidos no dia 14 de dezembro.

Como regra geral, o candidato mais bem votado em um Estado recebe por extensão os votos de todos os colégios eleitorais correspondentes. Por isso, estados como a Califórnia (55 colégios), Texas (38), Flórida (29) e Nova Iorque (29) são particularmente críticos, visto que garantem uma boa proporção dos 270. Mesmo assim – e a esta altura do artigo isto não será nenhuma surpresa –, a regra não vale para todos os Estados: o Maine e Nebraska dividem seus votos colegiados com base na proporção de votos recebida por cada candidato.

A contagem de votos é feita majoritariamente por equipamentos eletrônicos – tanto no cômputo de votos digitais, quanto na leitura de códigos de barra das votações por carta –, embora mesários tenham de conferir manualmente eventuais registros físicos não processados pelos computadores.

Uma vez que a votação é encerrada, os dados de cada localização são transferidos para uma Central Eleitoral. Este processo, no entanto, compreende tanto transferências eletrônicas de dados, quanto o transporte físico de HDs e outros tipos de memória até as estações eleitorais. Só a partir daí os votos começam efetivamente a constar dos registros oficiais de cada Estado e a serem divulgados na Internet. Embora os Estados também trabalhem com as projeções mencionadas anteriormente, o resultado oficial obtido a partir da contagem de 100% dos votos válidos pode ocorrer apenas semanas depois.

Mas por quê?

A explicação do sistema de votos dos Estados Unidos remonta ao século XVIII, mais precisamente ao período em que a Constituição do país estava sendo elaborada. Naquela época, 1787, a extensão territorial e a dificuldade de comunicação tornavam uma eleição direta algo praticamente inviável – além de indesejado, sob alguns olhares específicos.

Dessa maneira, os colégios eleitorais surgiram como alternativa.

Para os constitucionalistas, ela dificultava que legisladores de Washington D.C. tivessem poder para eleger um presidente; para Estados menores, era uma forma de ganhar voz, ainda que um sussurro, no processo eleitoral; para os fazendeiros sulistas, uma grande vantagem: mais populosos do que os Estados do norte, essas regiões no entanto tinham uma quantidade muito significativa de escravos que, embora não fossem autorizados a votar, eram incluídos no Censo americano e considerados na distribuição final de colégios de cada Estado – portanto, uma maneira sutil de garantir os interesses do grupo escravocrata e agrário.

Algumas curiosidades

– Nas eleições presidenciais de 2000, Al Gore foi derrotado por George W. Bush no Estado da Flórida por meros 537 votos (de um total de mais de 6 milhões). Essa diferença quase simbólica, porém, foi suficiente para garantir os 29 votos do colegiado para o republicano e decidir a votação;

– Na disputa de 2016, Hillary Clinton obteve quase 3 milhões de votos a mais do que Donald Trump. Ainda assim, o candidato republicano conseguiu uma vitória confortável com 304 votos colegiados, já que venceu em Estados chave, em que essa representação de colégios é maior;

– Em toda a história americana, apenas 5 Presidentes foram eleitos sem terem recebido a maioria de votos (diretos, não colegiados): John Quincy Adams (1825), Rutherford B. Hayes (1877), Benjamin Harrison (1889), George W. Bush (2000) e Donald Trump (2016);

– E se ninguém obtiver maioria de votos? Essa situação ocorreu apenas uma vez, em 1824, quando havia quatro candidatos concorrendo à Presidência e a decisão foi tomada pelos membros da Câmara (House of Representatives). Hoje, com essencialmente dois, isso se torna bastante improvável;

– Apesar da popularidade absolutamente superior de Biden e Trump, há vários outros concorrendo às eleições presidenciais de 2020: Jo Jorgensen, pelo partido Liberal; Howie Hawkins, pelo partido Verde; além de mais de trinta candidatos independentes ou associados a partidos pouco expressivos, como o Socialista, o Progressista, o Constituinte, dentre outros;

– De certa forma, podemos dizer que há pesos diferentes dentre a escolha direta dos eleitores americanos. Na Califórnia, Estado com 55 votos colegiados e uma população de 39,51 milhões (estimativa do Censo de 2019), cada eleitor tem um peso de 1,39 na definição do presidente; já em um Estado menor, como Vermont, para o qual são designados apenas 3 colegiados dentre uma população de quase 624.000, a razão do voto sobe para 4,81. Se considerarmos apenas o número de eleitores registrados dentre a população desses Estados, a razão passa a ser de 2,52 (55,21% da população californiana) e 6,1 (78,86% em Vermont);

 

– Se Trump for reeleito, seu mandato será estendido até 2024, sem interrupções. Caso Biden vença, haverá um momento de transição em que o novo Presidente deverá nomear seus ministros – neste caso, o democrata seria juramentado e daria início a seu mandato apenas em 20 de janeiro de 2021.

 

‍Saiba mais em:

ABC News / Washington Post poll: The 2020 Election. Pesquisa eleitoral realizada em julho de 2020 e disponível (inglês), em:

https://www.langerresearch.com/wp-content/uploads/1214a22020Election.pdf

ARN, Jackson. (2018). The cartoonist who turned democrats into donkeys and republicans into elephants. Reportagem publicada em 25 de outubro, no portal Artsy.net, e posteriormente atualizada para a CNN: Why democrats are donkeys and republicans are elephants.

Ballotpedia, the Encyclopedia of American Politics.

KEYSSAR, Alex. (2014). O direito de voto: a controversa história da Democracia nos Estados Unidos. São Paulo: Editora Unesp.

LIPTAK, Kevin. (2020). Trump warns of ‘rigged election’ as he uses conspiracy and fear to counter Biden’s convention week. Reportagem para o portal CNN, publicada em 17 de agosto.

Market Watch. (2020). White House rejects House bill for emergency Postal Service aid. Reportagem publicada no portal em 23 de agosto.

NCSL – National Conference of State Legislatures. (2020). State laws governing early voting.

Rock the Vote. Página para orientação de eleitores a respeito das datas, condições e formas de votação disponíveis em cada região do país.

GREVE, Joan E. & SINGH, Maanvi. (2020). US 2020 election could have the highest rate of voter turnout since 1908. Reportagem publicada no portal The Guardian, em 24 de outubro.

The Guardian. (2020). Trump says Republicans would ‘never’ be elected again if it was easier to vote. Reportagem de 30 de março de 2020.

U.S. Election Assistance Commission. (2017). Early, absentee and mail voting. White paper disponibilizado em 17 de outubro.

U.S. Election Assistance Commission. (2016). The Election Administration and Voting Survey 2016 Comprehensive Report.

WAXMAN, Olivia B. (2016). This is how early voting became a thing. Reportagem para a TIME Magazine, edição de 25 de outubro de 2016.

World Population Review. (2020). Number of registered votes by State.

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O problema é seu

Segundo a filosofia, um problema é algo que perturba a paz e a harmonia de alguém, mas também é, em geral, qualquer situação que inclua a possibilidade de uma alternativa. Neste caso, eu diria que o problema, é o estimulante que, por vezes, necessitamos para testar e desenvolver a nossa inteligência cognitiva, já que a capacidade de aprender algo novo é inerente ao ser humano. Ter um problema é, sem dúvida, ter a oportunidade de testar a si mesmo, colocar-se à prova da experiência e, a partir dela, extrair lições que possam mudar os nossos conceitos e atitudes. Enfim, ter um problema é ter oportunidade de entrar em contato com as adversidades, se restabelecer como pessoa, redefinir as forças e encontrar razões para continuar.

Os problemas relatados neste texto são os habituais, são aqueles para os quais, ainda que fujam do nosso controle, sempre temos a solução e que, na maioria das vezes só acontecem por descuido. “O problema é seu” é um tema que sugere reflexão sobre as nossas atitudes e condutas do dia a dia, no âmbito familiar e, sobretudo, no trabalho, pois tratando-se de gestor/líder e liderados, existe aí uma relação de reciprocidade quanto à resolução de conflitos. Mas nem sempre é assim.

O problema é seu!

Esta é uma frase repetida frequentemente e de maneira impetuosa por pessoas que não se dão conta da decepção e desapontamento que podem causar ao outro. Problemas?! Quem não os tem? Todos temos. O que nos falta ainda é maturidade suficiente para perceber e entendê-los à medida que vão surgindo. E, partindo da premissa deque todo problema tem sua particularidade, é importante que sejamos cuidadosos ao identificá-los, pois devem ser respeitados, principalmente quando estão “do outro lado”. E, de acordo com seu grau de complexidade, seja ela de maior ou menor relevância, devem ser tratados com muita sabedoria, especialmente na hora de compartilhá-los com alguém, visto que nem sempre as pessoas estão dispostas a resolver questões que, na lucidez de sua ignorância, julgam não ser do seu interesse.

Um problema só pertence a uma única pessoa até o momento em que ele não é dividido com outra. Quando esse problema é compartilhado, ele passa a pertencer a uma segunda pessoa. Neste caso, podemos dizer que o problema agora é “nosso” e não somente “seu”. Ou seja, a partir do momento em que resolvemos expor algo a alguém, ainda que seja um integrante familiar, um amigo ou até mesmo aos nossos líderes, isso significa que, indiretamente, estamos pedindo ajuda para encontrar, senão a solução, ao menos uma tentativa. É uma relação de confiança, ainda que unilateral, na maioria das vezes.

 

O fato é que esse entendimento fica aquém da nossa realidade e se torna bastante comum em muitas empresas. Palavras como acolhimento e empatia, por exemplo, são “robotizadas”, “estão na moda” e por isso são repetidas aleatoriamente, sem nenhum efeito de causa. Assim, é muito mais fácil ser indiferente ao problema alheio porque gerir conflitos é uma tarefa que exige habilidades, sensibilidade, respeito, moral e ética pessoal e profissional – e, no âmbito do ambiente de trabalho, a maior responsabilidade dessa conquista é do gestor / líder.

Ajudar um liderado a encontrar soluções para o seu problema é criar estratégias para melhorar o engajamento e a motivação da equipe. Diante desta questão, adequar a postura profissional é fundamental, pois somos, no trabalho, uma extensão de quem realmente somos em casa, na rua, ou em qualquer lugar. É importante que todo e qualquer profissional saiba se posicionar independente da função ou cargo que ocupa. O fato é que muitos deles perdem o foco daquilo que realmente importa e acabam se voltando para assuntos irrelevantes.

Tratar um problema de forma singular é negligenciar a gestão de pessoas e continuar achando que está tudo bem. O filósofo Mário Sérgio Cortella disse: “é necessário cuidar da ética para não anestesiarmos a nossa consciência e começarmos a achar que tudo é normal”.

Infelizmente, quando pensamos em empatia no território da personalidade, quem marca ponto é o egoísmo. Problemas são comandos naturais que existem para nos desafiar. São artifícios que a vida usa como caminho para nos tirar da zona de conforto, a qual nos priva de conhecer algo novo. É preciso entender e admitir que os problemas existem e eles continuarão no caminho, pois fazem parte da vida.

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OKR: movendo pessoas na direção certa

Para alcançar resultados positivos, não basta ter equipes talentosas. Mais importante é que elas estejam focadas nos objetivos corretos. Do contrário, seus esforços serão desperdiçados e elas acabarão desmotivadas.

Nesta linha, John Doerr, presidente de uma empresa de venture capital e palestrante em um dos eventos TED Talk, fala sobre perseguir as metas certas pelos motivos certos, e como isto influencia, direta e profundamente, o engajamento e os resultados de uma equipe.

Na década de 70, Doerr trabalhou no time de Andrew Grove, aclamado executivo cujo trabalho até hoje é referência sobre liderança. Grove então desenvolveu um sistema voltado para a excelência operacional que denominou “OKR”, objective and key results (ou objetivos e resultados chave), e que colocou em prática na Intel. Segundo ele, aquilo que você sabe não faz tanta diferença, mas sim a maneira como você transforma esse conhecimento em ações.

Assim, OKR é um sistema de metas que pode ser empregado tanto em contextos corporativos quanto pessoais, indicando o que queremos realizar (o objetivo ou direcionamento), e como o faremos (os resultados chave, que nos permitem dizer se ele foi ou não cumprido). Não se trata, porém, de estabelecer metas convencionais – como a quantidade de produtos fabricados ou unidades vendidas; Grove referia-se a metas que se conectam ao senso de propósito das pessoas, capazes de inspirá-las a agir.

Ademais, OKRs não estão ligados a compensações financeiras: um colaborador não recebe bônus, nem é promovido por atingi-lo. No entanto, a existência desse sistema funciona como um elemento de apoio à construção de uma cultura de tomada de risco, em que as pessoas se sentem confortáveis para buscar novos patamares, cientes de que nessas iniciativas erros poderão surgir – isso faz parte do processo e constitui uma rica fonte de aprendizado.

No livro “Avalie o que importa”(2019), Doerr lista quatro “superpoderes” oriundos de OKRs:

1. Foco e compromisso com as prioridades: organizações e indivíduos conseguem distinguir claramente o que é mais importante e, então, concentrar-se nessas tarefas;

2. Alinhamento e conexão: OKRs devem ser declarados de forma aberta e transparente, para que a organização como um todo tenha visibilidade dos objetivos que se pretende alcançar e, principalmente, para que cada colaborador possa estabelecer um elo de propósito entre seus OKRs individuais e aqueles do grupo. Este alinhamento é responsável por fazer com que o significado ao trabalho transcenda questões meramente financeiras ou relacionadas a cargos, fortalecendo assim o “senso de dono” e promovendo ambientes mais colaborativos, emocionalmente seguros e, portanto, mais propensos à criatividade e à inovação;

3. Accountability: esse sistema baseia-se em dados e verificações contínuas que nos permitem acompanhar, avaliar e, eventualmente, ajustar nossas ações para que os objetivos corretos continuem priorizados e possam ser alcançados adequadamente; e por fim

4. Busca pela excelência: OKRs são um estímulo à superação, motivando as pessoas afazer mais do jugam possível ou viável. Trata-se de um sistema que testa nossos limites de maneira positiva, ao mesmo tempo em que fomenta habilidades importantes, como o pensamento adaptativo, a colaboração entre perspectivas multidisciplinares e transversais, e a abertura para o novo.

 

Como alcançar isso?

 

 

Simon Sinek, criador do conceito do Círculo Dourado, diz que devemos começar pelo “porquê”. O que nos impulsiona à ação? Quais são as razões por que fazemos o que fazemos.

Diversas empresas foram criadas apartir de propósitos muito específicos, até pessoais. Missões inspiradoras pelas quais grupos de pessoas se devotaram, encontrando soluções para desafios das mais diversas complexidades, e se apoiando nelas para transformar a vida de milhões de pessoas. Objetivos são, portanto, metas concretas, dotadas significado, orientadas à ação… motivadoras.

Como diria Bono Vox, vocalista do U2:

“Você tem paixão? A quais ações essa paixão te move? Se o coração não encontra uma rima perfeita na mente, sua paixão não significa nada.”

Praticante de longa data do modelo de OKRs, ele usou a frase acima para explicar como o aplicava a uma campanha de cunho social chamada ONE. De forma simples e direta, essa iniciativa conta com dois objetivos: (1) ajudar os países mais pobres do mundo, conseguindo o perdão de suas dívidas; e (2) garantir o acesso universal a medicamentos de combate à AIDS.

Este é, portanto, o primeiro passo na definição dos OKR: identificar uma causa que o mobilize verdadeiramente, uma meta de desenvolvimento pessoal ou o porquê da existência de sua organização e anotá-la em um local de destaque, a fim de que todos possam ver e entender o que se espera alcançar. Observe, no entanto, que esse objetivo tem de ser suficientemente desafiador, para garantir um processo de crescimento ao longo da jornada, mas, ao mesmo tempo, factível, a fim de que a impossibilidade de o alcançar não exerça um efeito oposto, provocando desânimo e descomprometimento.

E quanto aos resultados chave, o nosso “como”?

Esses resultados devem ser:

específicos, ou seja, dizer claramente a que se referem;

– temporais, trazendo uma data de conclusão;

audaciosos, embora realistas;

mensuráveis e verificáveis, ou seja, deve ser possível, e simples, identificar a partir deles se os objetivos foram de fato atingidos.

 

Hoje, diversas empresas ao redor do mundo usam o sistema OKR para definir planos estratégicos, e incentivam seus colaboradores a fazer o mesmo, na esfera pessoal.

A combinação desses dois movimentos gera o propósito capaz de mobilizar iniciativas.

Vejamos um exemplo de empresa que utiliza essa base:

Em 2004, um engenheiro indiano chamado Sundar Pichai juntou-se ao Google, atuando inicialmente na área de buscas. Com o tempo, ele identificou uma oportunidade que despertou a atenção dos executivos: construir um navegador de internet próprio, mais simples e poderoso do que os então disponíveis, capaz de absorver as diversas aplicações web que estavam surgindo.

Pichai, entusiasta do modelo (que já fazia parte da cultura do Google desde o final dos anos 1990, quando John Doerr tornou-se investidor da empresa e o disseminou a partir dos fundadores, Larry Page e Sergey Brin), apoiou-se no sistema para estabelecer seu objetivo e como alcançá-lo – de forma bastante categórica, aliás: segundo ele, o Google Chrome seria o melhor browser do mundo e a medida disso foi definida apartir do número de usuários.

Para o ano de lançamento do browser, Pichai estabeleceu uma meta de 20 milhões de usuários; porém, conseguiu apenas 11 milhões. No segundo ano, aumentou a projeção para 50 milhões; e conseguiu 37 milhões, uma melhora significativa. Para o terceiro, dobrou essa meta: 100 milhões de usuários!

E, dessa vez, conseguiu 111 milhões:

O principal ponto desta história não é apenas o sucesso do navegador, mas o fato de que Sundar Pichai manteve-se fiel a seu objetivo, tomando as medidas estratégicas necessárias, ano após ano, a fim de alcançá-lo.

