Estratégias para melhorar o engajamento mesmo no home office
Momentos desafiadores exigem maior atenção e empenho para que possamos superá-los da melhor maneira possível. Ao longo de minha trajetória, compreendi que nós, seres humanos, preferimos ter o controle das situações. Mas, de repente, com o aparecimento da pandemia, todas as nossas certezas foram abaladas e, com elas, fomos convidados a encarar muitas dificuldades, seja na esfera familiar, seja no ambiente corporativo. A maioria das pessoas precisou adequar seu local de trabalho dentro de suas casas, mudando completamente a dinâmica do seu dia adia, vivenciando instabilidade e medos de toda a ordem, sem perder de vista a sua habilidade de entregar resultados. As organizações tiveram de alterar o modo como fazem a gestão das pessoas, preparar as lideranças para esses novos tempos e encontrar as melhores estratégias para não perder os níveis de engajamento e os seus resultados. (…)
Primeiramente, vamos analisar os obstáculos que os empregadores estão enfrentando. No livro Reiventando as Organizações, Frederic Laloux afirma: “A nossa forma de tentar lidar com os problemas atuais das organizações muitas vezes parece piorar as coisas, não melhorar”. Infelizmente, muitas organizações ainda estão presas a velhas manias, protocolos e métodos, principalmente em relação à gestão. Formas essas que deram certo, mas que faziam sentido e eram eficazes para outras circunstâncias. Otto Scharmer, quando apresenta a teoria U, enfatiza que a questão é não temer o desconhecido e aprender com o futuro à medida que ele emerge. Que possamos suspender nossos velhos pressupostos para abrirmos espaço ao novo, buscando oque ele chamou de “presencing”, ou seja, a capacidade de estarmos realmente presentes e conectados com o que acontece, sentindo e deixando emergir todas as possibilidades que emergem dos sistemas, nos quais nos inserimos.
Gosto muito da parte do sentir, algo que ainda não aprendemos a vivenciar com naturalidade nos ambientes corporativos, o que, atualmente, tem sido essencial. Luciano Meira, referência em liderança humanizada no Brasil, ajuda-nos a pensar como podemos aprender a navegar em mares procelosos. Foi o que ele chamou de “A segunda simplicidade” (título deum de seus livros), considerando que ela seja uma “experiência de resolução psíquica – estar bem com o passado, de bem com o futuro e ter a consciência plena no presente. É essa experiência libertadora que nos permite ‘surfar’ sobre as ondas da complexidade e da incerteza, sem nos afogar nelas”.
Vale lembrar que, mesmo antes da pandemia, já tínhamos índices alarmantes de adoecimento emocional. Pessoas com muito foco no futuro, sofrendo de ansiedade.
Em matéria publicada pela revista Super Interessante, em 2018, intitulada “Epidemia da Ansiedade”, descobrimos que nós, brasileiros, ganhamos o título de campeões mundiais nesse distúrbio, com um índice três vezes maior que a média da população mundial. Também presenciamos muitas pessoas sofrendo de depressão – com o excessivo aprisionamento no passado. E o medo acima do normal por diferentes razões, em especial com o contágio do novo corona vírus, acabou ampliando essas tendências e revelou a urgência de se cuidar do lado emocional dos colaboradores das empresas.
Juntando tudo isso, alguns apontamentos se tornam imprescindíveis, por exemplo: quantas pessoas sentem medo de perder o emprego e acabam por não compartilhar o que estão sentindo? Esse estado emocional certamente acaba por gerar uma queda em sua performance e no engajamento em relação ao trabalho que realiza. Quantas pessoas estão com algum tipo de adoecimento emocional e não encontram espaço para lidar com isso? Quantos de nós precisamos reestruturar rapidamente toda a nossa dinâmica de trabalho para lidar com todas essas mudanças?
Uma pesquisa realizada pelo Google, que recebeu o título de “Projeto Aristóteles”, revelou que os principais fatores que condicionam uma equipe de sucesso são: segurança psicológica; confiabilidade; estrutura e clareza; significado e impacto. Vamos, então, refletir sobre estratégias eficazes, a fim de melhorar a segurança psicológica das pessoas nas organizações e seus níveis de engajamento com o trabalho:
1) Espaço para sentir: Certo presidente de uma multinacional abriu importante fórum de discussões com a presença de muitas lideranças e colaboradores, dizendo que ali era permitido sentir. Fez um discurso emocionado e contou como ele mesmo estava se portando diante das instabilidades atuais. De acordo com a equipe de RH dessa empresa, a repercussão foi muito positiva e fez com as pessoas adotassem uma postura de maior abertura. A atitude dele assegurou maior segurança psicológica e criou um ambiente emocionalmente seguro para que as pessoas pudessem expressar, com maior autenticidade, como estavam lidando com as mudanças ocorridas. Ao se manifestarem, os colaboradores ampliam a possibilidade de lidar com as emoções, de pedirem e receberem ajuda. Em vez de reprimirem suas emoções, as pessoas aprendem a lidar com elas. No livro Agilidade Emocional, Susan David nos alerta quanto aos riscos de represarmos nossas emoções, pois elas podiam vir à tona de uma maneira não voluntária, por meio deum vazamento emocional. Mesmo na interação on-line, o tempo de qualidade dedicado ao outro faz toda a diferença. Portanto, é essencial propor uma pausa e estar genuinamente disposto a ouvir.
