Dois amigos viajantes e a cascavel

Um motorista conduzia seu automóvel por uma estrada de terra em companhia de seu amigo, parceiro e companheiro de longas datas. De repente, ele freou bruscamente.

– Não! Não para! Por favor, não para! Exclamou o amigo. -Passa por cima e mata de uma vez!

O motorista continuava com o pé no freio e esperava com paciência, enquanto a víbora se rastejava vagarosamente. Era uma cascavel enorme que estava voltando para casa. Estava machucada e precisava atravessar para o outro lado da estrada, pois lá, estariam a sua espera, sua família e seus amigos.

– Tá esperando o que? Vamos! Ainda dá tempo, seja corajoso! Ela é cruel, venenosa, peçonhenta! – Mate-a! Espécie maldita que deveria ser exterminada! O amigo insistente esbravejava para o motorista.

Para a surpresa dos viajantes, a cobra parou por um instante no meio da estrada. Esticou o pescoço, levantou a cabeça e pôs-se a olhar para os dois como se estivesse prestando atenção na discussão. Os dois amigos se entre olharam sem entender absolutamente nada. – Ela parece está nos vendo. Que estranho! Ela parece está nos ouvindo também… Mas cobras não ouvem. – Disse o motorista ao amigo insistente.

E o amigo continuou insistindo – Não sei o que você está esperando para matá-la. Vamos, é a nossa chance, acaba de uma vez com ela! A cobra por sua vez, enrolou-se em volta de si mesma, colocou a cabeça por cima do corpo, lambeu a língua, levantou a cauda e tocou o guizo.

Assustados e sem entender absolutamente nada o motorista pediu que seu amigo calasse a boca e disse em tom extremamente baixo: – cobras não ouvem, mas tem uma sensibilidade muito aguçada capazes de perceber uma ameaça a metros de distância. O amigo insistente respondeu-lhe também sussurrando: -Mas nós estamos em vantagem, ela não. Portanto, não pode nos fazer mal algum, ela está vulnerável é só ligar o carro e pronto… O motorista continuou firme na sua decisão e respondeu – Não posso fazer isso, é só um animal e não está nos fazendo mal algum, além disso, está machucada por isso está lenta. Vou deixá-la seguir. Devagarinho a cobra foi saindo da sua posição defensiva, se desarmou e continuou seu caminho até atravessar totalmente estrada.

Os dois amigos mais uma vez se entreolharam e seguiram, mas não foram muito longe, logo adiante o carro enguiçou e tiveram que descer para tentar consertá-lo. O pneu havia furado e precisava trocá-lo, mas para isso precisavam de suporte para a manobra. O motorista virou-se para seu amigo e disse: – Precisamos encontrar alguns troncos para apoio. Os dois saíram à procura da suposta ferramenta e logo o motorista retornou, porém, seu amigo não.

Esperou por uma, duas horas e nada… Resolveu ir à procurado companheiro. Após alguns metros não muito longe dali, ouviu uma voz de súplica:- Por favor, deixe-me ir…, Choro…, soluços, e, um barulho estranho entre as folhagens… O motorista parou um pouco e depois apertou o passo – Meu Deus o guizo!

Era o chocalho de um cascavel. Não pode ser…, pensou o motorista que, guiado pelos sons e súplicas conseguiu encontrá-lo.

Lá estava seu amigo rodeado por várias serpentes em posição de ataque – Socorro! Tire-me daqui! Vão me matar… – Era possível sentir o pavor em sua voz. – Tire-me daqui, eu não mereço isso…

– “Não se aproxime”, disse uma das cobras ao motorista.

– “Deixem-no!” A ordem veio da cobra maior. Às outras cobras, ordenou que não o atacassem, pois era um bom homem, sensível, e de bom coração. Ouvindo aquilo, o motorista deu um, dois, três passos atrás e depois parou sem acreditar no que estava vendo.