 

OKR versus KPI: visões diametralmente opostas

Muitos confundem OKR e KPI – ou consideram as duas siglas formas distintas de dizer a mesma coisa. Na verdade, existe uma diferença significativa entre os objective & key results e os key performance indicators:

– o OKR tem uma proposta qualitativa, funcionando como um sistema para inspirar e motivar, que se concentra no crescimento, seja do indivíduo ou da organização que o aplica. Adicionalmente, possui uma composição híbrida, geralmente 50/50 ou 60/40, em que os objetivos individuais são construídos e depois mesclados aos da organização, mantendo-se uma proporção equilibrada. Essa sinergia, por sua vez, é fundamental para que a pessoa se sinta envolvida no processo e inspirada a contribuir nesse mesmo propósito;

– já o KPI está relacionado à mensuração quantitativa, empregado como avaliação de performance no atingimento de resultados. De maneira geral, é uma iniciativa top-down, partindo das camadas executivas e cascateado às operacionais. Normalmente, é aplicado como balizador financeiro e fator crítico para promoções, durante os ciclos de avaliação dos profissionais.

OKRs e KPIs não são necessariamente excludentes. Porém, é preciso ter clareza sobre o resultado que se busca com a aplicação de cada um desses sistemas.

Normalmente, KPIs são desenvolvidos para processos que já estão implantados e em andamento, no intuito de obter uma visão de retorno (essencialmente numérica); por outro lado, OKRs são potencializadores de mudança, catalisando o ímpeto individual em prol da transformação do grupo, ou da organização, como um todo (costumeiramente mais abstratos).

 

Desafios no primeiro ciclo de OKR

Embora o conceito em si seja bastante simples, implementar o primeiro ciclo de OKR pode trazer consigo alguns desafios. Por isso, é importante ter em mente que migrar de um modelo de KPIs para um modelo de OKRs envolve várias mudanças culturais – este último demanda um nível de maturidade e comprometimento muito maior dos colaboradores, especialmente porque envolve habilidades de comunicação e feedback nas quais as pessoas (e lideranças) nem sempre estão preparadas para oferecer adequadamente.

 

 

Dessa forma, oferecemos aqui algumas dicas para guiá-los nesse processo, pensando inicialmente no âmbito pessoal:

– avalie o seu momento de vida: onde você está, onde gostaria de chegar, quais seus pontos fortes e quais habilidades precisa desenvolver. A partir daí, comece a esboçar o que falta para que esse caminho se materialize. Lembrem-se de que ele deve expressar de maneira clara uma evolução qualitativa – como desenvolver uma determinada habilidade, concluir uma formação, participar de um comitê de sua cidade, etc. – e não um fato quantitativo (por exemplo: “daqui a dois anos, ganhar um salário R$ X,00”). Essa distinção é importante, porque enfatiza a trajetória de aprendizado e as inúmeras oportunidades que poderão ser exploradas ao longo dela, em vez do resultado em si;

– tente achar uma medida razoável entre objetivos simples demais e metas inalcançáveis: OKRs devem exigir esforço, dedicação e, principalmente, olhares heterodoxos para a solução do problema. Se você perceber que todos esses objetivos têm sido atingidos com certa rapidez ou facilidade, ajuste a régua um pouco mais para cima. Larry Page, contudo, opta uma abordagem mais ambiciosa:

“(…)prefiro que um time estabeleça como objetivo ir até Marte e, mesmo no caso de insucesso, consiga algo extraordinário, como ir à Lua.”

– John Doerr (2019) aponta que uma organização deve estabelecer de 3 a 5 resultados chave para cada objetivo, e não mais do que 7 objetivos. No primeiro caso, uma quantidade grande de resultados pode confundir ou fazer com que o time perca o foco das prioridades para chegar ao objetivo; no segundo, é uma questão estratégica, na medida em que pode pulverizar os esforços das equipes entre metas distintas que não necessariamente convergem para um propósito em comum. No plano pessoal, trabalhe com 1-3 objetivos e, no máximo 3 resultados chave para cada um deles, mantendo a simplicidade;

– acompanhe a evolução do trabalho ao menos uma vez por semana: pergunte a si mesmo: quais avanços obtive esta semana em direção aos objetivos? Se nenhum progresso foi feito, reflita sobre as razões por que isto aconteceu e o que pode ser feito para reverter essa tendência na semana seguinte. Também verifique se o andamento das tarefas está de acordo, a frente ou atrasado em relação ao planejado. Tome as ações necessárias para corrigir a rota – inclusive, rever o próprio objetivo, caso ele não faça mais sentido ou tenham surgido prioridades diferentes devido a alguma situação específica;

– por fim, analise seus avanços e pondere possibilidades de aprimoramento: assim será possível estabelecer objetivos cada vez mais grandiosos, além de entender que fatores têm desacelerado ou bloqueado esse avanço.

Esperamos que sua experiência como sistema OKR seja um caminho de muito aprendizado e superação, capaz de contribuir de modo amplo com seu desenvolvimento e – por que não? – com a transformação do mundo? Use e abuse de ferramentas visuais – como os bons e velhos quadros e post-its ou, no caso de times distribuídos remotamente, versões digitais que permitam a integração e colaboração. A participação de todos os membros de uma equipe no processo de cocriação dos objetivos dá legitimidade à iniciativa e é, por si só, já um excelente ponto de partida.

 

Saiba mais em:

CHERKASOV, Anton. (2020). 5 OKRsmistakes and how to avoid them.

DOERR, John. (2019). Avalie o que importa: como o Google, Bono Vox e a Fundação

Gates sacudiram o mundo com os OKRs. Rio de Janeiro: Alta Books.

DOERR, John.(2018). Entrevista com Donald Sull: OKRsand measuring what matters.

MITSMR. Disponível em inglês.

DOERR, John. (2018). TED Talk: “Por que o segredo do sucesso é definir as metas certas”.

GROVE, AndrewS. (1995). High management output. Vintage editors, 2nd edition.

SINEK, Simon.(2018). Comece pelo porquê: como grandes líderes inspiram pessoas e equipes a agir. São Paulo: Sextante.

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Gestão por competências

Gerir estrategicamente os talentos não é mais uma opção, é uma necessidade para as empresas que queiram manter a vantagem competitiva. Afinal, são as pessoas as principais responsáveis por desenvolverem as competências essenciais das organizações e transformá-las em produtos, processos, serviços que agreguem valor à empresa. Por este motivo, a gestão por competências está cada vez mais presente nas organizações.

A gestão por competências permite que a organização planeje, organize, desenvolva, acompanhe e avalie as competências necessárias ao seu negócio. Quando feita da maneira correta, pode ajudar o fortalecimento da marca empregadora e a atração de talentos, uma vez que ela servirá, entre outras coisas, para fortalecer a cultura da companhia.

O modelo de gestão por competências pode ser aplicado em qualquer organização, independente do porte ou quantidade de funcionários. Um bom modelo de competências é dinâmico, considerando os ajustes periódicos necessários frente a evolução da empresa e as mudanças do cenário no qual está inserida.

A competência é da pessoa e não da empresa ou de uma função. A empresa, a função exercida requerem determinadas competências, mas quem as concretizam são os profissionais que ali trabalham.

Mas afinal, o que é competência?

Muito se fala o termo competências e a sigla CHA (conhecimento, habilidade, atitudes) a ele associada, mas a minha experiência mostra que nem sempre esse termo é bem compreendido.

Conhecimento: o saber

Uma pessoa adquire conhecimento de várias formas: estudo formal, palestras, leituras, trabalhando junto com alguém. Podemos dizer que ela fica com um “biblioteca” interna, da qual lança mão quando necessário.

Habilidade: o saber fazer

A habilidade pode ser inata o desenvolvida. Quando inata, representa um talento, um “dom” que já vem com a pessoa. Ela pode ser aprimorada pela prática e com aquisição de conhecimento e é diferencial da demonstração da competência entre as pessoas.

Atitude: o querer fazer

A atitude é a energia interna que impulsiona o comportamento. Você conhece alguma pessoa que sabe, sabe fazer mas não faz? É um problema de atitude, não de conhecimento ou habilidade.

Vamos a um exemplo que demonstra a interação Conhecimento/Habilidade/Atitude:

· Uma pessoa pode nascer com habilidade musical: ser afinada ao cantar, ter bom ouvido para identificar tons de música, mesmo sem ter nenhum conhecimento de teoria musical. Quando ela associa essa habilidade a um conhecimento, a prática tenderá a levá-la a um desempenho superior quando o querer está presente. Sem ele esse talento não se concretiza.

· Outra pessoa, sem essa habilidade natural, também poderá aprender teoria musical e treinar bastante o canto, movida pelo querer (atitude interna) mas o resultado disso tudo está vinculado ao limite de sua habilidade.

Em uma definição bem simples, competência não é aquilo que a pessoa alega conhecer, mas sim sua capacidade de transformar o conhecimento em uma prática com valor agregado para ela e para todas as interfaces que a pessoa tem em seu ambiente de trabalho (liderança, time, outras áreas da empresas, clientes, fornecedores).

Mas como se mede uma competência?

Uma competência somente pode ser visualizada por meio de uma ação prática, um comportamento que demonstra a presença da mesma. As palavras chave para uma boa mensuração são critério e evidência.

Cada competência tem uma descrição do conjunto de comportamentos que são esperados, que são o critério que será utilizado para contratar, acompanhar e desenvolver as pessoas.

 

Competência Foco no Resultado

Comportamentos de evidência

· Assume a responsabilidade pelo próprio trabalho, e age no sentido de garantir que o mesmo seja feito dentro do prazo e dos padrões acordados.

· Monitora o andamento das atividades sob sua responsabilidade, de maneira a garantir que as prioridades sejam atendidas.

· Reconhece e supera rapidamente erros/falhas, agindo no sentido de corrigi-los e preveni-los.

· Cumpre com os prazos acordados e busca alternativas para antecipar e/ou superar adversidades que surjam.

As evidências são os comportamentos apresentados pela pessoa, que permite verificar o quanto eles são aderentes aos comportamentos esperados naquela competência.

Quais são os benefícios?

A clareza trazida pelo modelo contribui para que todos saibam exatamente o que se espera em cada competência e entendam a importância de cada um dentro da empresa, evitando que a gestão seja feita de forma subjetiva.

Os ganhos ainda incluem:

· incentivo aos colaboradores a trocarem experiências e conhecimentos e se desenvolvam individualmente e como time;

· atuação com visão sistêmica pela compreensão da relação de interdependência entre as áreas; e

· abertura para reflexão e para o diálogo, como forma de alavancar o desenvolvimento.

Competências e Protagonismo

Como escrito anteriormente, o querer fazer (atitude) é que impulsiona nosso comportamento. Quando consideramos a importância de a pessoa assumir o protagonismo pelo seu desenvolvimento, o autoconhecimento é componente indispensável para lapidarmos cada vez mais nossos talentos.

É ele que vai permitir que a pessoa amplie sua perspectiva sobre a forma como tem colocados suas competências a favor da empresa e de si mesma. A partir dai, é traçar uma meta e buscar alternativas de desenvolvimento que não, necessariamente, se resumem a realização de cursos. Na verdade, o aprendizado maior acontece nas ações e experiências do dia a dia.

 

O que você pode fazer de diferente hoje que vai contribuir com a ampliação de seu talento?

 

 

Referências bibliográficas

DUTRA,J. Gestão de Pessoas – Modelo, Processos, tendências e Perspectivas. Ed. Atlas, 2018

DUTRA,J. S. (Org.). Gestão por competências. São Paulo: Ed. Gente, 2001.

GREEN,P.C. Desenvolvendo competências consistentes. Ed. Qualitymark, 2000

PONTES, B.R. , SERRANO, C.A.A arte de selecionar talentos. São Paulo: DVS Ed., 2005

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Nossa voz interior: o 8º hábito de Stephen Covey

Stephen Covey tornou-se mundialmente famoso em 1989, a partir do lançamento de “Os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes”. Neste livro, propunha uma disciplina para que atingíssemos plena eficácia na vida. Contudo, mais do que o foco nas questões técnicas e profissionais, Covey enfatizava a autoliderança e, especialmente, o caráter como principais bases de nosso desenvolvimento. Somente a partir dessa integridade seríamos então capazes de realizar contribuições genuínas e, consequentemente, construir nosso legado.

 

Se os sete hábitos originais

-Seja proativo;

-Comece com o objetivo em mente;

-Foque primeiro o mais importante;

-Pense ganha-ganha;

-Procure primeiro compreender, depois ser compreendido;

-Crie sinergia;

-Afine o instrumento

nos provocavam à organização, colaboração e interrelação mais assertivas, o oitavo, ao qual o autor dedicou um novo livro exclusivamente, nos impulsiona à grandeza da liderança.

Sob a metáfora do simples fósforo, cujas chamas podem acender uma vela e iluminar uma sala inteira, sua reflexão nos convida a buscar nossa voz interior, nossos propósitos e motivações, deforma a inspirar as pessoas ao nosso redor. Neste contexto, a “voz” possui significado único para cada pessoa, sendo um ponto de convergência entre talento (dons e pontos fortes que nos são inerentes), paixão (elementos que nos estimulam e nos dão energia), necessidade (aquilo de que o mundo carece) e consciência (o chamado que nos impele à ação).

Se até pouco tempo atrás a motivação era vista como um estímulo externo, aqui ela é ressignificada como um impulso oriundo de si próprio. A partir dessa imersão de autoconhecimento, em que exploramos nossas habilidades, competências, experiências e, igualmente, pontos que podemos desenvolver, identificamos os valores que compõem quem somos e o nosso potencial integrador.

O caminho não poderia ser diferente: é preciso curiosidade, abertura, disciplina, muito esforço e determinação – pontos de partida do chamado mindset de crescimento. Tudo começa a partir de nós mesmos, e a busca constante por crescimento, para em seguida nos dedicarmos ao outro, identificando seus valores e potenciais, e ajudando-o a se desenvolver também, de uma forma compreensiva, livre de comparações e julgamentos.

Pare um momento e pense sobre suas principais características. Em geral, o exercício é difícil e requer um esforço extra. Afinal, fomos criados em um contexto social que ressalta fraquezas em vez de reforçar qualidades. É por esta razão, então, que Covey nos convida a um olhar diferente, voltado para o potencial de cada indivíduo e como esse conjunto de valores pode equilibrar as relações, fortalecendo o grupo como um todo. Liderança, segundo ele, é essa vontade de viver em função de princípios que criem e transmitam confiança aos demais – não se trata, portanto, de uma posição formal, mas de uma postura que inspira.

 

Um brilho mais intenso

 

Quando alguém que encontrou sua voz interior e a vive com plenitude se aproxima de outra pessoa, essa “chama” cria um brilho mais intenso que se propaga cada vez mais facilmente. No contexto corporativo, podemos entendê-la como uma manifestação que abrange as estruturas, processos, sistemas e interações, e que se fortalece a partir do momento em que os times agem de maneira complementar, desenvolvendo uma soma de forças maior do que aquelas existentes individualmente.

“A liderança consiste em comunicar às pessoas seu valor e potencial de modo tão claro que elas possam reconhecê-los como próprios.”

A frase de Covey, entretanto, pode ser entendida de modo mais amplo: a liderança traduzindo a organização, que precisa estabelecer como cultura um processo recíproco de desenvolvimento de cada colaborador, a partir das iniciativas de recrutamento e seleção e passando por todos os subsistemas de Gente & Gestão. Afinal, apenas essa coerência entre discurso e prática pode fomentar a credibilidade dentre as pessoas, permitindo que cada um dedique seu potencial espontaneamente, imbuídas de um senso genuíno de realização e pertencimento.

Em contrapartida, o poder da mudança não está exclusivamente na organização em si ou em qualquer nível hierárquico – ele reside em cada indivíduo, fortalecido por sua voz interna, e que, a partir de suas zonas de influência, estabelece relações de confiança e desenvolvimento mútuo.

 

Novos patamares

A definição de uma boa estratégia, por si só, não garante que ela será alcançada. É preciso disseminar de maneira clara quais os principais objetivos da organização e suas maiores prioridades, e assim fortalecê-la, discutindo o papel de cada um nesse processo. Sem engajamento, não há comprometimento – daí a importância das relações de confiança e a identificação com esses propósitos.

Citada no livro “0 8º hábito”, uma pesquisa do grupo Harris com mais de 23.000 americanos com empregos em tempo integral indicou que eles dedicavam apenas 49% do seu tempo nas principais metas das empresas em que atuam – o restante era alocado em tarefas urgentes, porém menos importantes do ponto de vista estratégico.

 

Com base nessa pesquisa, Covey fez uma analogia impactante da organização a um time de futebol em que apenas 4 dos 11 jogadores sabiam em qual lado do campo deveria marcar gol; apenas 2 realmente se importavam com isso; 2 conheciam a posição em que atuavam e o que deveriam fazer; e 9, em algum momento, competiam contra o próprio time sem sedar conta disso.

A partir daí, nós os convidamos às seguintes reflexões: seu time está engajado e atuando de forma produtiva? Esses colaboradores sabem a razão pela qual estão na empresa? Eles possuem as habilidades e recursos para atingir o que é esperado deles?

Um velho adágio diz que, durante uma construção, o encarregado da obra perguntou a três de seus colaboradores o que eles estavam fazendo. O primeiro disse estar empilhando tijolos; o segundo, que estava erguendo um muro; o terceiro, construindo uma catedral.

Que possamos usar os ensinamentos do 8º hábito para que todos ao nosso redor enxerguem a catedral.

 

 

Saiba mais em:

COVEY, Stephen R. (2005). O 8ºhábito – da eficácia à grandeza. São Paulo: Elsevier.

COVEY, Stephen R. (2017). Os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes – lições poderosas para a transformação pessoal. Rio de Janeiro: Best Seller.

PINK, Daniel. (2012). Motivação3.0 – os novos fatores motivacionais para a realização pessoal e profissional. Rio de Janeiro: Alta Books.

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Sobre flechas, mandalas e tapetes

Não faz muito tempo que presenciei algo bem interessante quando estava sentada numa praça de uma cidade do interior de São Paulo.

Eram três rapazes, entre 16 e 18 anos, que após comerem seus lanches, resolveram fazer bolas de papel com a embalagem e jogar basketball no cesto de lixo da praça.

O primeiro errou e disse: “Ah! Mas este cesto de lixo tem a boca pequena!”

