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Já ouviu falar de… DDO?

DDO são as chamadas organizações focadas no desenvolvimento[1] (do inglês Deliberately Developmental Organizations). Este conceito é fruto de um extenso trabalho de pesquisa realizado por Lisa Lahey e Robert Kegan, e publicado em An everyone’s culture (2016, ainda sem tradução para o português).

Especialistas em aprendizagem na fase adulta e estratégias de desenvolvimento nas organizações, juntos estudaram diversas empresas e a forma como elas constroem e executam programas de desenvolvimento, a fim de entender o impacto real dessas iniciativas na melhoria do ambiente corporativo como um todo – em especial, no que tange aos aspectos culturais.

Nesse processo, notaram que a maioria delas comete equívocos que fazem com que o potencial desses programas seja inócuo:

– as pessoas estão desempenhando um segundo trabalho no dia a dia, que consiste em gerenciar impressões e ocultar vulnerabilidades. Contratadas sob uma idealização de que são capazes de resolver qualquer desafio por si só, ao se deparar com situações em que precisam de apoio e por não dispõem de um ambiente emocionalmente seguro para pedir essa ajuda, acabam se esbarrando em obstáculos que ofuscam ótimas oportunidades de crescimento;

– grupos seletos de “talentos”. Em geral, os programas de desenvolvimento são voltados para um grupo restrito de pessoas, consideradas “talentos” da organização. Elas, no entanto, representam um percentual muito baixo do quadro total de colaboradores – geralmente ente 1 e 2%, raríssimas vezes acima de 5%. Mas aí vem a pergunta: e o restante? O que acontece com a motivação e o engajamento de alguém que não se vê pertencente a esse grupo? Apoiando somente um recorte ínfimo das pessoas com cursos, coaching, mentorias e treinamentos variados, a empresa dá um recado frequentemente mal visto de que vale a pena investir dinheiro somente nas “estrelas”;

– programas externos: embora esses programas muitas vezes sejam bem organizados, conduzidos e até customizados para oferecer a linguagem e os elementos que fazem parte do dia a dia da contratante, é extremamente complexo transpor todo o conhecimento, ferramentas e comportamentos desenvolvidos lá de volta para a rotina de trabalho. Dessa forma, muitos processos acabam fracassando, porque não são capazes de prover à organização os resultados esperados, principalmente na disseminação do que foi aprendido e na implantação de mudanças que de fato otimizem a realidade do trabalho;

– custo duplo: ao final, resta às organizações apenas um custo duplo, isto é, o dinheiro investido no treinamento propriamente dito e aquele pago aos colaboradores que estavam ausentes do trabalho durante o treinamento. E esse custo, de forma geral, assume ares de despesa, visto que os programas dificilmente atingem a amplitude necessária, que justificaria sua realização.

Ademais, e segundo os dados de pesquisa dos autores:

A maior causa de burnout não é a sobrecarga de trabalho, mas sim o excesso de trabalho sem a experiência de autodesenvolvimento porque falta um senso coletivo, que abrange todos os indivíduos nos programas de desenvolvimento; falta clareza sobre as perspectivas de desenvolvimento compreendidas pela maior parte das tarefas realizadas; e, por fim, falta o entendimento de que elas se encaixam em um contexto maior – a questão do propósito –, fazendo com que o trabalho se torne inevitavelmente desmotivador.

Surgem assim as DDOs

As organizações focadas no desenvolvimento têm como principal característica estarem alinhadas ao propósito individual de crescer – e a soma desses propósitos traz consigo toda a estratégia e cultura da organização. São empresas que mudaram seu foco de ter Grandes Líderes para formar a todos como grandes pessoas. Nelas, não importa quem é abordado, pois todos podem dar contribuições importantes, seja através de suas atitudes, experiência ou mindset.