– “Senhor, isso não pode ser possível!” A cobra olhou para o motorista e disse-lhe – “Aproxime-se, não tenhas medo, não vamos lhe fazer mal e também não deixemos que outras serpentes o façam”. E continuou. “Seu amigo está aqui nessa condição apenas para entender como é se sentir ameaçado, indefeso e vulnerável; realmente, não nos foi concedido o dom de escutar, porém, nós serpentes, temos uma sensibilidade incomparável a qualquer outro animal.”- “Sentimos cheiro de perigo há metros de distância, e essa capacidade vocês humanos não a têm; a prova disso é a presença do seu amigo aqui.”

– “Então, me diz agora quem está em condição de vulnerabilidade; quem está em desvantagem?” – Continuou o discurso.-“Sou capaz de adivinhar cada palavra de incentivo dita ao seu amigo; sentir o perigo na pele e não poder fazer nada é uma sensação de impotência terrível; não fiz nada, só queria voltar para casa em paz, minha família, assim como a sua, esperava por mim; estava muito machucada e com dor, não pude correr.” – “Não pode julgar- me se não conheces minha estória.” A cobra continuou firme em suas palavras. – “Somos peçonhentas sim, somos venenosa sim, mas… Nesse momento ela baixou a cabeça e entre soluços soltou: …não sou cruel, e diferente de vocês humanos que perdem para a intolerância, uso meu veneno para defender-me; não atacamos ninguém aleatoriamente; e assim como vocês também temos o nosso papel aqui na terra, somos essenciais sim.” Continuou. – “Contento-me em saber que, apesar da maldade de pessoas como você ainda existem pessoas como seu amigo; ele me salvou avida e agora acabo de salvar a sua.” E ordenou: – “Soltem-no!” – “Deixem que vá!” – “Tenho certeza de que, se não aprendeu a lição ao menos refletirá sobre tudo que sentiu aqui; assim, saberá diferenciar sensibilidade e generosidade de covardia e maldade; saberá diferenciar os sentimentos de impotência, diante da vulnerabilidade, de coragem e medo.” – E concluiu. -“Entenderá que, se colocar no lugar do outro é respeitar-se a si mesmo; e que o perdão liberta a alma e a gratidão acalenta-a.

Moral da história: ainda que conheçamos a história do outro, não estamos aqui para julgá-la. Portanto, não faça com ninguém aquilo que você não quer para si.

Leia Mais

A responsabilidade do poder no contexto da gestão

Quem é o agente da ação nesse contexto?

Diante da variedade de definições que envolve a conceitualização dos elementos que compõe o tema deste texto – em especial o poder – vale a pena refletir sobre a relação que há entre eles e seus agentes e a quem, de fato, pertence a responsabilidade nesse contexto. Quando lemos – a frase “a responsabilidade do poder” – percebemos a posição desse termo (poder) como agente portador da responsabilidade, o que nos leva a “acreditar” que em decorrência desse encargo, todos os outros movimentos acerca de tudo que envolve o desenvolvimento de uma empresa lhes serão diretamente atribuídos, tornando-o um elemento independente. O poder nasceu com a vida e a responsabilidade, diante das circunstâncias, acontece todos os dias no decorrer dela, por isso estão presentes nas relações humanas e sociais – quaisquer que sejam elas – possibilitando e promovendo o desenvolvendo pessoal e profissional.

No sentido da palavra, poder e gestão são muito semelhantes. Eu diria que são sinônimas uma da outra, pois quando pensamos na palavra gestão, logo nos vem à cabeça cargos de gerência, diretoria, presidência, que são os chamados “cargos de confiança” e, a eles associamos automaticamente, a prática de quem manda, de quem determina e de quem dar as ordens – a prática da governabilidade – É justamente essa prática que seduz e fascina indivíduos de pouca ou nenhuma autoestima, pois ela vem precedida de poder e, de acordo com a nossa cultura, ter poder é sem dúvida ocupar cargos de alto nível, pois entende-se que quanto maior o cargo, maior o poder. É pressuposto que haja nessa relação uma confusão de ideais, de modo que as pessoas não estão mais em busca do cargo como objetivo profissional de se tornarem pessoas bem-sucedidas, pelo contrário. Sem se importar com o caminho a ser percorrido, estão ansiosas para chegar é até o tão “sonhado poder”, onde o cargo passa a ser apenas um meio para alcançá-lo e quando isso acontece, o cargo vira objeto de apoio para a ostentação da autonomia que agora exerce sobre seus liderados.