O segundo acertou e celebrou com pulos de alegria.

E o último rapaz também não encestou e disse que tinha errado porque a bola era leve. Eu, sentada lá por perto, pensei no ditado árabe que um dia ouvira: “Quando o arqueiro erra o alvo, não deve culpar a flecha, mas sim, melhorar sua pontaria”.

Naquele momento eu vi a “bola flecha” e o “cesto flecha”!

 

 

Podemos e devemos continuamente melhorar nossa “pontaria” (performance / desempenho / entrega), concordam?

Podemos nos questionar sobre o que fazemos e como fazemos o que fazemos, e pensar em como melhorar, através de várias ações como estudos, pesquisas, leituras, conversas…

Dar sempre o melhor de nós é algo muito importante, assim como fazer tudo com o coração, tendo em mente que pessoas que sabem mais ou menos do que nós também existem, nos dando a chance de aprender e ensinar.

No livro “Mandalas 0 formas que representam a harmonia do cosmos e a energia divina”, de Rüdiger Dahlke, há uma linda reflexão sobre a perfeição.

Dr. Dahlke, um médico, nos ensina que é tradição entre os índios inserir intencionalmente pequenas falhas nas suas mandalas, já que a perfeição só cabe a Deus.

Segundo ele, as tapeceiras turcas também têm a “falha intencional”, como ele as chama, em suas peças, pela mesma razão.

Dr. Dahlke ainda nos ensina que “uma “falha” é algo que falta e, assim, os índios e os turcos são mais fiéis à significação original; com o seu gesto, mostram que falta

algo às suas criações, pois a perfeição eles só veem em Deus.

Grande exercício de humildade!

Talvez, em nossos meios tão competitivos, essa “falha intencional” seja algo impensável ou inadmissível/descabido.

Bem, fica aqui um convite à reflexão sobre a perfeição, que começou com arqueiros e acabou com índios, tapeceiras e humildade.

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Os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes – baseado no livro homônimo de Stephen Covey

“Plante um pensamento, colha uma ação; plante uma ação, colha um hábito; plante um hábito e colha um caráter; plante um caráter e colha um destino.” – Stephen R. Covey

Vamos falar sobre o conteúdo do livro “Os7 Hábitos das pessoas altamente eficazes”, e sempre gosto de começar com uma provocação: você se considera uma pessoa altamente eficaz?

‍No livro, Stephen Covey aborda como tema central a mudança de comportamento e nos ensina a fazer estas mudanças de dentro para fora. E para isto não existem atalhos. Ele enfatiza que os hábitos indicam quem você é e o seu nível de eficácia ou ineficácia.

‍Stephen Covey baseou seus fundamentos para a eficácia e para o sucesso na ética do caráter, que se compõe de atributos como: integridade, humildade, fidelidade, temperança, coragem, justiça, paciência, diligência, simplicidade, modéstia e a regra de ouro – fazer aos outros o que desejamos o que nos façam. É importante que as pessoas aprendam a integrar estes princípios a seu caráter básico.

‍Covey coloca que após a 2ª Guerra Mundial a visão de sucesso deslocou-se da ética do caráter para a ética da personalidade, que enfatiza o crescimento da personalidade, treinamento em práticas de comunicação e educação na área de influências estratégicas e pensamento positivo – e que tais atributos são secundários para a Ética do Caráter. O que somos é mais forte do que o que dizemos ou fazemos.

‍Para compreender os 7 hábitos, é importante também entender o conceito de paradigma, conhecendo seus próprios e aprendendo a fazer mudanças. Um paradigma é a maneira como percebemos, compreendemos e interpretamos o mundo a nossa volta; cada um percebe a realidade de acordo com suas “lentes” (princípios e valores), isto é, de forma subjetiva.

‍Para sermos eficazes, necessitamos uma mudança nos paradigmas que não nos levam à realização de objetivos. Quebras de paradigmas são mudanças quantificáveis, mesmo que lentas e deliberadas ou instantâneas.

‍Outro conceito importante, o hábito, é a interseção entre conhecimento, habilidade e desejo. O conhecimento é o que fazer e por que fazer; a habilidade é o como; e o desejo, por sua vez, motivação, querer fazer. Para que possamos transformar algo em hábito, precisamos reunir estes três elementos.

‍Por meio deles, movemos numa espiral ascendente – a mudança ser/ver; a pessoa altera o ver, que, por sua vez, muda o ser, e assim por diante.

‍São os hábitos que influenciam diretamente as ações da sua vida e estes são advindos dos seus paradigmas. Portanto, se você quer transformar sua postura diante da vida, deve tornar consciente seus próprios princípios e valores, entender e mudar os paradigmas e, consequentemente, seus hábitos.

‍Os 7 hábitos são uma abordagem integrada que passa da dependência – alguém cuida de mim –, para a independência – eu cuido de mim mesma – e, então, para a interdependência – podemos fazer algo melhor juntos. Covey batizou de continuum da maturidade.

‍O autor apresenta ainda o conceito de eficácia por meio do princípio do equilíbrio P/CP, da necessidade de equilíbrio entre P (produção) e CP (capacidade de produzir), através da fábula de Esopo:

“Um fazendeiro pobre descobre um ovo de ouro no ninho da sua galinha. Ele não conseguia acreditar na tamanha sorte que teve. E cada dia que passa, aparecia um novo ovo de ouro, tornando-o milionário. Mas ao passar do tempo, o fazendeiro ficou impaciente e decidiu matar a galinha para obter todos os ovos de uma vez, sem ter que esperar um dia após o outro. Mas, ao abrir a galinha, ele vê que não tem nenhum ovo de ouro dentro do corpo.”

Muitos acreditam que ser eficiente é tirar todos os ovos da galinha muito rapidamente. Porém, é contar com os ovos e cuidar da galinha que os produz.

‍O livro, portanto, contém todos os princípios fundamentais da eficácia humana: sete hábitos básicos e primordiais que representam a interiorização dos princípios corretos, nos quais estão baseados o sucesso e a felicidade duradoura.

‍Os três primeiros hábitos tratam da independência – a essência do crescimento do caráter. Os hábitos 4, 5 e 6 tratam da interdependência – trabalho em equipe, cooperação e comunicação. O hábito 7 é o hábito da renovação.

Vitória Particular – Independência

 

Hábito 1 – Seja Proativo

É o hábito da escolha. É a habilidade de agir antes que algo venha a acontecer; ser proativo é apoderar-se da responsabilidade de sua própria vida, é exercer a capacidade de selecionar sua resposta frente a qualquer estímulo.

‍Covey afirma que entre o estímulo e a resposta há um espaço que proporciona a liberdade de escolher qual resposta é mais adequada para aquele estímulo. As pessoas proativas escolhem suas respostas baseando-se em princípios, valores e nos resultados desejados.

‍Pessoas reativas, ao contrário, deixam circunstâncias, condições ou o ambiente mostrarem a ela como responder; elas vivem à mercê dos acontecimentos externos. Não é, portanto, o que nos acontece, mas sim nossa resposta que diferencia esses dois comportamentos.

‍Aqui há uma ênfase sobre pensarmos de dentro para fora, assumindo a responsabilidade por nossas atitudes e por quem somos.


O autor afirma que, quando somos proativos potencializamos nosso “círculo de influência”, expandimos nosso conhecimento e experiência, e construímos confiabilidade.

‍Quando concentramos em questões que não podemos controlar, temos menos tempo e energia para aplicar em questões sobre as quais não podemos influenciar, isto é, entramos no círculo de preocupação. Assim, devemos focar nossa proatividade no “Círculo de Influência”, pois é nele que podemos fazer algo que modifique substancialmente nossas vidas.

Hábito 2 – Comece com um objetivo em mente‍

É o hábito da visão. Sempre visualize o objetivo final. A criação mental precede a criação física.

‍Covey sugere iniciarmos cada dia com um entendimento claro de nossos objetivos e sonhos. Segundo ele, todas as coisas são criadas duas vezes: uma vez quando refletimos sobre ela e a outra quando a colocamos em prática.

‍Muitas pessoas fazem curso superior ou entram em determinado emprego sem saber onde querem chegar e, dessa forma, veem o tempo passar. Pare por um instante e coloque num papel ou na computador / celular qual o seu objetivo. Crie sua declaração de missão pessoal.

Hábito 3 – Primeiro o mais importante

É o hábito do gerenciamento pessoal e requer que estejamos praticando os hábitos 1 e 2. Ele nos leva ao controle de nosso tempo. Para que possamos ser realmente efetivos, devemos organizar nosso tempo ao redor de nossas prioridades.

‍Neste mundo líquido, em que tudo passa rapidamente, esquecemos de fazer o que é realmente importante. Nesse sentido, o autor faz a seguinte classificação: urgente e importante, urgente e não importante, importante e não urgente, não importante e não urgente.

Matriz de Administração do Tempo

Urgente significa que requer nossa atenção imediata, e importante são atividades que nos levam aos resultados que contribuem para nossa missão, objetivos e valores. Pessoas proativas e eficazes investem a maior parte do seu tempo no quadrante importante/não urgente.

‍O autor também nos ensina a fazer a conta bancária emocional (CBE), que é uma metáfora para a quantidade de confiança que existe em um relacionamento: os depósitos constroem e recuperam a confiança em um relacionamento; já as retiradas destroem-na e a retiram:

 

 

Vitória Pública – Interdependência

 

Hábito 4 – Pense no ganha-ganha

É o hábito do benefício mútuo e está baseado no princípio pelo qual a vitória de uma pessoa não é necessariamente a derrota da outra. Todos podem se beneficiar.

‍O princípio ganha-ganha abrange cinco dimensões interdependentes da vida: caráter, relacionamentos, acordos, sistemas e processos. O caráter envolve características de integridade; maturidade, que é o equilíbrio entre a coragem de expressar seus sentimentos e a consideração pelos outros; e mentalidade de abundância, que diz haver o bastante para todos.

‍Segundo Covey, o contraponto da mentalidade de abundância é a mentalidade de escassez: pessoas que encaram a vida como uma fonte limitada e encontram muitas dificuldades em obter reconhecimento têm dificuldade em sentir prazer genuíno com o sucesso dos outros.

‍Para obter as melhores soluções ganha/ganha em qualquer tipo de relacionamento, ele sugere as seguintes etapas:

1. Qual o resultado desejado? Esclarecer expectativas é fundamental, além de entender o ponto de vista do outro e identificar as preocupações envolvidas;

2. Diretrizes – quais são as regras?

3. Recursos – com quais recursos eu posso contar (pessoas, financeiros, tecnológicos, dentre outros);

4. Acompanhamento – como será medido o desempenho?

5. Consequências – recompensas ou quais serão as implicações se não chegarmos aos resultados.

Hábito 5 – Procure primeiro compreender, depois ser compreendido

É o hábito da compreensão mútua, da comunicação efetiva – escutar com empatia para entender melhor o ponto de vista do outro. Vale rememorar que nossa visão sobre o mundo é uma realidade subjetiva. Assim, temos que entender a perspectiva do outro, para termos empatia e compreender melhor as pessoas.

‍Nas interações, muitas vezes, é necessário fazer perguntas para entender como os outros pensam; e mesmo que as ideias sejam muito diferentes, é importante respeitar a forma do outro, pois ele tem suas razões para pensar daquela forma. Não precisamos concordar com o outro, precisamos apenas compreender.

‍Pratique a escuta empática!

Hábito 6 – Crie sinergia

É o hábito da cooperação mútua. Sinergia significa que o todo é maior do que as partes, ou seja, juntos podemos ir mais longe.

‍O hábito implica na cooperação criativa e no trabalho em equipe; em pessoas com mentalidade ganha/ganha, com escuta empática e que aproveitam as diferenças para gerar soluções que antes não existiam.

‍Segundo Covey, para praticar a cooperação criativa e chegar à sinergia, é preciso: verificar sua disposição em encontrar a melhor solução; refletir sobre o ponto de vista do outro antes de expressar o seu; e, por fim, desenvolver ideias, chegando a uma terceira alternativa, que pode ser diferente da sua e daquela expressa pelo outro.

Hábito 7 – Afine o instrumento

É o hábito da renovação. Devemos fazer a manutenção de nossos instrumentos para que eles possam continuar funcionando adequadamente.

‍Covey propõe renovar as quatro dimensões: física, social/emocional, mental e espiritual, de forma equilibrada e sensata.

Dimensão física: dormir de acordo com a necessidade do corpo, comer alimentos adequados, praticar exercícios regularmente, descansar e relaxar;‍

Dimensão social/emocional: está vinculada aos relacionamentos. Para isto, mantenha sua conta bancária emocional (CBE) em dia, valorize as diferenças, crie sinergia, pratique a empatia, perdoe a si mesmo, construa bons relacionamentos familiares e sociais, e livre-se de sentimentos negativos e competitivos com relação a outras pessoas;

Dimensão mental: desenvolvimento permanente intelectual. Para isto, leia muito, dê continuidade a seus estudos, treine sua mente para distanciar-se e analisar seus próprios paradigmas;

Dimensão espiritual: é o seu comprometimento com o seu sistema de valores. Para tanto, crie ou reveja sua missão pessoal, leia algo que o inspire, assuma o compromisso de ser fiel a suas prioridades, ouça uma música que o faça sentir-se melhor, dedique-se a servir a comunidade.

‍O livro traz ensinamentos importantes para nos apoiarem mudanças de dentro para fora, refletir sobre nossas crenças e paradigmas e praticar as mudanças de acordo com os nossos objetivos de vida.

‍Verifique os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes e veja o quão importante são para que você possa ponderar suas crenças e modificá-las de acordo com os objetivos de sua vida.

‍Temos um potencial infinito, por que nos limitarmos?

“Se você deseja pequenas mudanças, trabalhe seus comportamentos; se você deseja mudanças realmente significativas, trabalhe seus paradigmas.” – Stephen R. Covey

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O futuro do trabalho

Vivemos uma era de rápidas e intensas transformações.

Os avanços tecnológicos provocaram mudanças profundas na sociedade e na forma de ser e de se relacionar dos seres humanos com um mundo cada vez mais veloz. Fomos convocados a olhar para uma série de adaptações que essas mudanças têm trazido. Por um lado, isso foi benéfico, do ponto de vista de inovação, conhecimento e de todas as facilidades das quais uma parte da população se beneficia; por outro, essas transformações ocasionaram uma série de sintomas emocionais e intensificaram desigualdades sociais construídas ao longo de muitas décadas.

O mito do empreendedorismo, já discutido desde os anos 80, anunciava o colapso da sociedade em pleno emprego assalariado, além de enfatizar a necessidade de uma revisão significativa na forma dos indivíduos se relacionarem com o trabalho. A previsão de um futuro abundante de atividades independentes, mobilidade e atuação em plataformas digitais promove reflexões contínuas acerca da flexibilidade versus burocracia, da liberdade e consciência para que cada escolha reflita na melhor forma de aproveitamento do tempo – conectado à essência e à motivação do indivíduo.

Nesta perspectiva, as vantagens de uma economia em que se valoriza o conhecimento e a mobilidade parecem diversas e bastante sedutoras. E em grande parte são, tanto para aqueles que têm a possibilidade de equilibrar o seu trabalho com as suas outras necessidades e ainda construir maiores rendimentos; como para as organizações que, ao invés de funcionários, passam a se relacionar com autônomos atentos às tendências da Revolução Digital e dispostos a gerar vantagens sem necessariamente estar presos a uma hierarquia empresarial.

Porém, na prática, não é bem assim que acontece. Pesquisas apontam que uma boa parte dos trabalhadores da base da Tecnologia tem abandonado essa ideia por falta de rendimento suficiente para arcar com todos os custos de um empreendedor individual que, além das despesas para manutenção do “negócio” – como alimentação, educação, saúde e segurança –, ainda tem de lucrar com suas atividades. Toda essa perspectiva digital aponta na verdade para uma época de grande especialização e para o desenvolvimento de habilidades cognitivas e socioemocionais bastante sofisticadas para atender com assertividade às demandas de um mercado em evolução. E, neste sentido, os empregos de nível médio tendem a desaparecer, sendo substituídos por robôs e inteligência artificial, produzindo mais e melhor com menor custo, ao mesmo tempo em que novos postos de trabalho irão surgir. Nenhuma novidade aqui, certo? Pesquisas apontam que haverá uma supressão de até 75 milhões de postos de trabalho contra uma estimativa de 58 milhões de novos empregos até 2025, mas ainda nem sabemos como serão.

 

 

Estamos falando do surgimento de um novo perfil profissional com uma complexidade para entender e decifrar as mudanças comportamentais de uma época e que, por meio de inteligências múltiplas, cria produtos, inova modelos de negócios e agrega valor para o mundo. Por conseguinte, ganham a maior parte do rendimento. Sim, a revolução digital gera ainda mais competição e demanda habilidades, inclusive, comportamentais, muito robustas.

E como ficam os seres humanos diante de todo este cenário?

O autor Andrea Iorio, em seu livro “6 competências para surfar na transformação digital” compartilha um trecho de uma de suas entrevistas, com Kevin Systrom, na época CEO do Instagram:

“Estamos em uma fase pré-newtoniana: sabemos que elas funcionam, mas não sabemos como funcionam. (…) existem certas regras que a governam e temos que fazer da nossa prioridade entendê-las”.

Diante de tamanha instabilidade devemos nos prepararmos, identificando recursos internos e desenvolvendo novas formas e competências para nos adaptar a este cenário volátil, incerto, ambíguo e bem complexo. Portanto, esta revolução, antes de ser tecnológica, é sobretudo, um convite para uma nova atuação humana, capaz de responder com agilidade e assertividade às diferentes necessidades apresentadas.

Dentre os nossos desafios, temos a possibilidade de conexão com os nossos sentimentos para encontrar significado e, com isso, motivação para nos reinventar – desta forma acompanhando essas mudanças de maneira mais harmônica, leve e fluida.

Essa cultura da velocidade nos leva a agir no piloto automático; entramos em colapso e tivemos a oportunidade de desacelerar. Todavia, nem todos perceberam esse convite, uma possibilidade de existência mais conectada consigo e com o seu respectivo propósito de vida. É e ainda há tempo de se fazer diferente!