2) Gerar significado: uma das frases de impacto que ficaram evidentes na voz de Viktor Frankl, mas que foi primeiramente escrita pelo filósofo Nietzche, diz que “quem tem um porquê enfrenta qualquer como”. Na obra Em busca de sentido, Frankl conta suas experiências em quatros campos de concentração e ressalta a importância de termos um sentido para a vida. E isso também pode ser levado em conta em todas nossas escolhas. Uma empresa estabeleceu canais de comunicação bem transparentes e ativos. Ações como estas abrem espaços para que as pessoas se sintam seguras e questionem o que elas não entendem e, ao mesmo tempo, para que sejam informadas a respeito das principais decisões tomadas pela empresa. Contudo, o mais interessante é o presidente daquela empresa fez questão de salientar que a base de suas decisões se pautava na humanização das relações, esse era o seu porquê.
3) Dialogue mais!: Quantas pessoas, neste instante, passam por problemas relativos à administração dos seus ambientes físicos, por vezes inapropriados, somados às demandas que vêm de seus familiares em horários de trabalho? Tudo isso pode incorrer em perdas significativas de concentração. Para minimizar esse impacto, é fundamental abrir mais espaços de alinhamento de expectativas, ou seja, checagens se o interlocutor compreendeu corretamente o que lhe foi solicitado. Essa atitude minimiza retrabalho, erros que podem ser complicados de reverter, visto que as demandas ficaram mais claras. Em home office, tudo isso continua sendo possível, mas é preciso ter disciplina e colocar essa agenda como parte da rotina.
4) Mais leveza por favor: Você já ouviu falar em inteligência lúdica? Wellington Nogueira, fundador dos Doutores da Alegria no Brasil, tem se dedicado a levar essa ideia para as organizações. A inteligência lúdica pode nos ajudar a criar ambientes em que estamos em constante aprendizado, como se fosse uma brincadeira em que os erros fazem parte do processo/brincadeira, onde jogamos com o outro e não contra o outro. Levar-se menos a sério e julgar menos, sendo mais cooperativo e criativo tornam os processos mais divertidos e, não por isso, menos desafiadores. Vale citar o dramaturgo George Bernard Shaw: “Não paramos de brincar porque envelhecemos. Envelhecemos porque paramos de brincar”. Portanto, a indicação é a de que as empresas proponham mais jogos, transformando os obstáculos em “gameficação”, visando mais às possibilidades do que às adversidades.
5) Empatia na prática: Mara Morão, ao registrar a trajetória de empreendedores sociais pelo mundo no premiado documentário “Quem se importa”, tem como um dos destaques a história de Mary Gordon por intermédio da empatia. Com a intenção de diminuir o bullying nas escolas, ela leva bebês de 2 a 4 meses, acompanhados de suas mães, para interagirem com crianças de 4 a 14 anos, para que essas crianças e adolescentes desenvolvam a capacidade de cuidar. Mary Gordon enfatiza que “o melhor motor para o aprendizado é por meio da experiência”. Para ela, a empatia tem dois lados, o cognitivo: a importância da tomada de perspectiva do outro, imaginando como ele se sente a partir de seu próprio contexto; e o emocional: com a promoção da ética do cuidado, compreendemos até que ponto podemos avançar e em que tempo, proporcionando uma experiência de cuidado genuíno e atenção em relação ao bem-estar do outro. Nem sempre concordaremos com a atitude do outro, mas é possível entender suas razões e respeitá-lo.
De tudo o que foi citado, sobre o que você considera mais interessante pensar? Tudo, absolutamente tudo, pode ser realizado remotamente, no home office. Mas é preciso disponibilidade! As exuberantes estruturas físicas se mostram cada vez menos importantes. É momento de as empresas compreenderem que as pessoas são o caminho para que os resultados sejam atingidos e que, se lançarmos luz sobreo cuidado com elas, potencializando ambientes emocionalmente mais seguros, teremos os resultados em seus mais altos níveis e com sustentabilidade, colaboradores mais felizes e engajados. Nesse contexto, todos influenciam e impactam o todo. Por isso, eu pergunto: oque você tem feito para colaborar?
Referências
David, Susan. Agilidade Emocional: abra sua mente, aceite as mudanças e prospere no trabalho e na vida. São Paulo, Cultrix, 2018.
LALOUX, F. Reinventando as organizações: um guia para criar organizações inspiradas no próximo estágio da consciência humana. Minas Gerais: Editora Voo, 2017.
MEIRA, L. A. A segunda simplicidade: bem-estar e produtividade na era da sabedoria. Goiânia: Editora Caminhos.
SINEK, S. Comece pelo porquê. Como grandes líderes inspiram pessoas e equipes a agirem. São Paulo: Sextante, 2018.
Para saber mais sobre a pesquisa Google:
Para saber mais sobre o artigo de Ricardo Ogawa:
Para saber mais sobre inteligência lúdica – artigo Revista HSM. A inteligência que falta no trabalho:
https://www.revistahsm.com.br/post/a-inteligencia-que-falta-no-trabalho