Algumas pessoas, para as quais são destinados cargos de gestão (gerente/líder) não estão prontas para lidar com a magia do poder e por conta disso têm suas responsabilidades corrompidas, o livre arbítrio tende a ficar mais aguçado e por este motivo acabam contaminando o ambiente de trabalho com posturas inadequadas e “atitudes nocivas”. Vivemos um momento onde mudanças ocorrem muito rapidamente e para sobreviver a elas, muitas empresas precisam adequar-se às novas exigências – uma delas é o aprimoramento da relação entre líderes e colaboradores. Certamente as empresas devem capacitar seus colaboradores e, se atentarem para o objetivo de cada um deles, oferecendo a eles oportunidades de entenderem a importância da relação de parceria que há entre liderar com poder e responsabilidade. Portanto, as relações patrão-empregado não podem ser administradas de forma empírica, pois quando se conhece o destino fica mais fácil traçar o caminho para chegar até ele. É indispensável a implantação de uma gestão participativa onde poder e decisões possam ser distribuídos na mesma proporção que as tarefas e as responsabilidades. Ou seja, quando a gestão está completamente envolvida com direitos e deveres, ninguém fica à deriva.

“Somos submetidos pelo poder à produção da verdade e só podemos exercê-lo através da produção da verdade”. Destacar a importância da relação que há entre responsabilidade e poder no contexto da gestão Institucional é fundamental, pois numa gestão inconsciente a responsabilidade fica submetida a cada movimento do poder e se anula diante de suas ações autonômicas. De maneira conotativa, ouso dizer que responsabilidade – frente a omissão do gestor/líder – “pertence” ao poder, porém, no contexto da gestão, responsabilidade deve pertencer ao bom senso, à prudência, e ao discernimento do gestor/líder, sem perder de vista, a ética. O poder é uma ferramenta de cunho transformador e quando bem utilizada é essencial às nossas vidas. Ora, o poder não é específico apenas atende as especificidades de pessoas que o comanda, e involuntariamente assume a personalidade de seus agentes. O poder é um bem natural, é como um líquido que assim com a água segue qualquer curso que lhe oferecem. Não possui forma própria, apenas assume a forma do recipiente onde estiver contido. As pessoas, são os recipientes que o define.

Ao assumir um cargo de gestão todo profissional deveria se autoavaliar para ter ciência de suas ações e alinhamentos de compromisso e obrigações que deve ter para com os valores e missão da empresa e seus subordinados. Para tanto, é preciso que saímos do nosso próprio eu para nos olharmos de fora e categorizar nosso nível de preparação, avaliando se nossas contribuições são suficientes para enfrentar os desafios que o próprio cargo nos oferece. No contexto da gestão, não existe responsabilidade sem poder, mas o poder sem responsabilidade é fato. Sem dúvida, liderar um cargo de alto nível – antes de mais nada – é liderar pessoas, poder e responsabilidade. O agente da ação neste contexto? Uma gestão compartilhada que prese por valores e princípios e pelas necessidades da sua equipe.

Leia Mais

O problema é seu

Segundo a filosofia, um problema é algo que perturba a paz e a harmonia de alguém, mas também é, em geral, qualquer situação que inclua a possibilidade de uma alternativa. Neste caso, eu diria que o problema, é o estimulante que, por vezes, necessitamos para testar e desenvolver a nossa inteligência cognitiva, já que a capacidade de aprender algo novo é inerente ao ser humano. Ter um problema é, sem dúvida, ter a oportunidade de testar a si mesmo, colocar-se à prova da experiência e, a partir dela, extrair lições que possam mudar os nossos conceitos e atitudes. Enfim, ter um problema é ter oportunidade de entrar em contato com as adversidades, se restabelecer como pessoa, redefinir as forças e encontrar razões para continuar.