A experimentação real de nos esvaziarmos para entrar num estado de presença e fazer contato genuinamente com as nossas necessidades, que muitas vezes são diluídas em nosso cotidiano, e agir em congruência com os nossos valores é o grande desafio do ser humano e requer maturidade, autos suporte e fé na capacidade de autor realização. Somente assim poderemos preencher o nosso tempo com o que realmente importa fazendo escolhas conscientes que nos levem em direção ao crescimento e ao desenvolvimento. Atento ao que acontece conosco e com as circunstancias que nos envolve, temos a possibilidade de perceber o hoje com todas as suas infinitas possibilidades de existência.

A tecnologia não é ruim, pelo contrário: independente das discussões acerca da polarização do trabalho ou das transformações que reivindicam uma perspectiva digital, sabemos que estes avanços trouxeram diversas possibilidades, como ouso dos dados gerando produtividade, aceleração da economia e avanços científicos importantes. Por isso, tenha em mente que não existe um fator responsável por todas as dificuldades, mas a ausência de uma estrutura que sustente, com condições mínimas, o indivíduo neste caminhar.

Você tem parado para refletir ou investir de forma significativa em si mesmo?

Este é nosso convite!

Vamos juntos?

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Liderança Transformativa

“A consciência da complexidade nos faz compreender que não poderemos escapar jamais da incerteza e que jamais poderemos ter um saber total.” Edgar Morin

Durante minhas experiências de quase vinte anos como professora de cursos de Pós e MBA, líder, empresária e facilitadora de programas de desenvolvimento, sempre me instigaram a pensar quais os principais desafios desse “lu­gar”, o da liderança. Sob uma perspectiva am­pla, somos líderes não somente de negócios: podemos escolher papeis de liderança que assumimos ou não em nossas vidas. Como então nos conduzir em um estilo que seja capaz de gerar impactos positivos, promovendo contextos emocionalmente seguros para proporcionar desenvolvimento contínuo e para que se possa colher bons frutos?

Capa da revista Exame de fevereiro de 2020, uma reportagem chama muito a atenção: Bur­nout: o esgotamento pelo trabalho é o tema de gestão de pessoas mais quente de 2020.

 

 

Excessos têm trazido perdas econômicas e sociais, e não podem mais ser ignorados. Dados apontam que 72% da população brasileira tem alguma sequela de estresse e que, destes, 30% sofrem de Burnout – índices altíssimos, que podem impactar significativamente não apenas a economia, mas o desenvolvimento do potencial humano.

Ao prefaciar o livro “Segunda Simplicidade”, de Luciano Meira, menciono o quanto faz sentido o que ele escreveu sobre a ideia de migrar as áreas de T&D ou mesmo as universidades corporativas para a criação de Escolas do Florescimento Integral do Potencial Humano. Até o momento, a percepção é de que temos nos orientado para desenvolver as competências necessárias apenas para o atingimento de resultados. Luciano destaca que, se continuarmos trabalhando em prol daquilo que é menos importante, não alcançaremos um equilíbrio ou a plenitude desse potencial, seja ele em relação às pessoas ou aos próprios resultados. Afinal, se as pessoas atingirem o máximo do seu potencial, terão muito mais condições de promover e sustentar excelência nos resultados. Para mim, não há outro caminho.

Dessa forma, a Liderança Transformativa® nasce para ser a perspectiva que leva em consideração o indivíduo, atuando no máximo do potencial possível para aquele momento, sem perder de vista que a arte da vida está em “afinar o instrumento” todos os dias, com a perspectiva da evolução contínua. O alerta para o que temos visto atualmente é que o elástico está tão esticado que estamos colapsando. Muita gente certa no lugar errado; muita gente inconsciente em lugares de poder, em que decisões são tomadas inadvertidamente.

Li diversas teorias e posso dizer que a maioria delas sempre fez sentido para mim. Mas a partir daí, tive uma inquietação: como essas teorias se articulam e como posso conectá-las para construir uma perspectiva que ajude líderes a encontrar um lugar de equilíbrio, leveza e autor responsabilidade, considerando toda a complexidade que as ações de liderança trazem? Estas perguntas me “perturbaram” por mais de cinco anos e somente agora, talvez, eu tenha iniciado um pensamento que facilite o meu entendimento sobre essas questões.

Ao citar o que chamo de “teoria” da Liderança Transformativa®, não tenho a pretensão de trazer nada novo, mas sim, a partir de várias referências, pesquisas e autores, estruturar uma maneira de pensar que tem me ajudado nessa tão buscada compreensão. Meu objetivo é trazer uma proposição para um tema que tem se tornado cada vez mais importante e relevante: como influenciar pessoas e sistemas de maneira que se possa tomar decisões sustentáveis e que sejam capazes de promover evolução.

 

Uma primeira reflexão que trago é sobre a complexidade que o ato de liderar-nos apresenta. A teoria da complexidade, tal como propõe Edgar Morin, nos ajuda a pensar sobre isso. Complexidade vem do latim complexus, aquilo que é tecido em conjunto; é o tecido formado por diferentes fios que se transformam em uma só coisa. Morin considera que, por vezes, ficamos restritos a pensamentos multifacetados, nos quais levamos apenas um aspecto em consideração e que incertezas e contradições fazem parte da condição humana. Ele cita: a aspiração à complexidade tende para o conhecimento multidimensional. Ela não quer dar todas as informações sobre um fenômeno estudado, mas respeitar suas diversas dimensões. O pensamento complexo não compartimentaliza, mas une conhecimentos separados, pois há risco de decisões erradas ou ilusórias quando os pensamentos são mutilados. A lógica deveria nos servir de muletas, nunca de pernas, explica Morin. O autor ainda nos ajuda a compreender que um sistema é mais e menos do que aquilo que poderíamos chamar de soma de suas partes: menos quando existem coações que inibem as potencialidades das partes, e mais quando se é possível observar o todo organizado como sendo alguma coisa maior que a soma das partes, porque faz surgir qualidades que não existiam nessa organização.

Uma das citações de Morin trouxe uma das melhores bases para a construção da minha perspectiva. Ele cita Pascal: “Só posso compreender um todo se conheço, especificamente, aspartes, mas só posso compreender as partes se conhecer o todo”. O primeiro pressuposto que trago é sobre a importância de, em tomadas de decisão, considerar integrar e energizar todas as partes envolvidas. E uma reflexão importante é: quais os desafios encontrados para que todas as partes sejam energizadas.

A teoria Integral é um resultado exaustivo de pesquisa intercultural, ao longo de centenas de culturas pré-modernas, modernas e pós-modernas e os vários mapas da consciência e cultura humana que elas oferecem. Wilber cita que, dessas pesquisas, surge um “Mapa Abrangente” da composição humana, partindo por colocar juntos todos os mapas conhecidos na mesa e, então, usar cada um para preencher qualquer lacuna que houver nos outros, resultando num mapa abrangente e genuinamente inclusivo das dimensões básicas, níveis e linhas que são os principais potenciais de todos os seres humanos. Vale a pena estudar as ideias de Wilber que, em minha opinião, tem sido um dos mais importantes pesquisadores de vanguarda. Trata-sede uma teoria que considera toda a complexidade existente, juntando-as em uma perspectiva de inclusão.

Laloux traz essa tese para as organizações e apresenta sua pesquisa, considerando empresas que sejam capazes de operar na etapa Integral (Teal). Ao final, Wilber cita que “uma das grandes descobertas da obra de Laloux é que hierarquias de atualização podem florescer quando as hierarquias dominantes são removidas. Uma companhia de 500 indivíduos possui não só um, mas 500 CEOs, entre os quais qualquer um pode ter uma ideia inovadora e ser capaz de implementá-la, uma verdadeira jogada de auto gestão que é uma das principais razões para o surpreendente sucesso de tantas dessas organizações. Cabe conectar essa pesquisa com o exercício de uma liderança mais inclusiva, que considere as várias perspectivas e que tem no desenvolvimento da autonomia um aliado para sustentar boas práticas e boas decisões.

Mas, no que se configura essa “filosofia de liderança”?

 

 

Trata-se de uma atuação que exige duas condições essenciais: o líder deve ter um nível de maturidade e capacidade de se relacionar com situações de incerteza e vulnerabilidade, considerando que precisará fazer a gestão de todos os envolvidos nesse campo para que exista uma conexão para a cocriação de novas formas, engajando pessoas em propósitos maiores. Assim, temos o cerne dessa teoria: liderar é tomar decisões o tempo todo, e a qualidade dessas decisões pode promover uma involução, levando até ao desaparecimento de um sistema; pode manter o status quo até o momento em que decisões mais radicais sejam requeridas; ou pode mobilizar decisões que mantenham um sentido e engajamento, mesmo para quando algo precise se desordenar para se reordenar em uma forma mais produtiva. E o grande desafio? Se vivemos em sistemas complexos em que muitas decisões precisam ser assimiladas, estando em consenso e alinhamento para direcionaras intenções em realizações, a maneira com que um líder toma decisões será fundamental.

Eu os convido a refletir:

1) Como seria uma decisão tomada por um líder que considera somente seus próprios interesses, não tendo muita empatia sobre como as pessoas se sentirão com aquela decisão e se será a melhor escolha para aquele contexto;

2) De uma outra maneira, um líder que toma decisões procurando se integrar às necessidades do contexto e das pessoas, mas não considera se aquilo que decidiu lhe trará tranquilidade, intimamente falando. Há casos de lideranças que sacrificam a vida pessoal; outros, mesmo sem ter total consciência disso, passam por cima de seus valores;

3) Uma decisão em que se leve apenas em consideração o que é bom para um contexto que pode ser representado por uma empresa, sem que se dialogue e inclua a percepção das pessoas; dentre outras maneiras de decidir que não levam em consideração o diálogo e a percepção de todas as perspectivas.

Mesmo que não seja possível atender às demandas das diversas partes, é importante trazer o sentido de inclusão e ter a oportunidade de dar contexto às decisões. É claro que esse tipo de atitude dá trabalho, requer mais tempo focado na interação e na comunicação; por outro lado, promove o pensamento crítico e criativo, cria senso de pertencimento e ajuda no desenvolvimento da maturidade e autonomia das pessoas.

Para “transitar” bem por essa maneira de liderar, é preciso desenvolver algumas competências que são divididas na teoria, da seguinte maneira:

C1: É onde tudo se inicia, na compreensão de si. Trata do desenvolvimento da inteligência intrapessoal que traz em seu bojo, de acordo com Goleman, três habilidades – autoconhecimento, automotivação e autocontrole. Aqui, estimula-se o diálogo interno e a busca de estímulos para se ter a melhor compreensão possível de si. Grande parte dos autores de vanguarda enfatizam que a chave de uma boa liderança está no autoconhecimento;

C2: Após a compreensão de si, é possível desenvolver uma integridade e uma maturidade que facilitam a compreensão dos outros. São desenvolvidas habilidades da inteligência interpessoal, com foco na empatia e sociabilidade,e ênfase para a questão da compreensão versus julgamento;

C3: Este é o espaço de entendimento de como os níveis de consciência,ao longo da história, nos atravessam; de como a cultura, a linguagem, a evolução do nosso cérebro nos condicionam para alguns comportamentos. É a compreensão dos contextos em que estamos inseridos, desde o micro ao macro;

C4: Aqui está a ação da liderança transformativa, por isso o nome: trans.for.ma.ti.vo – adj (transformar+ivo) Que pode transformar. Que tem o poder de converter uma coisa em outra.(http://michaelis.uol.com.br).

É no C4 que podemos perceber se a qualidade das ações é construtiva ou destrutiva, e qual a importância da ética e da integridade para que se chegue ao ponto principal da te­oria, o ponto T;

Ponto T: É o ponto de transformação, que parte da conexão entre C1, C2, C3e C4, marcando um ponto de aprendizagem e transcendência;

C1, C2 e C3 – compreensão; C4 – ação.

 

O prisma da LIDERANÇA TRANSFORMATIVA®

 

No exato espaço de encontro do equilíbrio entre C1, C2 e C3 está posicionado o C4, responsável pela conexão e pela cocriação de sentido, sendo este o responsável por transformar a figura do triângulo em um prisma, ganhando a forma tridimensional. O ponto projetado para cima e representado pela letra “T”, de Transformação, marca o ponto de aprendizagem, a partir do qual já não somos mais quem éramos antes. Portanto, transcendemos para um novo momento, um novo ser, um novo relacionar, um novo liderar e incluímos o que foi aprendido em um fluxo contínuo e ascendente.

 

 

Para finalizar, o líder transformativo é aquele capaz de, com consciência do poder que suas decisões traz, promover o pensamento crítico e criativo por meio do diálogo, engajar as pessoas em propósitos superiores, fazendo a roda girar comum “motor” tão potente que é capaz de gerar saltos de consciência que transformam contextos.

 

 

Referências

COLLINS,J. Empresas feitas para vencer: por que algumas empresas alcançam a excelência…e outras não. Rio de Janeiro: Alta Books, 2020.

DIAMANDIS,P. H., KOTLER, S. Abundância: o futuro é melhor do que você imagina. Rio de Janeiro: Alta Books, 2018.

GOLEMAN,D. Inteligência emocional. São Paulo: Objetiva, 1996.

LALOUX,F. Reinventando as organizações: um guia para criar organizações inspiradas no próximo estágio da consciência humana. Minas Gerais: Editora Voo, 2017.

MCCORD,P. Powerful: como construir uma cultura empresarial de liberdade e de responsabilidade para responder aos desafios da gestão de talentos. Sabedoria Alternativa Edições,2000.

MEIRA,L. A. A segunda simplicidade: bem-estar e produtividade na era da sabedoria. Goiânia: Editora Caminhos.

MORIN,E. Introdução ao pensamento complexo. Porto Alegre: Editora Sulina, 2015.

MORIN,E., ALEXANDRE, M. Ciência com consciência. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,1993.

Revista Exame, edição 1203, de 20 de fevereiro de 2020. Burnout: o esgotamento pelo trabalho é o tema de gestão de pessoas mais quente de 2020. Os excessos trazem perdas econômicas e sociais – e não podem mais ser ignoradas. São Paulo: Editora Abril, 2020.

SCHARMER,O. Teoria U: como liderar pela percepção e realização do futuro emergente. Rio de Janeiro: Alta Books, 2019.

Diversos autores. Mapeando Diálogos: ferramentas essenciais para a mudança social.

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Reestruturando diálogos, aperfeiçoando relacionamentos

Nós não nos consideramos pessoas violentas, porque a violência é quase sempre associada a manifestações físicas, como brigas e guerras. Porém, nossa real violência é demonstrada de formas mais sutis – e contundentes: as palavras. Ao descuidar da comunicação, alimentamos emoções negativas em pessoas que, ao longo de sua jornada, não foram preparadas nem estimuladas para entender e, principalmente, externar sentimentos. E, assim, erguemos barreiras que nos tornam incompreensíveis e irreconciliáveis – em relação ao outro e a nós mesmos.

 

 

Por que é tão difícil discordar sem brigar? No livro que consolida seu trabalho de pesquisa e prática, “Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais”, Marshall B. Rosenberg observa que:

“Nosso repertório de palavras para rotular os outros costuma ser maior do que o vocabulário que temos para descrever claramente nossos estados emocionais.” (p. 73)

Durante toda nossa trajetória escolar e, muitas vezes se estendendo à fase adulta, a educação sentimental é um tema que nos permanece alheio, espécie de tabu. Duvida? Com que frequência as pessoas perguntam como você está se sentindo? Estagnamos no automático e desinteressado “Tudo bem, e você?”– mas mesmo aqui a pergunta se limita ao estado atual, não a sentimentos. E pior: os estímulos sobre sentimentos costumam vir na direção contrária: “meninos não choram”, “você já está grandinho(a) para isso” e coisas do tipo. Somos criados para esconder e mascarar sentimentos, sendo essa falsa habilidade vista como sinônimo de força de caráter e equilíbrio.

Essa desconexão entre o que acontece em nosso interior e os paradigmas sociais de estabilidade e autocontrole, com o tempo, fragilizam os laços que nos unem a nós mesmos e às pessoas com quem nos relacionamos, seja pessoal ou profissionalmente. Não acostumados a discutir sentimentos, levamos as discussões a planos irreconciliáveis, julgamos e atacamos, pois não sabemos outra forma de expressar nossas reais necessidades. E somente à distância, quando sozinhos e recolhidos, parece termos o direito de externá-los. Lembram-se da música d’Os Paralamas do Sucesso:

“Quando tá escuro e ninguém te ouve,
Quando chega a noite e você pode chorar (…)” (Lanterna dos afogados, 1989)

 

Emoção ou sentimento?

Há certa confusão entre os termos “emoção” e “sentimento”. Na definição de António Damásio, renomado neurocientista português, emoções são reações químicas e biológicas de nosso corpo, desencadeadas de forma involuntária e, portanto, incontroláveis; já os sentimentos são a experiência mental que temos daquilo que se passa no corpo, desencadeados por um processo intelectual, inato ao ser humano. Enquanto as emoções podem ser observadas (ao menos em parte), seja através do microscópio, medições cerebrais, expressões e movimentos, o sentimento é algo inobservável: nenhuma pessoa senão nós mesmos consegue dizer quais sentimentos foram formulados mediante um acontecimento.

As emoções representam reações a estímulos do ambiente. Entretanto, pessoas diferentes podem ter emoções distintas perante um mesmo evento. Isso ocorre porque a sua ativação está condicionada a outros fatores complexos, como experiência de vida e crenças. Por exemplo: durante uma ponte aérea entre os aeroportos de Congonhas (SP) e Santos Dumont (RJ), e ao se aproximar do momento de pouso em um dia de chuva forte e neblina, um passageiro é acometido pelo medo; logo em seguida, é ajudado por uma pessoa da equipe de comissários de bordo que, já acostumada a pousos com mau tempo, tenta acalmá-lo. Por outro lado, eu posso estar sentindo uma tristeza profunda e, no entanto, esboçar uma expressão alegre no rosto, interagindo socialmente de forma a esconder esse sentimento; algumas pessoas poderão supor minha tristeza, mas não terão certeza dela. Emoções são breves e passageiras; sentimentos podem se estender por uma vida.

