Já pensou se, em vez de buscar soluções, você explorasse formas de… criar ou agravar um problema?
Brainstorming é um método popularmente usado para levantar ideias, a fim de discutir um assunto e os desafios para resolvê-lo. Criado em 1939 pelo publicitário e escritor americano Alex Osborn (1888-1966), ele encoraja a criatividade dos participantes, que devem deixar sua imaginação correr livremente.
Durante sua realização, não é permitido criticar ou julgar oque for dito, para que não haja obstáculos à concepção de novas abordagens. Todas as ideias, portanto, são bem-vindas, inclusive aquelas que pareçam (ao menos inicialmente)extravagantes, pois, segundo Osborn:
“É mais fácil ajustar uma ideia absurda do que criar uma nova.” ¹
Este método tem início com uma questão clara, e finaliza com uma lista de ideias “cruas” para respondê-la. Algumas delas serão boas, outras nem tanto. O importante é que a etapa de análise aconteça somente em um momento posterior, quando o grupo poderá utilizar outras ferramentas – como diagramas de afinidade, por exemplo – para refinamento.
Uma vez que nosso cérebro trabalha de maneira associativa ao procurar soluções, esta técnica é vantajosa justamente por incentivar a conexão entre elementos distintos.
Apesar disso, o processo todo pode ser por vezes difícil, seja porque os participantes não estão confortáveis o bastante para contribuir com sugestões, ou porque o problema é complexo, ou mesmo porque é algo novo e não há nenhuma solução ou caminho trilhado anteriormente.
Que tal inverter tudo?
Foi com base nessas dificuldades que surgiu o brainstorming reverso. Este método traz uma nova perspectiva, propondo problemas em vez de soluções. A ideia é que um grupo que não esteja confiante a respeito de um projeto ou tenha esgotado suas ideias muito rapidamente possa inverter o ponto de discussão, pensando em maneiras de irritar, frustrar ou impedir que o cliente obtenha os resultados desejados.
Por exemplo:
Imagine que você e seu grupo estão trabalhando em um programa de fidelidade voltado ao público de alta renda. Porém, após poucos minutos de brainstorming, vocês começam a ter dificuldade em levantar ideias para que o produto seja diferente dos outros disponíveis no mercado. A fim de dar continuidade à sessão, vocês mudam a abordagem utilizando o brainstorming reverso, fazendo-se perguntas sobre como causar o problema ou forçar que o programa dê errado, dentre elas:
Como podemos garantir que ninguém se cadastre em nosso programa?
Como reduzir o número de membros?
Como impedir que os usuários resgatem seus prêmios?
Perguntas assim podem gerar respostas como:
– Obrigar os novos membros a ler um contrato enorme e clicar em “Li e aceito os termos” a cada página;
– Tornar o processo de login difícil ou instável (conexão derrubada a cada 2 minutos de inatividade);
– Solicitar muitas informações pessoais, inclusive as que não têm relação direta com o serviço oferecido;
– Esconder informações relevantes em páginas adicionais ou que só possam ser acessadas quando a pessoa clicar em“Mais informações”;
– Tornar as regras de utilização de pontos confusas e ambíguas;
– Incluir e exibir custos adicionais apenas na finalização do resgate
e assim por diante.
Sob este novo ângulo de interpretação, a busca por soluções pode se tornar mais simples e intuitiva, fazendo com que o grupo tenha um novo ímpeto de participação. Ademais, e devido à grande possibilidade de que a sessão se torne mais divertida – algumas sugestões de resposta sempre acabam sendo hilárias –, as pessoas podem se sentir mais confortáveis e abertas para opinar. A técnica também funciona bem com grupos que estão encarando problemas antigos, que fazem parte do adágio corporativo do “sempre foi assim” e que, por isso, precisam de trilhas alternativas.
Da mesma forma que o brainstorming “tradicional”, durante as sessões do reverso não são permitidas críticas ou julgamentos e a abundância de ideias deve ser incentivada. Como atividade inicial, no entanto, sugiro que o(a) facilitador(a) faça um exercício com uma pergunta/problema não relacionada ao tema central da discussão, a fim de que todos se familiarizem com o processo.
Posteriormente, deve-se conduzir uma nova sessão (pode ser no mesmo dia, após um intervalo) para “converter” os problemas de volta para soluções. Cada problema pode gerar mais de uma solução.
Por exemplo:
1. Problema:
Obrigar os novos membros a ler um contrato enorme e clicarem “Li e aceito os termos” a cada página.
Propostas de solução:
Otimizar o contrato para que ele traga os termos específicos da prestação de serviços, sem tentar cobrir cada particularidade e especificidade que porventura possa ocorrer.
Simplificar os termos de aceite com linguagem clara e objetiva.
Utilizar um processo de coleta eletrônica de assinaturas, evitando-se assim impressão e digitalização de documentos.
2. Problema:
Tornar o processo de login difícil ou instável(conexão derrubada a cada 2 minutos de inatividade).
Propostas de solução:
Oferecer single sign-on, caso a solução seja corporativa.
Habilitar o cadastro da digital para acesso à área do cliente.
3. Problema:
Incluir e exibir custos adicionais apenas na finalização do resgate.
Propostas de solução:
Exibir o custo total de resgate em pontos logo que usuário clicar em um produto.
Recalcular automaticamente o total de pontos necessários para o resgate a cada produto incluído ou excluído do carrinho.
Etapas de implantação:
1. Comece com uma questão clara a ser resolvida
Identifique a questão central a ser discutida, descreva-a e anote-a em um flipchart, destacada e visível para todos os participantes.
2. Pense em como torná-la um problema
Não pergunte como o problema pode ser resolvido, mas sim o que pode causá-lo ou torná-lo ainda pior. Dessa forma, é possível obter vantagens do fato de que as pessoas tendem a focar mais no problema do que na solução, aumentando assim o número de ideias compartilhadas.
3. Colete ideias
Ouça e anote as ideias, inclusive as que parecerem absurdas, sem permitir críticas ou julgamentos. Quanto mais contribuições, melhor. E não se preocupe, pois haverá tempo para avaliá-las refiná-las posteriormente.
4.Converta as ideias em soluções
Em um encontro seguinte (ou após um intervalo) converta as ideias levantadas no passo anterior em soluções. Nesta etapa, diversas formas de responder à questão inicial já estarão mais claras ou poderão ser mais facilmente identificadas.
5. Avalie as soluções
Combine as ideais, avalie e faça os devidos ajustes – vale usar ferramentas novas, como um diagrama de afinidade – para que o grupo descubra, junto, que realmente pode ser transformada em uma solução efetiva.
Fatores de sucesso para aplicação deste método: a facilitação, pois a pessoa à frente do brainstorming reverso precisa de habilidade para manter o fluxo de ideias do grupo constante; e atenção exclusiva, visto que será necessário ter uma sessão ou momento extra para transformar os problemas em soluções novamente.
Agora é sua vez de colocar em prática!
Saiba mais em:
Ducere Global Business School. (2018) 4 ways to improve your brainstorming.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=HRWt1rBG10o.
ELMANSY, Rafiq. (2015) Design Thinking tools: reverse brainstorming.
Disponível em: https://www.designorate.com/design-thinking-tools-reverse-brainstorming/.
MULDER,Patty. (2018) Reverse Brainstorming.
Disponível em: https://www.toolshero.com/creativity/reverse-brainstorming/.
WILSON,Chaunsey. (2011) 100 User Experience (UX) design and evaluation methods for yourtoolkit.
[1] Tradução livre. No original: “It is easier to tone down a wild idea than to think up a new one.”