Os problemas relatados neste texto são os habituais, são aqueles para os quais, ainda que fujam do nosso controle, sempre temos a solução e que, na maioria das vezes só acontecem por descuido. “O problema é seu” é um tema que sugere reflexão sobre as nossas atitudes e condutas do dia a dia, no âmbito familiar e, sobretudo, no trabalho, pois tratando-se de gestor/líder e liderados, existe aí uma relação de reciprocidade quanto à resolução de conflitos. Mas nem sempre é assim.

O problema é seu!

Esta é uma frase repetida frequentemente e de maneira impetuosa por pessoas que não se dão conta da decepção e desapontamento que podem causar ao outro. Problemas?! Quem não os tem? Todos temos. O que nos falta ainda é maturidade suficiente para perceber e entendê-los à medida que vão surgindo. E, partindo da premissa deque todo problema tem sua particularidade, é importante que sejamos cuidadosos ao identificá-los, pois devem ser respeitados, principalmente quando estão “do outro lado”. E, de acordo com seu grau de complexidade, seja ela de maior ou menor relevância, devem ser tratados com muita sabedoria, especialmente na hora de compartilhá-los com alguém, visto que nem sempre as pessoas estão dispostas a resolver questões que, na lucidez de sua ignorância, julgam não ser do seu interesse.

Um problema só pertence a uma única pessoa até o momento em que ele não é dividido com outra. Quando esse problema é compartilhado, ele passa a pertencer a uma segunda pessoa. Neste caso, podemos dizer que o problema agora é “nosso” e não somente “seu”. Ou seja, a partir do momento em que resolvemos expor algo a alguém, ainda que seja um integrante familiar, um amigo ou até mesmo aos nossos líderes, isso significa que, indiretamente, estamos pedindo ajuda para encontrar, senão a solução, ao menos uma tentativa. É uma relação de confiança, ainda que unilateral, na maioria das vezes.

 

O fato é que esse entendimento fica aquém da nossa realidade e se torna bastante comum em muitas empresas. Palavras como acolhimento e empatia, por exemplo, são “robotizadas”, “estão na moda” e por isso são repetidas aleatoriamente, sem nenhum efeito de causa. Assim, é muito mais fácil ser indiferente ao problema alheio porque gerir conflitos é uma tarefa que exige habilidades, sensibilidade, respeito, moral e ética pessoal e profissional – e, no âmbito do ambiente de trabalho, a maior responsabilidade dessa conquista é do gestor / líder.

Ajudar um liderado a encontrar soluções para o seu problema é criar estratégias para melhorar o engajamento e a motivação da equipe. Diante desta questão, adequar a postura profissional é fundamental, pois somos, no trabalho, uma extensão de quem realmente somos em casa, na rua, ou em qualquer lugar. É importante que todo e qualquer profissional saiba se posicionar independente da função ou cargo que ocupa. O fato é que muitos deles perdem o foco daquilo que realmente importa e acabam se voltando para assuntos irrelevantes.

Tratar um problema de forma singular é negligenciar a gestão de pessoas e continuar achando que está tudo bem. O filósofo Mário Sérgio Cortella disse: “é necessário cuidar da ética para não anestesiarmos a nossa consciência e começarmos a achar que tudo é normal”.

Infelizmente, quando pensamos em empatia no território da personalidade, quem marca ponto é o egoísmo. Problemas são comandos naturais que existem para nos desafiar. São artifícios que a vida usa como caminho para nos tirar da zona de conforto, a qual nos priva de conhecer algo novo. É preciso entender e admitir que os problemas existem e eles continuarão no caminho, pois fazem parte da vida.

Leia Mais