A grande fornalha

No prefácio do livro, Arun Gandhi compartilha um episódio de sua infância em que seu avô o ensina a construir uma espécie de árvore genealógica da violência: ao fim do dia, os dois discutiam todos os episódios ocorridos e as experiências do garoto sobre eles, e os classificavam nessa árvore sob os galhos de “física” (manifestações de violência em que houvesse emprego de força física) ou “passiva” (quando a violência estivesse associada a questões emocionais). Com o tempo, Arun percebeu que o lado da passiva se expandia rapidamente.

Este exercício, que podemos repetir em nossa rotina, demonstra que, na maior parte do tempo, as ações violentas se ocultam atrás de palavras, não necessariamente de ações, e que nossa inaptidão para lidar com e expressar sentimentos acaba cavando abismos de entendimento e colaboração entre as pessoas. Enquanto não soubermos pacificar esse galho, não conseguiremos ressignificar no outro seus comportamentos para que não haja violência física.

A Comunicação não-violenta (doravante apenas “CNV”) nasceu de um questionamento aparentemente simples, mas profundo: por que algumas pessoas conseguem se manter compassivas em situações de extrema adversidade, ao passo que outras se portam de forma agressiva? Consiste, portanto, em uma técnica para nos auxiliar a formular, de maneira clara, o que de fato desejamos, abrindo espaço para um diálogo em que temos a oportunidade de nos expressar com honestidade e transparência, ao mesmo tempo em que oferecemos ao outro a mesma abertura de forma empática.

A CNV é fruto de um extenso trabalho de pesquisa: Rosenberg viajou o mundo e conheceu diversas culturas, estudando as conexões que as pessoas estabeleciam entre si. Segundo ele, as conversas carregam duas possibilidades: a primeira é um jogo do tipo “quem está certo e quem está errado”; a segunda representa a predisposição de “fazer do mundo um lugar melhor”. Assim, e através da CNV, nós podemos criar interações em que as pessoas buscam naturalmente contribuir com o bem-estar do outro, gerando benefícios recíprocos. É uma forma de relação que:

– não se baseia em pré-julgamentos, críticas ou rótulos;

– não é utilizada como caminho para se esquivar de responsabilidades, culpando o outro; e

– não se fortalece por meio de ameaças e certezas sobre quem deve ser punido ou recompensado

Este modelo nos ensina a estar presente no momento e a nos conectar com valores e necessidades profundas – as verdadeiras razões que movem as palavras e o comportamento das pessoas. Por meio dela, nós aprendemos a falar a verdade e a compartilhar nossa perspectiva de uma forma que conduz à harmonia, não ao conflito – inclusive em situações desconfortáveis e complexas, que envolvem variações emocionais intensas ou assuntos delicados. Dessa forma, podemos nos posicionar de uma maneira menos defensiva e mais compassiva.

 

Colocando em prática

Assim como ocorre nos esportes ou com qualquer outra competência, a habilidade da CNV requer treino, a partir de pequenos hábitos, repetidos e aperfeiçoados ao longo dos dias. Isso significa que com a constância dessa prática, começaremos a associá-la como resposta padrão para as situações do dia a dia.

O primeiro passo é o autoconhecimento. Precisamos conhecer nossas emoções e as interpretações que fazemos delas. Afinal, é justamente nos momentos de oscilação emocional que tendemos a agir e responder mais instintivamente, piorando, em vez de resolver, conflitos e situações difíceis.

 

 

Reserve cinco minutos do seu dia, de preferência logo ao acordar, para refletir sobre cenários desafiadores com os quais você lidou no dia anterior. Relembre os principais pontos dessa ocasião e anote em uma tabela (vamos chamá-la de “Tabela da Empatia”).

Cada pensamento está associado a um evento, uma observação que tem relação com a situação vivenciada. Logo, descreva este evento de maneira autêntica – posteriormente, e a partir de um diálogo baseado nas técnicas da CNV, você pode até descobrir que ele está sendo considerado sob uma perspectiva única e/ou enviesada, mas é importante descrevê-lo da forma como foi ou continua sendo percebido:

Então, indique qual foi o sentimento que ele despertou em você (a lista de sentimentos disponibilizada no Anexo I pode ajudá-lo(a) nesta etapa):

Em seguida, tente entender quais foram seus pensamentos a respeito desse sentimento – e aqui permita-se deixar quaisquer filtros de lado e expressar de forma genuína, eventualmente através de termos fortes, os pensamentos que se formaram em sua mente naquele momento:

A partir da constatação desse evento, tente refletir sobre qual sua real necessidade a respeito dele. O que precisaria acontecer para que o sentimento identificado inicialmente desaparecesse? Nesta etapa, é importante olhar para dentro de si e entender qual é a sua necessidade, sem projetar ações para o outro:

Por fim, e de forma compassiva, formule um pedido capaz de satisfazer essa necessidade. Note que ele deve ser concreto e específico, pois solicitações genéricas tendem a trazer ambiguidade e resultados insatisfatórios:

A criação e utilização desta tabela vai, com o tempo, se tornar mais fácil, na medida em que você adquire maior consciência sobre suas emoções e os sentimentos que lhes seguem. Pratique esses pedidos para que eles despertem uma nova perspectiva na forma como você se comunica atualmente.

 

Componentes da CNV e etapas de transformação

O modelo da CNV parte da integração de alguns componentes principais:

Percepção: conjunto de princípios e perspectivas que apoiam uma existência compassiva, colaborativa, mas ao mesmo tempo plena de coragem e autenticidade em nossa relação conosco mesmo e com o meio em que estamos interagindo;

Linguagem: o entendimento de como as palavras, pronunciadas e ouvidas, podem contribuir para criar tanto conexões quanto para nos distanciar uns dos outros, além de apoiar ou ferir;

Comunicação: saber pedir aquilo de que realmente necessitamos, sem impor ameaças e sem qualquer forma de coerção; ouvir o outros em absorver ou externar críticas e culpa, ainda que não concordemos com seu ponto de vista; aprender a conduzir nossa fala de modo a buscar o benefício recíproco de todas as partes envolvidas; e

Influência: compartilhar o poder em vez de usá-lo sobre o outro, a fim de facilitar um ambiente em que todos possam se sentir igualmente valorizados, respeitados, honrados e seguros.


 

Todo modelo de comunicação possui ao menos duas partes: emissor e receptor. Na CNV, elas são chamadas de “honestidade” e “empatia”, e o processo todo ocorre em quatro etapas:

1. Observar sem julgar: como nossas observações e as dos outros constroem os fundamentos sobre o que estamos conversando. Nesta etapa inicial devemos eliminar quaisquer tipos de julgamentos, críticas ou opiniões que possam surgir um uma determinada interação. O importante é encarar a situação de forma neutra, ouvindo com interesse genuíno o que o outro tem a dizer, a fim de compreender o contexto de seu ponto de vista. O objetivo é fazer com que a relação seja transformada, não encerrada;

2. Expressão dos sentimentos: o corpo e a mente reagem quando nossos valores e necessidades estão ou não sendo atendidos. Por isso, é fundamental entender, reconhecer e expressar os sentimentos, pois eles oferecem um ponto de conexão muito forte que nos ajuda a compreender a experiência do outro e a comunicar nossa própria;

3. Declaração das necessidades: são nossos motivadores, as razões profundas pelas quais estamos nos comunicando. Quando declaradas, elas permitem ao outro um olhar mais humano e a construção de conversas equilibradas e empáticas, que trazem proximidade, reconciliação e que constituem a base para soluções do tipo ganha-ganha;

4. Pedido: é uma solicitação com base no que observamos, sentimos e necessitamos, feita de forma clara e objetiva e de uma maneira em que ela assume a entonação de um pedido, não de uma exigência –afinal, o outro sempre tem a possibilidade de escolha.

 

Retomando a Tabela da Empatia criada anteriormente e, embora esse processo possa ser utilizado inicialmente para que você “organize” seu eu interior, ele pode – e deve – ser expandido para seus diálogos com o outro, transformando-se assim na CNV e permitindo que você estabeleça conexões genuínas, harmoniosas e colaborativas. Para isso, construa uma história que concatene as colunas de sentimento, evento, necessidade e pedido montadas logo acima. Deixe de lado julgamentos, inferências e pensamentos – inclusive os que você listou na tabela –, a fim de potencializar essa conexão. A história deve seguir um enredo parecido com este:

Quando < EVENTO >, eu me senti < SENTIMENTO >, porque preciso de < NECESSIDADE >. Como poderíamos < PEDIDO > ?

Nesse processo, devemos evitar abordagens do tipo:

(…) eu me senti assim < SENTIMENTO > porque você (…)

pois esta fala culpa o seu interlocutor por aspectos que apenas você gerencia. Afinal ninguém pode despertar sentimentos em nós, sem a nossa permissão; e

Por que você não < PEDIDO > ? em vez de Como poderíamos ? <pedido> ?</pedido>

uma vez que o tom da primeira frase é impositivo e tende a acuar o interlocutor, enquanto a segunda convida para que ambos consigam chegar juntos à melhor solução possível.

Lembre-se também:

– de que há um momento certo para que esse diálogo ocorra, tanto para você, quanto para o outro. Desta forma, antes de iniciá-lo, certifique-se de que ambos estão de fato abertos para a troca ou quando seria um bom horário para isso;

– uma vez que estamos fazendo um pedido sincero e genuíno, devemos entender que a outra pessoa pode simplesmente não concordar com ele, nem se predispor a atendê-lo. A partir desta negativa, você pode escolher outras formas de atuar ou se relacionar – afinal, tudo são escolhas

O modelo da CNV pode ser empregado eficazmente para desenvolver, transformar e enriquecer interações familiares, corporativas, entre amigos e casais, bem como em processos ligados à educação e ao desenvolvimento de pessoas. Por meio dele, podemos contribuir para a criação de ambientes empáticos e solidários – para nós mesmos e àqueles que valorizamos.

 

 

Anexo I – Lista de referência: sentimentos

 

Saiba mais em:

 

Rosenberg, Marshall B. (2006). Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais. São Paulo: Editora Ágora.

NVC MarshallRosenberg. (2000). San Francisco workshop.

TEDx Allendale Columbia School: Maria Engels. (2019). “Nonviolent communication and self-awareness”.

TEDx UWCRCN: Sylwia Wlodarskw. (2017). “Non-violent communication: how to get your point across”.

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Originalidade versus a lógica no cotidiano

Passamos boa parte da vida estudando e resolvendo problemas repletos de certeza e fatos conhecidos. Porém, assim que colocamos o caderno de lado e começamos a tomar decisões no dia a dia, os cenários com que nos deparamos são qualquer coisa, menos previsíveis.

Eis um típico problema matemático: dois ônibus saem do mesmo terminal ao meio dia. Um parte sentido oeste a 50km/h, ao passo que o outro segue em direção leste a 65km/h. Em quanto tempo eles estarão distantes entre si 150 km?

Este é um problema essencialmente lógico: a equação compreende fatores sabidos e constantes. Basta aplicar a fórmula certas para resolvê-lo. É também o tipo de problema que pode ser automatizado, facilmente programado e delegado aos algoritmos – afinal, o poder de processamento e cálculo dos computadores é, há muito tempo, maior do que o nosso. Em contextos assim, limitados, em que ônibus milagrosamente viajam a velocidades constantes e não enfrentam percalços no trajeto, a máquina é imbatível.

Mas eis agora um problema diferente: preciso estar no aeroporto de Cumbica (GRU) para um voo que decola às 14h. A que hora devo sair de casa e qual a melhor alternativa a ser utilizada nesse trajeto?

Neste caso, já não há mais previsibilidade:

– pode chover, o que reduz a velocidade do trânsito e inviabiliza algumas rotas;

– ou acontecer um acidente na estrada;

– talvez eu não consiga um táxi pelo aplicativo no horário programado;

– um objeto no trilho pode forçar os trens do metrô a parar por tempo indeterminado; e assim por diante

Há inúmeros eventos que podem influenciar meu deslocamento, seja qual for o meio escolhido. Sem falar no custo e na comodidade: se a viagem leva duas semanas, deixar o carro no estacionamento do aeroporto pode sair caro demais, embora viajar de metrô com uma mala grande seja inconveniente.

Neste segundo cenário, e ao contrário do anterior, não há uma única resposta certa, mas sim uma série de possibilidades mais ou menos corretas, dentre as quais devo decidir. Não se trata, portanto, de um problema estritamente lógico, em que basta escolher a rota mais rápida, a exemplo do GPS, para encontrar a solução – esta, na verdade, passa por campos subjetivos,contextuais, até mesmo pessoais que extrapolam qualquer equação matemática. Além disso, conta com um alto nível de incerteza: uma decisão ruim pode conduzir a resultados catastróficos.

 

Em situações assim, nosso objetivo não se baliza por atingir o melhor resultado possível; mas evitar o pior – no exemplo, chegar ao aeroporto de forma razoavelmente rápida, cômoda, segura e, acima de tudo, a tempo de embarcar no voo reservado.

 

Racionais, mas nem sempre

Quando buscamos apenas respostas lógicas aos desafios do mundo, limitamos nossa linha de atuação. A abordagem puramente racional, científica, conduz a resultados efetivos, porém ortodoxos, de pouca originalidade – porque são resultados aos quais outras pessoas ou empresas poderiam chegar também, por meio de abordagens igualmente racionais e científicas.

É por esta razão que Rory Sutherland nos convida a um olhar mais ousado, que deixe de lado essas ponderações exclusivamente matemáticas, exatas,e traga em seu lugar uma postura inusitada, psicológica, mais criativa e aberta à subjetividade:

“(…) há centenas de soluções, aparentemente irracionais, para os problemas humanos simplesmente esperando para serem descobertas, se nos atrevermos a abandonar os padrões e a ingenuidade lógica na busca por respostas.” [1]

A maioria dos nossos problemas são assim, tornando nossa visão determinista algo um tanto inadequado. Sempre que tentarmos resolver situações com o pensamento lógico, estaremos nos limitando a uma análise incompleta, embora “racional”, de como as coisas funcionam e, por conseguinte, reduzindo a margem para adaptação e criatividade.

Vejamos um exemplo de “irracionalidade” eficaz que se tornou estudo de caso:

Em meados dos anos 1940, a Kraft criou um cereal chamado Shreddies e o disponibilizou nos mercados da Inglaterra, Canadá e Nova Zelândia. Durante muito tempo, ele foi líder de mercado. Até que suas vendas começaram a diminuir. Então, em 2008, a agência de publicidade Ogilvy & Mather Toronto foi contratada para desenhar uma nova proposta que fizesse com que o Shreddies retornasse ao topo – afinal, e conforme pesquisas identificaram na época, embora a participação de mercado estivesse decrescendo, os clientes ainda gostavam bastante do produto e estavam satisfeitos com sua qualidade.

Ao longo desse processo, e durante uma sessão de brainstorming, um estagiário de 26 anos chamado Hunter Sommerville fez um comentário sobre o produto, dizendo que ele não era quadrado, mas que tinha a forma de diamante. E o que poderia ter sido ignorado como uma mera brincadeira, tornou-se uma grande ideia e ponto de partida para a reconstrução do posicionamento de mercado do Shreddies – embasado, é claro, por uma forte e divertida campanha.

Foi aí que surgiu o Diamond Shreddies (Shreddies Diamante): exatamente o mesmo produto, com a mesma fórmula de fabricação, mas apenas uma proposta diferente. Seu sucesso foi quase imediato e alavancou as vendas do produto em 18,6% – além de transformá-lo em um grande case de publicidade. Posteriormente, a Kraft produziu até combos que combinavam os “dois formatos”do produto em uma única embalagem.

 

Há diversos outros cases sobre fatores pouco racionais que, no entanto, tornaram-se extremamente efetivos atendendo a necessidades não-declaradas e problemas mais psicológicos do que propriamente lógicos. Vamos explorar mais alguns:

– pense sobre as pastas de dente: porque várias delas têm listras, separando os ingredientes de limpeza comuns daqueles que dão a sensação de refrescância? Do ponto de vista estritamente lógico, isso não faria o menor sentido, já que os dois elementos imediatamente se misturam em nossa boca logo nos primeiros segundos de escovação. A ideia por trás desse design, contudo, é a de que ao separar os componentes do creme o produto se torna mais convincente em suas diferentes propostas –limpeza e hálito fresco;

 

 

– o botão que fecha as portas dos elevadores. Também chamado de “botão placebo” são pouquíssimos os que realmente têm algum tipo de função programada a fim de acelerar o fechamento das portas. Porém, eles continuam ali para nos dar a sensação de que temos algum controle sobre o processo e, com isso, reduzir um estresse ou ansiedade eventuais, especialmente quando seu utilizador está atrasado para um compromisso no 80º andar. Uma abordagem semelhante envolve os botões de travessia de pedestres que, teoricamente, aceleram o ciclo de tráfego dos carros, a fim de dar vez a quem vem a pé. Segundo estatísticas do município de São Paulo, cerca de 80% dos semáforos estão acoplados com a chamada “botoneira”, mas a maioria delas ou funciona de maneira aleatória ou simplesmente não está programada / conectada a circuito algum que possa interferir no fechamento do farol. Os dados paulistanos não estão disponíveis, mas em Nova Iorque, por exemplo, 76,92%desses botões estão desativados há pelo menos uma década (o processo de desativação teve início em 2004);

– na Austrália, a Comissão de Defesa dos Direitos do Consumidor autuou a Reckitt Benckiser por conta de sua linha de medicamentos para dores Nurofen. Na época, 2016, havia um conjunto de comprimidos para categorias diferentes, como enxaqueca, coluna e cólica, vendidos em embalagens distintas e com preços também variados. Entretanto, toda a linha possuía exatamente a mesma formulação química – o que, pela interpretação do órgão, lesava o consumidor ao conduzi-lo a interpretações equivocadas sobre os efeitos do produto. Na prática, a empresa se apoiava no conceito de placebos afim de “fortalecer” o efeito desses medicamentos, algo totalmente psicológico, mas que tem resultados por vezes próximos ao de medicamentos reais, segundo diversos estudos científicos (vide referências abaixo)

 

John Maynard Keynes dizia:

“É melhor estar vagamente certo doque precisamente errado.”