 

 

Toda empresa possui desafios – internos, tecnológicos, regulatórios, de mercado etc. É preciso, portanto, ressignificar pré-conceitos e encorajar o time a fazê-lo também, tornando o trabalho melhor, mais relevante e com o potencial (não necessariamente a certeza) de trazer grandes impactos organizacionais. Assim, os autores falam em uma substituição do “melhores empresas para se trabalhar” por “melhores empresas para crescer e se desenvolver”.

Não existe uma técnica específica para que as organizações se transformem em uma DDO. Entretanto, há alguns pontos de partida:

– realização de programas de desenvolvimento global, ou seja, estendido a todos os colaboradores e não só aos “talentos”;

ambientes emocionalmente seguros, em que as pessoas se sintam confortáveis para falar de suas fraquezas, vulnerabilidades, inseguranças, pois isto permitirá que elas cresçam por meio do desenvolvimento desses pontos;

estratégia e cultura precisam ser aplicadas no contexto diário de trabalho, estabelecendo pontes entre os programas de desenvolvimento e as tarefas executadas.

Afinal, o desenvolvimento de pessoas reflete diretamente no desenvolvimento da organização e na excelência operacional. Kegan e Lahey reforçam desde as primeiras páginas que:

A cultura de uma organização é sua estratégia

Pois as interações, colaboração, abertura para diálogo, feedback, incentivos de desenvolvimento implicam diretamente na estratégia, refletindo no comportamento das pessoas que compõem as organizações. Por isso, criar uma cultura focada no desenvolvimento gera uma situação do tipo ganha-ganha: colaboradores se desenvolvem, empresa prospera.

Como exemplos de DDOs no mercado americano, o livro cita:

– Next Jump, e-commerce cujos Co-CEOs, Charlie Kim e Meghan Messenger, deram uma ótima palestra no evento da NCSL de 2018 e que tem uma política de não demitir ninguém (no firing policy), além de promover grupos de coaching rotativo, para que todos possam tanto receber quanto dar feedback. Adicionalmente, o pagamento de bônus está atrelado a duas vertentes: 50% aos resultados como um todo e os 50% restantes, à contribuição individual ao desenvolvimento da cultura da organização;

– Decurion, do setor imobiliário, que promove as chamadas next-generation learning communities, grupos colaborativos em que as equipes discutem estratégias, principalmente voltadas para inovação e tendências futuras; e

– Bridgwater, um hedge-fund em que a liderança afirma que para se transformar em uma empresa entre 10.000 outras é necessário contratar pessoas que também sejam uma entre 10.000. Nela, o valor mais importante é a busca pela verdade, seja ela qual for. Para tanto, trabalham com um log de erros e problemas encontrados, a fim de mantê-los no radar e traçar planos para corrigi-los ou mitigar sua ocorrência.

As DDOs representam uma nova forma de olhar e desenvolver colaboradores e, potencialmente, uma estratégia para tornar empresas mais competitivas na atração (e retenção) de talentos. Deixo aqui minha provocação:

Como podemos transpor esses conceitos para as empresas que lideramos?

 

Saiba mais em:

KEGAN, Robert & LAHEY, Lisa. (2016) An everyone’s culture: becoming a Deliberately Developmental Organization. Harvard Business Press.

KEGAN, Robert. (2013) The further reaches of adult development. Palestra dada no evento RSA. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=BoasM4cCHBc.

KIM, Charlie & MESSENGER, Meghan. (2018) Leadership and employee development. Palestra dada no evento NCLS. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=VE5q-ACxZ30.

LAHEY, Lisa & ANDERSON, Bob. (2017) Developing feedback rich cultures in organisations. Entrevista realizada como parte do evento The Leadership Circle. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Ja6xNAAw4r4.

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Tiago Rodrigo

Tiago Rodrigo

Entusiasta de frameworks ágeis, Kanban e Trello - mas, acima de tudo, do protagonismo e do encontro de cada um com seu propósito. Economista Comportamental dedicado a esta ciência multidisciplinar na construção de modelos que facilitem e simplifiquem a tomada de decisão em diversos contextos.

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