Pulou da cama bem cedo, tomou um banho rápido, comeu algo bem depressa sem prestar atenção ao que comia, escovou os dentes, vestiu a roupa que havia deixado sobre a cadeira na noite anterior, falou um “tchau” rapidinho e escutou um “tchau” rapidinho também, saiu, dirigiu o dia todo pela cidade grande, trabalhou muito, ficou estressado/a, almoçou qualquer coisa, voltou para casa tarde, tomou um banho para relaxar, comeu um lanche, dormiu e… começou tudo de novo!
Mas um dia, sem muitos avisos, alguém gritou: “O caminhão da mudança chegou!”
O caminhão que estacionou em frente ao imóvel era da empresa COVID e veio disfarçado de vírus e quarentena, e trouxe dentro dele muitas caixas vazias, e apenas uma caixa cheia.
A caixa cheia foi aberta e ela estava repleta de tecnologia, para ser usada por quem a conhecia, para ser aprendida por outros e até para ser ignorada e deixada de lado por muitos.
E as caixas vazias, como em todas as mudanças, foram sendo preenchidas uma a uma, respeitando ritmos diferentes, de acordo com a delicadeza dos conteúdos. Algumas ficaram cheias de objetos guardados por muito tempo, de relíquias de antepassados, de roupas que não serviam mais, de acessórios fora de moda, de livros que não seriam relidos, e até mesmo dos que não tinham sido lidos, de brinquedos antigos que haviam sido a alegria de filhos e/ou de netos, e muitas outras coisas para serem doadas.
Outras caixas, entretanto, foram preenchidas com a culpa, o perdão, o autoperdão, o arrependimento, a tristeza, a mágoa, o ego inflado, o orgulho, o choro, o desprezo, o negativismo, o medo … Estas caixas ficaram abertas para que mais conteúdo fosse acrescentado a qualquer momento, como por exemplo, a solidão. Elas ainda tinham espaço para muito conteúdo para ser transformado/transmutado.
É obvio que os conteúdos das caixas dependem de cada pessoa ou cada família, então algumas caixas foram preenchidas com muitas orações, amor, humildade, companheirismo, paciência, tolerância, compaixão, diálogos…e estas caixas também foram mantidas sempre abertas para receber mais itens e seu conteúdo pronto para ser levado para a grande teia do universo.
Ah! Ainda existia a caixa cheia de abraços que foram guardados lá desde o dia que o caminhão da mudança chegou. Esta caixa, repleta de abraços apertados, sinceros apertos de mão e todos os outros tipos de contatos físicos, um dia será aberta e um desejo enorme de se expressar eclodirá. Porém, enquanto isto, vamos nos lembrar de que os olhos – as janelas da alma – podem expressar todo o amor que temos para dar e, além disto, podem sorrir.
Mas nem tudo pode ser encaixotado, então os cães e os gatos que caminham pelas casas em meio a tantas caixas estão felizes com a presença de seus donos, e a natureza, em todas as suas formas, resplandece.
É certo que todas as mudanças requerem muitas adaptações às novas casas, aos espaços que habitamos dentro e fora de nós e este processo pode ser lento, mas que tudo de bom venha a nós, com leveza, gratidão e amor.