Tendemos a supervalorizar respostas lógicas, porque elas nos dão ares mais científicos e uma sensação de controle sobre a situação. Entretanto, no fim das contas, o excesso de lógica pode nos tornar apenas previsíveis… pouco originais.

 

Saiba mais em:

Australian Competition and Consumer Commission. Full Federal Court orders $ 6 million penalty for Nurofen Specific Pain products. Disponível em:  https://www.accc.gov.au/media-release/full-federal-court-orders-6-million-penalty-for-nurofen-specific-pain-products

Comercial de TV. (2011). “New Diamond Shreddies”. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ZV6xrmm2mII

Detalhes da campanha “Diamond Shreddies”: https://www.ivanpols.com/portfolio/diamond-shreddies

HarvardHealth Publishing. (2017). The power of placebo effect. Disponível em: https://www.health.harvard.edu/mental-health/the-power-of-the-placebo-effect

KAM-HANSEN, Slavenka, JAKUBOWSKI, Moshe, KELLEY, John M. et al. (2014). Altered placebo and drug labeling changes the outcome of episodic migraine attacks. Science translational medicine, 6(218), 218ra5. https://doi.org/10.1126/scitranslmed.3006175.

MUNNAGI, Lambrus. (2020,atualizado em 18 de fevereiro). Placebo effect. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK513296/.

SUTHERLAND, Rory.(2019). Alchemy: the surprising power of ideas that don’t make sense. London: WH Allen.

SUTHERLAND, Rory. (2009). TED Talk: “Lições de vida de um publicitário”. Disponível em: https://www.ted.com/talks/rory_sutherland_life_lessons_from_an_ad_man?language=pt-br.

The Economist. A pressing problem: the pros and cons of placebo buttons. Matéria publicada na edição de 26 de janeiro de2019 e disponível em: https://www.economist.com/science-and-technology/2019/01/26/the-pros-and-cons-of-placebo-buttons

[1] Tradução livre de “(…) there are also hundreds of seemingly irrational solutions to human problems just waiting to be discovered, if only we dare to abandon standard-issue, naïve logic in the search for answers.”

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O botão e a flor

Moro numa casa antiga em São Paulo, a maior cidade do país. Até aqui, nada anormal, certo?

Mas as pessoas se surpreendem quando ficam sabendo que o meu quintal é de terra e que tenho dois limoeiros, uma pitangueira, uma amoreira e uma jabuticabeira no jardim, além de muitos vasos de suculentas e cactos.

Isto é bastante diferente em cidades grandes, concordam?

Dá trabalho? Sim, dá trabalho, mas dá muito prazer! (e aqui podemos parar para pensar que a ordem destas duas últimas sentenças faz toda a diferença, não é verdade? Comparem: Dá muito prazer, mas dá trabalho!)

Bem, morando aqui, tenho muito a aprender com a mãe Natureza, observando e absorvendo seus ciclos.

Recentemente, enquanto cuidava dos vasinhos de suculentas, vi um botão, na verdade, dois deles em forma de V.

Há três meses acompanho o crescimento deles e todas as manhãs, quando abro a janela, eu procuro ver “a flor”, mas ainda vejo o botão, que agora está bem mais alto do que a planta, mas ainda está em preparo, em desenvolvimento.

Neste momento a mãe Natureza faz com que duas ideias gritem na minha mente: processo e evento.

Processo – substantivo masculino

Ação continuada, realização continua e prolongada de alguma atividade, seguimento, curso.

Evento – substantivo masculino.

Acontecimento geralmente observável, fenômeno.

Voltando ao botão, o desabrochar de uma flor é um longo processo que pode durar dias, semanas e, neste caso, meses, até que um dia somos presenteados com uma perfeição da natureza.

Durante o processo há o preparo, o aprendizado, o crescimento, a evolução e tudo o mais que toma tempo para acontecer, mas o resultado é impressionante e duradouro.

Os eventos, ao contrário, são rápidos, durando horas, um dia, com a felicidade momentânea.

Muitos, no imediatismo, preferem os eventos, com seus resultados rápidos, porém, a vida tem muitos processos, que são longos, como aprender a andar e a falar que nos acompanharão por anos e anos.

Temos ainda processos ligados aos aprendizados de uma segunda língua, um instrumento, dirigir, uma profissão… dentre vários outros.

Ainda não há pílulas que nos façam tocar lindamente um violino, falar bem uma segunda língua, ou ser um excelente pizzaiolo, mas será que isto seria bom? E o amadurecimento, o crescimento e o aprendizado?

Enquanto escrevo estas palavras, outros processos estão acontecendo lá no jardim. É manhã, o sol está aquecendo a terra e o céu está pintado de um azul belíssimo, e as abelhas e as vespas, muitas delas, estão voando de flor em flor, trabalhando incessantemente. Em alguns meses,as flores serão limões e o mel adoçará nosso alimento.

Aí me lembro de duas frases lindas:

“Tudo tem seu tempo certo!” e “Entre a raiz e a flor há o tempo” , esta última, por Carlos Drummond de Andrade.

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Sobre legado

“Uma vida longa, saudável e feliz é o resultado de contribuições, projetos significativos que sejam realmente animadores e que contribuam e abençoem avida dos outros.” (Hans Seye)

Muito se fala sobre a importância de se ter um propósito na vida e isso, muitas vezes, nos faz pensar: “será que eu tenho um propósito claro? O que, de fato, faz sentido na minha vida?”. Se você já se debateu pensando “como é que eu posso não ter clareza de meu propósito nessa vida?”, um momento de descompressão: nem sempre é tão simples identificarmos isso. Pode levar anos!

Mas há um caminho que pode nos aproximar muito disso: é você pensar sobre seu legado, o que você quer deixar como maior lembrança pelos caminhos que percorrer.

Muitos anos atrás, em um trabalho de desenvolvimento de líderes, um consultor amigo promoveu uma reflexão que me fez pensar muito. A tarefa era pensar nas pessoas que fizeram diferença na nossa vida, qualquer uma: pai, irmão, amigo, professor. Depois de fazermos nossa listinha, ele nos pediu para colocarmos, ao lado de cada nome,uma palavra que representasse como essa pessoa te influenciou. Num terceiro momento, ele nos pediu que falássemos apenas as palavras que tínhamos escrito -e que ele anotou no flip chart, deixando-o repleto de termos como gratidão, determinação, alegria, paixão, resiliência, empatia, apoio, amor, superação…

O fechamento da atividade não poderia ter sido mais impactante: mais do que uma influência, essas pessoas tinham nos deixado um legado, uma “marca”, que nos ajudou a chegarmos aonde estávamos e que devíamos agradecê-las por isso.

A pergunta inevitável: agradecemos até aquelas pessoas que deixaram marcas ruins? Sim, até a elas, porque te deram a oportunidade de escolher que modelo não seguir… Já tinha pensado por esse lado?

Em seu livro “Deixe um legado”, Paulo V. Kretly, nos descreve histórias de pessoas que romperam padrões negativos e se tornaram o que ele chama de “figuras de transição”, que são aquelas que romperam com padrões, modelos e pressupostos negativos,substituindo-os por outros mais produtivos. São aquelas pessoas que fazem a diferença e criam novas realidades por onde passam, sem deixarem se abater por pensamentos como “sempre foi assim”, “mas como posso fazer algo sozinho?” ou “fui criado dessa maneira”.

Temos figuras de transição bem conhecidas como Nelson Mandela, Gandhi, Madre Teresa de Calcutá e Irmã Dulce, que se dispuseram a enfrentar desafios e superar obstáculos para fazer o que acreditavam que tinha de ser feito, mudando a vida de muitas pessoas.

Mas será que se tornar figura de transição é um “dom” para poucos ou para aqueles que fazem obras grandiosas? Alguns podem pensar “mas eu faço ou trabalho com uma coisa tão simples, como posso deixar um legado?” Aí é que está: não é a sua formação, suas posses ou o seu cargo que conta.

Tive a oportunidade de, em um trabalho em uma montadora de renome, ter contato com uma profissional da linha de montagem que apertava parafusos o dia todo para deixar peças e partes do carro em seus devidos lugares. Quando perguntada sobre o trabalho que fazia, a resposta não poderia ter sido mais eloquente: “a cada parafuso que aperto, estou cuidando da segurança das pessoas que usarão aquele carro”. Ela tinha clareza da importância e do significado de seu trabalho e comisso era um modelo de cuidado que, com toda certeza, influenciava quem trabalhava perto dela. Não há melhor motivação do que um bom exemplo.

Você tem ideia do poder de transformação que suas atitudes, gestos, palavras podem exercer nas pessoas com as quais convive? Tenho absoluta certeza de que você já influenciou alguém por algo que disse, mesmo que não saiba disso.

E quando o ‘piloto automático’ da pessoa está ligado e ela vai fazendo coisas e escolhas sem parar para pensar um pouco mais nelas, passando pela vida sem se dar conta do impacto disso para si e para os outros? Será que ela tem ideia de qual o seu valor na conexão com o outro? Piloto automático e autoconhecimento não costumam andar de mãos dadas… E esse é o primeiro passo para podermos pensar no nosso legado: autoconhecimento. É ele que permite que identifiquemos nossos padrões, aqueles que nos impulsionam e aqueles que nos limitam.

Somos livres para escolher e colher o resultado de nossas escolhas. E para termos uma boa colheita, temos de alinhar nossos sentimentos, pensamentos, valores, discurso e atitudes de modo coerente e consciente. Quem pensa de um jeito e age de outro, desperdiça energia e não consegue focar noque realmente é importante, seja na vida pessoal ou na profissional.

Alguns podem pensar “se você tivesse o chefe, o emprego, a família que tenho…”

Dilemas e situações difíceis sempre existirão. A grande questão é: qual escolha você fará diante deles? Lamentar-se ou agir para mudar a situação?

 

Cada ser humano tem, dentro de si, uma “semente” do sucesso, que precisa ser regada com carinho para crescer, florescer e dar frutos. Mas para isso acontecer tem de revolver a terra (autoconhecimento), adubar (pensamentos produtivos) e retirar as ervas daninhas (pensamentos negativos) com empenho e determinação.

E aí, tem cuidado da sua semente? Tem explorado todo potencial que tem dentro de si e que está aí, pronto para ser revelado? Você tem ideia das marcas que deixa por onde passa?

A decisão está em suas mãos.

“Viva, ame,ria, deixe um legado.” (Stephen Covey)

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8 dicas para tornar suas reuniões mais produtivas

Você chega 5 minutos antes, mas a reunião começa com 15 minutos de atraso. Há pessoas demais na sala, muitas das quais sequer precisariam estar ali, e outras que foram chamadas em cima da hora. A pauta, quando há uma, não é respeitada. Discute-se vários tópicos, mas, ao final, a única decisão tomada é a de que será preciso… agendar uma nova reunião.

Durante workshops sobre produtividade e gestão do tempo que conduzimos na Arquitetura RH, as reuniões aparecem, quase unânimes, como uma das maiores fontes de desperdício de tempo nas organizações. Mas por que elas são assim tão ruins? Neste artigo, vamos discutir oito pontos para ajudá-los a organizar – e participar de – reuniões mais produtivas.

 

01. Precisamos mesmo de uma reunião

Vários assuntos não só podem, como devem ser conduzidos em um contexto diferente. Revisão de documentos, por exemplo. Quando uma reunião é organizada para este propósito, a tendência é de que as pessoas se dispersem rediscutindo decisões que já foram tomadas e desperdiçando tempo com ajustes de palavras e pontuação. O ideal é que o documento seja compartilhado com antecedência, a fim de que todos tenham tempo hábil de lê-lo, levantar pontos de dúvida e, só então, realizar uma reunião de alinhamento dessas especificidades – caso realmente necessário. Há reuniões, no fim das contas, que poderiam muito bem ser substituídas por um simples e-mail.

 

02. Defina previamente a pauta de discussão

Sendo a reunião realmente necessária, estabeleça uma pauta e certifique-se de que ela seja informada previamente a todos os participantes. Se o convite para a reunião for feito através de calendários e aplicativos digitais, use o campo “assunto” ou “descrição”, para explicitar, de maneira breve e objetiva, o que deverá ser tratado nesse encontro. Isso é importante para que as pessoas tenham tempo de se preparar para a discussão, pesquisando ou consultando os materiais que julgarem necessários, além de separar informações relevantes para compartilhar. Mas seja realista: a quantidade e complexidade de tópicos deve ser compatível com o tempo programado.


 

03. Convide apenas as pessoas chave

Certifique-se de que as pessoas que têm poder decisório ou informações importantes para compartilhar foram convidadas. Reuniões com muitos participantes tendem a ser caóticas, com discussões infindáveis e diversas pessoas isoladas, que passam a maior parte do tempo todo mudas – seja porque não têm envolvimento direto com o assunto ou porque não detêm poder de decisão e, consequentemente, não precisariam estar ali. Convidá-las implica apenas em perda de tempo.

Muitas empresas não calculam o custo financeiro de reuniões improdutivas, ou fazem-no de maneira simplista: “só perdemos 1h”. Na verdade, esse desperdício de recursos pode ser calculado: uma reunião improdutiva de 1 hora custa a soma do salário-hora de cada participante. Dependendo da equipe convocada, esse valor pode facilmente atingir a marca de milhares de reais. Então pense nele multiplicado pela quantidade de encontros improdutivos: é dinheiro desperdiçado. Mais ainda: essas reuniões provocam efeitos colaterais, estes mais difíceis de serem calculados, relacionados a perda de produtividade e de motivação.

Considere, no entanto, que as pessoas que não vão contribuir diretamente para as decisões que serão tomadas, mas precisam dessa informação, podem ser incluídas, posteriormente, na lista de distribuição da ata. Outra possibilidade: definir representantes de áreas de negócio que possam participar e, depois, compartilhar as decisões tomadas de forma mais objetiva com o restante de suas equipes. Assim, é possível acertar a quantidade de pessoas presentes.

04. Organize os assuntos e alinhe expectativas

Ao iniciar uma reunião, apresente a sequência dos tópicos que serão tratados e o tempo reservado para cada um desses blocos. Isso permite que as pessoas se programem e acompanhem o andamento, sintetizando ou explorando mais detalhes, conforme o caso e o tempo restante.

Aqui, tenha em mente que as pessoas possuem perfis de comunicação diferentes: algumas são mais objetivas e diretas, ao passo que outras se sentem mais confortáveis esmiuçando detalhes e informações mais aprofundadas. Se o encontro é com pessoas que você já conhece, considere esse detalhe no planejamento da pauta; caso não as conheça de antemão, reserve um espaço a mais para que todos os perfis possam, de alguma forma, encontrar espaço de participação. (Conheça mais sobre este tema aqui.)

05. Respeite o tempo agendado

Reuniões devem começar e terminar no horário programado. Nada de esperar fulano ou sicrano, que está atrasado; muito menos recapitular aos menos pontuais o que foi discutido durante sua ausência. As pessoas devem entender que a efetividade de uma reunião é um resultado atingido em grupo e que, justamente por isso, depende da colaboração de todos.

Tão importante quanto começar no horário é terminar no horário: muitas pessoas planejam seu dia de forma a otimizar o tempo de trabalho. Assim, “prendê-las” além do previsto pode fazer com que suas agendas posteriores sejam desestruturadas, gerando estresse, frustração.

Ademais, atente-se para reuniões consecutivas. Minha recomendação é que você não agende nem participe de duas ou mais em sequência. Afinal de contas, após uma reunião geralmente é necessário um tempo para organizar linhas de raciocínio, concatenar novas informações recebidas e se planejar sobre as tarefas que eventualmente nos foram incumbidas. Ao sair de uma reunião direto para outra, isso significa que esse exercício reflexivo, importante para que o cérebro monte os próximos passos, se acumulará, possivelmente fazendo com que algumas informações – caso você não tenha tomado nota de tudo o que era importante – sejam perdidas nesse intervalo.

Se isso for inevitável, por conta de dificuldade de agenda ou algo parecido, organize as reuniões para que haja um intervalo mínimo entre elas. Recomendação: o tempo padrão de uma reunião deve ser um intervalo de 50 minutos, em vez de 1h cheia. Assim, você terá alguns minutos para entrar na seguinte, começando-a pontualmente.

06. Presença plena

Conforme comentamos em um artigo anterior, sobre produtividade e gestão do tempo, multitasking é essencialmente um mito. O que as pessoas fazem chama-se alternância de tarefas. E esta é uma das práticas mais nocivas à produtividade. Sendo assim, não é possível participar ativamente de uma reunião, enquanto responde a e-mails no computador, conversa com alguém nos aplicativos de mensagem instantânea ou navega na internet.

 

 

07. Boa facilitação

Toda reunião requer a presença ativa de um(a) facilitador(a). Este não precisa ser exatamente a pessoa que agendou e organizou o evento, mas alguém que está ciente e confortável com a pauta e que terá a missão de manter a conversa fluindo dentro dos tópicos acordados previamente. Falaremos sobre isso em detalhes em um outro artigo, mas uma das principais habilidades de facilitação é o “jogo de cintura” para interromper as pessoas que estão trazendo assuntos tangenciais ou relacionados a outro contexto – e elas podem ser inclusive o(a) Presidente da empresa. Cabe também ao facilitador garantir que todos têm igual oportunidade de participar e compartilhar sua opinião / informações.

08. Defina um plano de ação

Toda reunião deve ser concluída com um plano de ação, isto é, uma lista de tarefas que representam os próximos passos a serem executados. Estas, por sua vez, precisam ter um responsável (owner) e um prazo de conclusão. Sem responsável, são grandes as chances de que ninguém efetivamente “pegue a tarefa para si” e ela continue pendente até a próxima reunião; sem prazos, as tarefas não poderão ser devidamente priorizadas na lista (backlog) de cada responsável.

O plano de ação deve ser acordado durante a reunião e com os responsáveis pelas tarefas, colhendo deles a concordância de que é possível realizá-las e, principalmente, dentro do prazo estipulado. Deixar esta etapa para depois pode fazer com que as tarefas sejam dessincronizadas do contexto global em que estão inseridas, prejudicando outras tarefas, áreas ou pessoas.

Este plano deve ser devidamente documentado e enviado para todos os participantes após o encontro. Busque a simplicidade e aproveite as opções de ferramentas eletrônicas e mapas mentais, para torná-lo colaborativo. É recomendável, também, repassá-lo rapidamente como última etapa da reunião, a fim de garantir que tudo foi entendido e acordado corretamente.

09. Item extra: atenção para a linguagem!

Tome cuidado com a linguagem: termos sarcásticos, ironia e comentários depreciativos sobre as ideias podem colocar toda a comunicação a perder, inibindo alguns participantes. Ademais, feedbacks de caráter pessoal devem ser reservados para um momento posterior, em que a conversa possa acontecer de maneira privada, evitando assim exposições desnecessárias.

Jargões, clichês e lugares-comuns também não favorecem a discussão, ao passo que termos em outros idiomas (branding, budget, forecast, pipeline etc.) podem não ser compreendidos por todos que, no entanto, talvez não se sintam confortáveis em perguntar seu significado e perder pontos importantes da conversa.

Da próxima vez

Reuniões podem ser produtivas e divertidas. É possível conduzi-las com bom humor e, especialmente, por meio de técnicas e ferramentas que estimulam a colaboração e o compartilhamento de informações (para dicas sobre este tema, acesse nosso blog – lá você encontrará diversas alternativas para aplicar com seu time).

Por fim, é importante que as pessoas possam oferecer feedback sobre a forma como uma reunião foi conduzida, principalmente se o grupo costuma se reunir com frequência, a fim de colocar em prática melhorias. Todos se sentirão gratos ao perceber seus comentários sendo transformados em ações para otimizar o tempo.

 

Saiba mais em:

BRYANT, Adam. (2017). How to run an effective meeting. Artigo escrito para New York Times, em 24 de abril.

Disponível em: https://www.nytimes.com/guides/business/how-to-run-an-effective-meeting

GRADY, David. (2011). The conference call.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=zbJAJEtNUX0.

GRADY, David. (2013). TED Talk: Como salvar o mundo (ou pelo menos a nós mesmos) demás reuniões.

Disponível em: https://bityli.com/2UPA6

MERCHANT, Nilofer. (2013). TED Talk: Got a meeting? Take a walk.

Disponível em: https://www.ted.com/talks/nilofer_merchant_got_a_meeting_take_a_walk

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Ambidestria organizacional

Ambidestria tem a ver com a habilidade de usar ambas as mãos com a mesma destreza. No contexto organizacional, é uma estratégia que combina características

– exploratórias, no sentido de utilizar recursos disponíveis e todo seu potencial, a fim de conduzir os negócios e operações atuais de forma eficiente. Envolve o emprego de métodos e ferramentas com eficácia comprovada e já conhecidas pela empresa, e ocorre por meio de processos produtivos, de melhoria, refinamento; e

– investigativas [1], ou seja, capazes de analisar movimentos e oportunidades de mercado e se adaptara essas demandas. Está relacionada a pesquisas, experimentos, tomada de risco, flexibilidade, criatividade, inovação e agilidade

 

 

A proposta dessa estratégia, portanto, é a combinação das duas vertentes, a fim de potencializar uma mescla de excelência operacional e abertura para o futuro. Afinal, empresas focadas somente na exploração acabam se atendo ao status quo, perdendo velocidade frente às transformações do mercado, enquanto aquelas focadas apenas em investigação podem acabar desperdiçando recursos valiosos em ideias sem resultados concretos ou que jamais serão colocadas em prática.

Origem e características

O conceito surgiu em 1976, com Robert Duncan, mas foi só quinze anos depois, por meio de um paper de James March, que ele se disseminou como estratégia:

 

“Investigar novas oportunidades e explorar velhas certezas.”

O’Reilly e Tuschman usam uma analogia mitológica para defini-lo: Jano, deus romano do início e das escolhas, caracterizado por um ser com duas faces, uma voltada para trás (o passado) e outra para frente (o futuro).

 

Assim, a principal vantagem desse conceito reside na preparação das empresas para atuar em contextos de muita competitividade e de transformações rápidas e profundas – exatamente como acontece nesta fase de transição entre as Revoluções 3 e 4.0, com o avanço da Inteligência Artificial, a simbiose entre componentes biológicos e tecnológicos e a fusão dos ambientes real e virtual.

Nessa visão, uma empresa ambidestra se desenvolve cultural e estrategicamente a ponto de equilibrar elementos mais rígidos, como disciplina e força, e mais voláteis, como apoio e confiança, criando assim objetivos compartilhados, uma identidade coletiva e também respeitando o propósito individual frente aos esforços da organização como um todo.

A ambidestria, contudo, é um dos grandes desafios da gestão: como construir esse ambiente em que executivos podem desbravar novos horizontes enquanto mantêm as operações funcionando de forma diligente? Não é à toa que poucas atingem esse nível. Como afirmam O’Reilly e Tuschman (2004):

A maioria das empresas de sucesso adere ao refinamento de ofertas existentes, mas falham quando se trata de explorar produtos e serviços radicalmente novos.

Como aplicar o conceito

O’Reilly & Tuschman analisaram 35 empresas com diferentes métodos para colocar em prática essa estratégia: desde modelos com times transversais, focados em criação disruptiva a partir da integração entre diversas áreas, dentro da mesma estrutura organizacional, porém sob um hierarquia de gestão diferente; até composições alternadas, em que a empresa trabalhava a ambidestria de forma mista, isto é, alternando períodos de exploração e investigação.

Dentre elas, o maior percentual de sucesso (90%) foi atingido por aquele baseado no modelo de venture capital. Atualmente, inclusive no Brasil, empresas de grande porte têm criado internamente células de pesquisa e inovação que funcionam com certa autonomia e possuem estrutura, processos e culturas separadas, embora com níveis executivos atuando de maneira integrada. Assim, é possível manter a estrutura operacional existente, dentro de um modelo que já funciona com eficiência, ao mesmo tempo em que se abrem caminhos para o novo.


Uma vantagem desse modelo é que a célula de pesquisa funciona como um departamento –eventualmente até mesmo como uma empresa em menor escala – a parte, não havendo, portanto, necessidade de conciliações culturais entre as duas esferas, algo geralmente muito complexo. Ademais, e segundo O’Reilly & Tuschman:

“(…) ele permite o compartilhamento de recursos importantes das unidades tradicionais – dinheiro, talento expertise, clientes e assim por diante –, embora a divisão organizacional garanta que os processos, estruturas e cultura distintos dessa nova célula não sejam pressionados pelo ‘business as usual’. Ao mesmo tempo, as unidades já estabelecidas permanecem blindadas das distrações de lançamento de novos negócios, podendo manter o foco, atenção e energia no refinamento das operações existentes, aprimoramento de produtos e atendimento de clientes.”

Um mapa para o futuro

Assim como o desenvolvimento pessoal parte de uma jornada de autoconhecimento, a gestão estratégica empresarial também precisa olhar para dentro de casa e entender sua trajetória e momento atual para delinear os próximos passos. Por esta razão, recomendamos que vocês, gestores, preencham o “Mapa da Inovação” [3]:


 

Ao fazê-lo, vocês terão evidências sobre áreas e caminhos que suas empresas podem ter deixado de lado e, a partir daí, concentrar os esforços de desenvolvimento da ambidestria.

É importante enfatizar que:

– esse processo requer a criação de uma causa em comum, capaz de unir esforços das equipes das diferentes unidades em prol de um objetivo compartilhado;

– a gestão responsável por ele precisa de força política e trânsito livre entre as diferentes unidades, a fim de exercer influência e, principalmente, angariar o apoio necessário para que as iniciativas de inovação sejam desenvolvidas. Tenha em mente que uma série de tradeoffs entre o atual e o novo inevitavelmente ocorrerá;

-embora as unidades possam estar fisicamente separadas, o que é bastante comum, elas não podem ser fragmentadas. Algumas empresas, por exemplo, optam por atrelar os sistemas de recompensa aos resultados da organização como um todo, em vez daqueles específicos às unidades;

– estabelecer um plano de comunicação claro, definindo a visão da empresa em relação a essas iniciativas. Ele permitirá que as unidades de exploração e investigação coexistam

Há grandes cases de sucesso de ambidestria pelo mundo. No mercado americano, O’Reilly & Tuschman citam o jornal USA Today e seu processo de transformação digital no USAToday.com. No Brasil, há iniciativas poderosas em curso, como o LuizaLabs, responsável por uma grande mudança estratégica no varejo digital, e a parceria entre o Cubo Itaú e a Dasa, em2018, que criou um espaço dedicado a healthtechs. Em todos esses casos, modelos de ambidestria foram e continuam sendo aplicados, a fim de que essas empresas continuem inovando em campos, tecnologias, produtos e serviços complemente novos, ao passo que as operações core continuam funcionando e implementando ações de excelência operacional.

Aqui na Arquitetura RH, o conceito de ambidestria aliado afrentes de inovação tem sido implementado na criação do “LabRH”, ideia que surgiu há cerca de um ano e que tem sido desenvolvida. Mas guardaremos os detalhes desse processo para uma próxima ocasião. Enquanto isso, não deixe de seguir nossas páginas nas mídias sociais (LinkedIn e Instagram), para acompanhar nosso trabalho. Todo dia, um novo conteúdo selecionado para o desenvolvimento – seu e de sua empresa.

 

Saiba mais em:

Cubo Itaú: https://cubo.network/

DasaHub: https://dasa.com.br/inovacao/empreendedorismo-e-startups

DUNCAN, R.(1976). The ambidextrous organization: Designing dual structures for innovation. In: KILLMAN, R. H., PONDY, L. R. & SLEVEN, D. (eds.) The Management of Organization. New York: North Holland. 167-188.

GIBSON, C.& BIRKINSHAW, J. (2004). Building Ambidexterity into an Organization Topic: Leadership and Organizational Studies. Reprint 45408, (4), 47–55.

LIS, Andrzej, JÓZEFOWICZ, Barbara, TOMANEK, Mateusz & GULAK-LIPKA, Patrycja. (2018). The concept of the ambidextrous organization: systematic literature review. International Journal of Contemporary Management Volume 17,  Number 1, pp. 77–97. Disponível em: http://www.ejournals.eu/ijcm/2018/Numer-17(1)/art/11484/

MARCH, James G. (1991). Explorationand exploitation in organizational learning. Organization Science, 2, 71-87. Disponível em:

https://pubsonline.informs.org/doi/abs/10.1287/orsc.2.1.71

O’REILLY III, Charles A. & TUSCHMAN, Michael L. (2018). Liderança e disrupção – como resolver o dilema do inovador. Rio de Janeiro: Alta Books.

O’REILLY III, Charles A. & TUSCHMAN, Michael L. (2004).The ambidextrous organization. Artigo da Harvard Business Review, publicado em abril. Disponível em: https://hbr.org/2004/04/the-ambidextrous-organization

REEVES, Martin, HAANAES, Knut, HOLLINGSWORTH,James & SCOGNAMIGLIO, Filippo. (2013). Ambidexterity: the art of thrivingin complex environments. Artigo escrito para a Boston Consulting Group (BCG) epublicado em 19 de fevereiro. Disponível em: www.bcg.com/publications/2013/strategy-growth-ambidexterity-art-thriving-complex-environments.aspx

[1] Em inglês, as características são definidas pelos termos exploitation exploration, respectivamente, que possuem a mesma tradução para o português: “exploração”, ainda que com nuances de significado diferentes. Foi por esta razão que optei por manter “exploração” para exploitation e usar “investigação” para exploration.

[2] Traduzido e adaptado de Harvard Business School, 2004.

[3] Adaptado do modelo desenvolvido pela Harvard Business School, 2004.

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Pitch de negócios: como apresentar sua ideia em 5 andares

Pitch é uma espécie de tweet do mundo físico: só que em vez de 140 caracteres, você costuma ter alguns minutinhos para apresentar sua ideia de negócio, encantar possíveis investidores e fazer com que eles aportem dinheiro para torná-la realidade. Ou ganhar escala, dependendo do caso.

Há alguns tipos específicos de pitch:

– o chamado one-sentence, em que você resume a proposta de valor da sua ideia ou empresa em apenas uma frase, que pode então ser utilizada em campanhas e materiais de engajamento;

– o elevator business pitch, método que faz alusão ao tempo de discurso que você teria disponível, caso um investidor entrasse no mesmo elevador em que você está e os dois subissem cinco andares juntos (algo em torno de um minuto); e

– o pitch como termo que designa uma apresentação, em geral de 3 a 5 minutos, de uma ideia de negócio e que busca apoio financeiro de fundos de venture capital (VC) ou investidores-anjo.

A técnica pode ainda ser usada no contexto de colaboradores que vão apresentar um determinado projeto para um comitê executivo da empresa em que trabalham, que, por sua vez, pode aprovar ou não o orçamento para que ele seja posto em prática. Neste artigo, usamos a metáfora do elevador, mas com foco no pitch de 3 a 5 minutos.

Térreo – pronto para embarcar

 

 

Um adulto consegue falar, em média, de 120 a 150 palavras por minuto em língua portuguesa – número que pode variar conforme cadência, entonação e características linguísticas regionais. A princípio, essa multiplicação pode parecer pouco tempo, mas mostraremos a seguir que não.

Um pitch precisa cobrir cinco elementos básicos:

(1) O problema;

(2) A solução;

(3) Por que seu interlocutor pode confiarem você;

(4) Proposição de valor; e

(5) Chamada de ação.

Sabendo isso, aperte o botão de subida: vamos explorar cada um desses cinco andares, até chegar ao rooftop. Mas não se esqueça do sorriso no rosto e das saudações – afinal, você nunca sabe quando a próxima grande oportunidade vai entrar nesse elevador.

Primeiro andar: que problema sua ideia pretende resolver

 

 

É o momento de criar um vínculo emocional com o interlocutor, fazendo com que ele se identifique com o problema – seja porque corrobora com a causa, ou por tê-la experienciado pessoalmente.

Grandes startups nasceram a partir do momento em que seus criadores resolveram dar um basta em alguma situação desagradável, complexa, irritante que eles próprios vivenciaram. Embora não seja mandatório ter passado pelo problema, é imprescindível conhecê-lo e, principalmente, por quais razões ele é um problema.

Cuidado, porém, na medida: a descrição do fato precisa conter elementos de apelo emocional, sem se transformar em um dramalhão de sessão da tarde. Anedotas e contação de história com personagens (reais ou personas)são válidas apenas enquanto capazes de ilustrar situações específicas. Além disso, adjetivos muito intensos e opiniões extremadas, particularmente se envolverem questões delicadas (política), podem encerrar sua subida aqui mesmo.

Segundo andar: como você resolve esse problema

 

 

Esclarecido o problema, é hora de falar da solução. Por que sua ideia é capaz de resolvê-lo? Use números, comparações e dados que respaldem suas afirmações, além de explicar seus principais pontos.

Não é o momento de detalhes técnicos, nem de apresentar toda a bibliografia consultada enquanto você montava seu plano de negócios: seja preciso e coerente, destacando os principais benefícios que ela oferece, isto é, seus diferenciais em relação a alternativas de mercado.

Toda ideia tem um concorrente: se não for uma empresa já estabelecida no mercado, ou novo entrante, o competidor serão bom e velho status quo, isto é, “a forma como as coisas sempre foram feitas por aqui”.

Pense nisso, quando tiver de calibrar sua proposta de valor.

Adicionalmente, evite abordagens do tipo locutor de magazine, como:

– provocações exaustivas: “Você não detesta quando [situação 1] acontece, ou quando [situação 2]. Porque [situação 3] é realmente incômoda…”;

– hipérboles: “a mais fantástica”, “melhor do mundo”, “absolutamente incrível”;

– truísmos, ou seja, discursos artificiais, com o buzzword do momento e afirmações que o fazem parecer um vendedor, em vez de uma pessoa resolvendo problemas de negócio.

David Rose, empreendedor em série e investidor-anjo americano fala aqui sobre progressão lógica: você deve discorrer sobre o mercado em que sua ideia está inserida, coisas sobre as quais tem conhecimento, validadores, coisas que sabe que não são corretas, pontos que o fazem refletir e oportunidades de melhoria.


Terceiro andar: por que a pessoas podem confiar em você

 

 

Convenhamos: no elevator pitch você é essencialmente um estranho abordando um investidor em potencial. Por que, então, essa pessoa investiria dinheiro em você?

Esta é a oportunidade para contar um pouco de sua história: como você se envolveu com o problema, principais pontos pesquisados, contatos com outras empresas / empreendedores / soluções, dados de mercado e sobre o público-alvo de sua proposta. Demonstre, com segurança, que você sabe do que está falando, fez a lição de casa e está pronto para se comprometer e colocarem prática a solução.

E este último ponto é fundamental: se esse senso de comprometimento não ficar evidente, é pouquíssimo provável que sua ideia receba qualquer tipo de investimento.

Afinal, quem emprestaria dinheiro para alguém que, logo nos primeiros obstáculos – e eles certamente vão surgir – desiste?

 

Quarto andar: por que sua ideia é uma boa ideia


 

Aqui vem sua proposta de valor. Descreva os benefícios oferecidos por sua solução, oportunidades adicionais de atuação, possibilidades de ganho de escala, questões financeiras (dependendo do contexto).

Mas acima de tudo, o propósito envolvido nessa iniciativa: o que foi que o motivou a perseguir este objetivo e como você se conecta pessoalmente com ele.

Simon Sinek fala sobre isso em uma TED Talk que está dentre as mais assistidas da história do evento – olha a hipérbole aqui; mas, neste caso, não é exagero: foram 50,6 milhões de visualizações, desde 2009.

Outro ponto essencial é a explicação sobre como o dinheiro aportado pelo investidor será empregado na implantação da ideia. Embora o momento do pitch não seja a ocasião para entrar em detalhes, eles certamente serão solicitados em um segundo encontro. Esteja preparado para destrinchar os custos e estimativas.

 

Quinto andar: próximos passos

 

 

Um pitch é essencialmente um teaser da sua ideia, com detalhes suficientes para fazer com que a pessoa se interesse por ela – e dê abertura para um contato mais aprofundado. Uma vez que houver esse interesse, você está pronto para a CTA – call to action, ou “chamada para ação”. É aqui que você estabelece a ponte de conexão para que os próximos passos sejam dados:

– troque contatos para poder encaminhar materiais complementares à conversa, direcionar a pessoa a um site ou local de campanha;

– agende um novo encontro, no qual você poderá desfrutar de mais tempo para apresentar sua ideia com detalhes, discutir a viabilidade financeira, permitir que se interaja com um protótipo.

 

Rooftop

 

 

O improviso é um dos inimigos do pitch. Por mais extrovertido e rápido na concatenação de ideias que você possa ser, convém preparar e treinar sua apresentação, a fim de que ela ganhe fluidez e naturalidade.

Ao começar a escrever seu “roteiro”, não recomendo que o faça já em sua forma final, enquadrada como um pitch. Coloque as ideias em uma folha, de forma livre e despreocupada, organize-as para que assumam um modelo de impacto, e só então comece a ajustar, cortar e substituir palavras e expressões:

Escreva suas ideias livremente para que o discurso ganhe corpo e você consiga organizá-las ao enxergar o texto completo;

Livre-se de detalhes desnecessários, como redundâncias ou aspectos que não dizem respeito às principais características de sua proposta;

Elimine jargões técnicos: posteriormente, você terá a oportunidade de compartilhar documentos com descritivos e comparativos técnicos;

Encurte e conecte suas frases de forma coerente;

Revise o discurso, questionando a si mesmo se ele transmite de forma clara os benefícios que sua ideia / proposta de negócios oferece;

Pratique: apresente-se para pessoas que possam dar feedbacks importantes sobre o conteúdo e sua abordagem, e ensaie para se “tornar fluente” nesse discurso.

Somente desta forma sua apresentação terá o tom, cadência e naturalidade necessárias para encantar investidores e trazê-los para o time.

Com esta estratégia, seu discurso será construído com muito mais facilidade.

E não se torne dependente de recurso tecnológicos ou qualquer outra coisa que, eventualmente, não poderá ser usada na apresentação – seja por falta de tempo ou acesso. O pitch tradicional deverá ser pautado na fala, expressões e movimentos. Posteriormente, e na medida em que você conseguir se apresentar em locais menos voláteis – um escritório ou auditório, por exemplo – adeque seu discurso conforme o público participante, pesquisando sobre background de características desses investidores em potencial, inclusive adaptando elementos de linguagem e contexto. Tudo isso pode enriquecer sua apresentação, criando aquele vínculo que comentamos no primeiro andar.

Essas interações são, acima de tudo, uma negociação. Por isso, e como afirma Steve W. Martin, “em vez de ultimatos que forcem o interlocutor a aceitar ou rejeitar a proposta, ofereça alternativas entre as quais ele possa escolher e que foram cuidadosamente preparadas de antemão”.

Por fim, lembre-se de que o pitch é importante em diferentes momentos: fique atento para identificá-los e se apresentar de forma assertiva, conforme o contexto e o canal utilizado – desde o exemplo do elevador até interações em mídias sociais.

Saiba mais

em:

CAYA. (2019). Elevator pitch examples from startups. Disponível em: https://slidebean.com/blog/startups-elevator-pitch-examples

ELSBACH, KimberlyD. (2003). How to pitch a brilliant idea. Artigo escrito para a Harvard Business Review. Disponível em: https://hbr.org/2003/09/how-to-pitch-a-brilliant-idea

MARTIN, SteveW. (2012). Win the business with this elevator pitch. Artigo escrito para a HarvardBusiness Review. Disponível em: https://hbr.org/2012/08/win-the-business-with-this-ele

ROSE, David.(2007). TED Talk: “How to pitch to a VC”. Disponível em: https://www.ted.com/talks/david_s_rose_how_to_pitch_to_a_vc

SINEK, Simon. (2018). Comece pelo porquê: como grandes líderes inspiram pessoas e equipes a agir. São Paulo: Sextante.

SINEK, Simon. (2009). TED Talk: “Como os grandes líderes inspiram ação”. Disponível em: https://www.ted.com/talks/simon_sinek_how_great_leaders_inspire_action?language=pt-br

 

Leia Mais

Onde foi parar meu tempo?

Dizia Charles Buxton:

“Você nunca encontrará tempo para nada. Se precisar de tempo, terá de criá-lo”.

Manhã de segunda-feira, acabo de chegar à empresa. Ligo o notebook e dou um pulinho até a copa, a fim de tomar o primeiro café do dia. Lá, encontro um colega que está trabalhando em um projeto do qual não participo; sabendo de minha afinidade com planilhas, ele tem uma ideia: pedir para que eu compile os dados de uma pesquisa, já que, para mim, “vai levar só um minutinho”. Ele reforça que precisa desse resultado até sexta-feira, fim do dia. Despreparado para a solicitação, respondo um automático, porém solícito, “tudo bem, deixa comigo”.

Naquela mesma tarde, através de um grupo do WhatsApp criado tempos atrás, uma pessoa que não conheço compartilha o link de uma pesquisa que sua amiga está realizando para uma tese de doutorado. O formulário tem de ser preenchido até sexta. Sem sequer abrir a página para entender a quantidade de perguntas e a profundidade esperada nas respostas, corro enviar uma mensagem me comprometendo ajudar.

De volta à mesa, abro minha agenda digital e vejo o resumo da semana: aula na quinta-feira à noite (e lembro-me de que há leituras de apoio pendentes) e uma apresentação de workshop com oito horas de duração na sexta. Não comecei a preparar o material, mas… o que pode dar errado? Ainda estamos na segunda. Certo?

Os dias passam e continuo dizendo “sim” para uma série de pequenas atividades, em geral com pouca relevância, e nenhuma delas planejadas e priorizada sem minha relação semanal. Até que a, agora sobrecarregada, sexta-feira amanhece e, com ela, a constatação de que se trata, na verdade, de um dia normal, de 24 horas – e não uma versão estendida de 48h. Imediatamente percebo que elas não serão suficientes para lidar com todo os “sins” que fui acumulando ao longo dos outros dias.

Esse cenário é bastante comum: várias pessoas estruturam listas, a fim de organizar seu dia. Cada relação dessas enumera vinte, trinta itens a serem cumpridos em uma determinada data. Mas ansiosos pela quantidade de tarefas, acabamos adotando uma estratégia de resultado duvidoso: começamos pelas tarefas mais fáceis e simples, e seguimos “ticando” a lista. Ao final do dia, e a despeito de ter baixado 60% do planejado, a sensação de frustração e tempo perdido persiste: afinal, fizemos apenas aquilo que era mais fácil, e não necessariamente o que era importante – a lista não estava priorizada.

 

 

Ao longo do dia, interrompemos e somos interrompidos o tempo todo por notificações, alertas, sinais luminosos, vibrações, toques customizados e outros ímãs de atenção emitidos pelo smartphone. Esses estímulos ativam reações cerebrais automáticas, límbicas, difíceis de controlar. E, dessa forma, acabamos impelidos a desbloquear a tela e consultar o que está acontecendo – quase sempre, algo sem importância. Não nos damos conta, porém, de que essas interrupções geram um esforço cognitivo adicional para retomarmos o foco de atenção ao que estávamos fazendo – pesquisas em Neurociência apontam o número: 23 minutos e 15 segundos, em média.

Faça as contas: 23 minutos (pode arredondar) multiplicados pelo número de vezes que você consulta o celular ao longo do dia. O resultado é o ônus do mundo digital sobre sua produtividade.

Distrações como essa não têm impacto apenas sobre a produtividade: sua principal consequência são os efeitos emocionais negativos. Segundo a pesquisa científica de Gloria Mark (2008), essas interrupções levam a situações de aumento de estresse e mau-humor, sem contar a perda de linhas de raciocínio importantes, que talvez demorem muito tempo mais para serem re-associadas – se é que o serão. Mark apurou também que, durante um dia normal de trabalho, as pessoas consultam seu e-mail em média 74 vezes – embora haja casos mais graves em que esse número chega a 435!

Há interrupções mais difíceis de controlar – pessoas vindo à sua mesa fazer perguntas de trabalho, por exemplo; outras, porém, são “autoinfligidas”: o famoso Alt+Tab entre o processador de texto, em que você elabora o relatório gerencial com prazo de entrega em contagem regressiva, e o navegador da internet, aberto na timeline do Facebook. Nesse ritmo frenético de alternâncias do foco de atenção simplesmente não é possível atingir aquilo que Mihaly Csikszentmihalyi chama de flow – um estado de concentração em que as ideias se concatenam em fluxos criativos.

 

Administração do tempo pós-Mozart: o pomodoro

Os biógrafos do compositor austríaco retratam que ele possuía uma qualidade bastante rara: Wolfgang Amadeus Mozart era capaz de trabalhar em diversas composições ao mesmo tempo, todas elas, como viríamos depois, obras de arte. Mas ele é talvez o único exemplo conhecido com essa capacidade. Tendemos a nos considerar grandes praticantes do multitasking, mas é improvável que tenhamos desenvolvido esse perfil de “Mozart executivo” – expressão criada por Peter Drucker (1967).

Ao contrário, somos seres humanos com capacidade de cognição sequencial: qualquer tarefa que exija certo nível de concentração terá de ser realizada de forma individualizada; para que possamos nos dedicar a outra, é necessário terminar (ou pausar) a anterior, e assim sucessivamente.

Isso, no entanto, é bastante difícil, especialmente se considerarmos os aplicativos de comunicação instantânea – inclusive os corporativos – que disparam caixas de diálogo sempre que uma nova mensagem é enviada e quase nos obrigam a respondê-la imediatamente. De fato, existe uma expectativa social na maioria das empresas de que as respostas devem ser imediatas.

Já passou por alguma situação em que um e-mail acabou de chegar a sua caixa de entrada e, segundos depois, o remetente veio a sua mesa informar que havia mandado um e-mail?

É comum nos prendermos a esses maus hábitos e perceber, apenas no fim do dia, que as oito horas passadas no escritório foram em vão – o que nos leva a estender jornadas e/ou levar o trabalho para casa.

 

 

Uma técnica que ficou bastante conhecida e foi difundida pelo mundo a partir da segunda metade dos anos 80 é a chamada “Técnica do Pomodoro”, desenvolvida pelo italiano Francesco Cirillo. Nela, usa-se um timer de cozinha (na versão original com o formato de um tomate, o pomodoro em italiano), no qual definimos um tempo de 25 minutos em que permaneceremos focados em uma determinada atividade, nos abstendo de qualquer interrupção. Ao soar do timer, são permitidos 5 minutos de descanso. E então programamos um novo ciclo de foco, repetindo essa sequência quatro vezes, ao final das quais podemos fazer um intervalo mais longo, de 15 a 30 minutos. De maneira geral, a metodologia funciona da seguinte forma:

– Relacione as atividades que deverão realizadas no dia;

– Identifique quantos pomodoros de 25 minutos cada atividade requer;

– Organize as atividades por ordem de prioridade;

– Monte uma timeline do seu dia, identificando quantos pomodoros podem ser cumpridos em cada período, encaixando as atividades priorizadas nesses pomodoros;

– Aprenda a “defender seu pomodoro” das interferências que inevitavelmente vão aparecer durante seu tempo de foco;

– Utilize o pomodoro não apenas executando a atividade durante esse período, mas também separando alguns minutos antes, para recapitular o que precisa ser feito e, ao final, para revisar o trabalho realizado; e

– Por último, não se esqueça de incluir no planejamento dos pomodoros atividades e objetivos que têm relevância pessoal. Sim, separe alguns ciclos para cuidar de si, seja realizando atividades físicas, estudando, ouvindo sua banda favorita ou programando momentos de reflexão.

Como dica final, não preencha todas as oito horas de seu dia: imprevistos surgem a qualquer momento. Por isso, é essencial ter uma margem para lidar com eles, a fim de gerar o menor impacto possível no planejamento original do dia.

 

As três esferas

No Brasil, Christian Barbosa desenvolveu um método para auxiliar pessoas a administrar seu tempo de forma mais produtiva – a chamada “Tríade do Tempo”. Nela, classificamos nossas atividades atuais e futuras em três esferas:

– urgentes: atividades cujo prazo de entrega é curto ou já se esgotou; é representada por demandas que nem sempre podem ser antevistas, e que têm grande potencial de provocar consequências negativas (seja no âmbito pessoal ou profissional). Comumente, são fonte de estresse;

– importantes: atividades que realizamos e trazem resultados relevantes em nossa vida. Geralmente têm um prazo definido, mas não se encaixam na esfera da urgência, porque podem ser planejadas e desenvolvidas com mais calma. Uma característica essencial delas é a satisfação que nos trazem ao serem realizadas e/ou o desenvolvimento pessoal (entendido aqui da forma mais ampla possível) que fomentam;

– circunstanciais: tarefas com pouca ou nenhuma relevância; interrupções; demandas extras que são solicitadas, mas que não trazem benefício a seus objetivos. De forma geral, são formas de desperdício de tempo e que, somadas, desorganizam o seu dia. Exemplo: navegação em redes sociais, consulta constante a notificações do celular, a função “soneca” do despertador. Ao final do dia, é o conjunto de tarefas desta esfera que causa a maior parcela da frustração.

A partir daí, conseguimos ter uma noção exata de como está nossa distribuição do tempo. Dica: no mundo ideal, as atividades importantes deveriam ocupar 70% de sua agenda, sendo o restante dividido entre urgentes (20%) e circunstanciais(10%), e então dar início a um processo de revisão, reorganização e repriorização.

 

Temos mais ou menos tempo livre?

Há uma falsa ideia de que o tempo que dedicamos ao trabalho aumentou nos últimos anos. Na verdade, hoje temos mais tempo livre para lazer do que as pessoas dos anos 50, por exemplo, possuíam – e isso graças a uma série de avanços tecnológicos na forma de equipamentos eletrônicos, que automatizaram e simplificaram tarefas.

 

 

Nosso desperdício de tempo está relacionado à conexão com a tecnologia, que acaba fragmentando nosso foco de atenção e prejudicando a produtividade com inúmeras microdistrações.

Permita-se acessar as configurações do seu smartphone e desligaras notificações de (quase) todos os aplicativos. Você não precisa:

– de alertas cada vez que alguém da sua rede de contatos no Facebook posta alguma coisa;

– nem que o aparelho vibre quando os apps de entrega e transporte liberarem um novo cupom de desconto (geralmente em momentos e dias em que você não os utilizaria de qualquer forma);

– nem de um toque cada vez que chegar uma mensagem do WhatsApp – porque a maioria delas provavelmente não tem grande utilidade e pode ser vista posteriormente (ou ignoradas).

 

Técnicas para organização e priorização

Finalizamos o artigo com algumas dicas e exercícios adicionais, que podem ser colocados em prática agora mesmo, a fim de que você consiga reorganizar o seu dia, priorizando atividades e atingindo seus objetivos de maneira eficiente:

planeje seu tempo com o mesmo zelo com que você planeja seus gastos: muitas pessoas criam métodos e usam ferramentas para acompanhar e controlar o orçamento; pouquíssimas, contudo, têm o mesmo cuidado com o tempo. Este é nosso recurso mais valioso – e o mais escasso. Devemos planejá-lo com uma espécie de orçamento que deve ser distribuído entre as tarefas. Como você alocaria suas 168h semanais? Reparem que não estou me referindo a ocupar todo o tempo com trabalho, estudo ou atividades ditas “produtivas”; apenas organizar suas horas de forma que o tempo possa ser percebido de maneira leve e agradável, deixando a sensação (com o passar dos anos cada vez mais nostálgica) de que valeu a pena;

MVA (most valuable activities): este conceito foi desenvolvido por Dave Crenshaw, instrutor do LinkedIn Learning e especialista em produtividade. Liste todas as tarefas que você executa e classifique-as de acordo com o valor que elas agregam ao seu trabalho e/ou seu desenvolvimento e que, além disso, trazem prazer. O topo da lista representa as tarefas nas quais você deveria dedicar a maior parcela do seu “orçamento”;

crie procedimentos ou planos de ação para atividades recorrentes. Dessa forma, será mais rápido resolvê-las assim que surgirem;

listas: quantas vezes você passou horas tentando “se lembrar de não esquecer algo”? Não use sua mente como uma caixa de entrada de atividades que você precisa decidir o que fazer. Anote-as em uma lista (adoramos os apps Trello e Evernote) e livre-se dessa carga cognitiva, que apenas gera distrações;

– aprenda a dizer não, especialmente quando se tratar de tarefas circunstanciais.

Administrar bem o tempo é um desafio que requer método e disciplina, mas que está ao alcance de qualquer pessoa. Com as dicas demonstradas aqui, é possível reorganizar sua rotina, para que “sobre” tempo para cuidar daquilo que, no fim das contas, é o mais importante em sua lista de pendências: você mesmo.

Saiba mais em:

BARBOSA, Christian. (2018). A tríade do tempo. São Paulo: Buzz Editora.

CSIKSZENTMIHALYI,Mihaly. (2008). Flow: the psychology of optimal experience. HarperCollinse-books.

DRUECKER, Peter.(2017). The effective executive – the definitive guide to getting the rightthings done. Harper Business e-book revised edition.

MARK, Gloriaet al. (2008). The cost of interrupted work: more speed and stress. CHI (2008). Disponível em: https://www.ics.uci.edu/~gmark/chi08-mark.pdf.

MARK, Gloria. (2016). Entrevista concedida a Tristan Harrispara o programa “Your undivided attention podcast”, episódio 07: “Sorry for theinterruptions”. Center for Humane Technology, Transcrição da gravação disponível em:

http://humanetech.com/wp-content/uploads/2019/08/CHT-Undivided-Attention-Podcast-Ep.7-Pardon-the-Interruptions.pdf.

WHILLANS, AshleyWhillans. (2019). TED Talk: “A simple strategy for happiness”. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=C36WaLcHpEY.

WHILLANS, Ashley Victoria. (2020). Timesmart: how to reclaim your time and live a happier life. Cambridge, MA: HarvardBusiness Publishing.

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